Vale do Paraíba, o caminho do café

Um mergulho no passado paulista

Por: Diário do Comércio - SP

A sensação de se avistar a sede da Fazenda Boa Vista, no município de Bananal, São Paulo, é a de um sobressalto. Erguido em uma pequena colina à beira da histórica Rodovia dos Tropeiros, o enorme casarão remete a um tempo em que as fazendas no Brasil poderiam ser comparadas a castelos, tamanha a riqueza gerada em meados do século 19 com o café. Uma riqueza grande e breve. As terras rapidamente se esgotaram pelo mau uso e a abolição da escravidão foi o tiro de misericórdia aos cafeicultores, que conheceram a decadência tão rápido quanto tinham enriquecido.

Graças a esse capítulo inglório de nossa história, o Vale do Paraíba, por onde se esparramavam os principais cafezais, ficou no abandono através das décadas e chegou ao século 21 guardando fazendas inteiras preservadas e uma atmosfera que remete a um passado que ainda não foi superado por completo. Muitas dessas fazendas abriram como exclusivos hotéis ou hospedarias familiares, mantendo o astral e as estruturas originais, na medida em que os efeitos do tempo permitiram.

É possível, evidentemente, conhecer apenas uma ou algumas dessas fazendas. Mas o roteiro completo, que parte de Bananal, cruza o Estado do Rio de Janeiro e termina em Rio das Flores, já próximo à divisa com Minas Gerais, é uma experiência única. Um delicioso mergulho no chamado Brasil profundo: arcaico, belo, pobre, acolhedor e, por incrível que pareça, pouco conhecido.

Cenário de novela – A Boa Vista, localizada numa das pontas desse ‘roteiro do café’, foi uma das fazendas mais opulentas da região em meados do século 19, com mais de 2.500 hectares. Funcionava à maneira de uma cidade, se auto-provendo de quase tudo que consumia. De fora, só vinha sal, conforme explica um de seus atuais proprietários César Almeida Macedo. ‘Havia até um padre capelão residente’, conta. Hoje, a propriedade tornou-se um hotel, que ganhou fama por ter sido várias vezes locação de novelas de época; a última delas foi Cabocla, da Rede Globo. A fachada, alguns cômodos e a capela são mantidos como eram originalmente. Os quartos foram remodelados como suítes, mas ainda guardam muitas história. O quarto 7, o único com mobílias de época, hospedou o Duque de Caxias, quando este estacionou suas tropas na Boa Vista, em 1842, em campanha contra rebeldes liberais do Vale.

Antigüidade –Na mesma Rodovia dos Tropeiros, encontra-se a Fazenda Coqueiros, cujo dono Antônio Augusto Ferreira Gomes, o Guga, obcecado por colecionar objetos antigos, a transformou numa espécie de museu do café. Trata-se de um museu vivo já que a família proprietária reside lá. São santos barrocos, moedas antigas, estribos, uma mobília toda de época, inclusive na cozinhas e nos banheiros, e até instrumentos de tortura de escravos. A Coqueiros não funciona como hotel, mas é aberta a visitas, sempre conduzidas por Guga, que trata os visitantes como amigos da casa. Na fazenda, também há atividade de pecuária leiteira.

Deixando Bananal no sentido da divisa com o Rio de Janeiro, a tranqüila Fazenda Independência, quase no entroncamento com a Rodovia Dutra, é uma ótima opção de hospedagem para casais em busca de refúgio. No solar, envolto por um jardim projetado por Burle Marx, as suítes do piso superior são enormes, decoradas com móveis antigos e com todo o conforto.

Próxima à Independência, a Fazenda Resgate também faz merecer uma visita. Nos períodos áureos a propriedade pertenceu ao Comendador Vallim, maior cafeicultor de Bananal, que, segundo dizem, chegou a deter 1,4% de toda a moeda nacional, sendo avalista de empréstimos do Brasil no exterior. A casa mantém parte do luxo do século 19, tendo preservado murais do pintor espanhol Villaronga nas paredes. A visitação, porém, é irregular, dependendo de agendamento com antecedência.

Mais Notícias

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.