Artigo – O agronegócio em 2009

6 de março de 2009 | Sem comentários Mais Café Opinião
Por: JORNAL DA IMPRENSA

 O agronegócio brasileiro ingressou em uma conjuntura profundamente diferente daquela observada nos últimos anos em razão da crise global que se instalou no final de 2008. Esta é a premissa básica para a elaboração de previsões sobre o setor, um exercício normalmente difícil de ser feito em qualquer campo. Neste artigo, apresento uma análise das previsões disponíveis de desempenho produtivo e dos possíveis impactos de alguns indicadores econômicos no setor.


A conjuntura global em 2009 será marcada por recessão nos Estados Unidos, na Europa e no Japão, assim como por uma redução no ritmo de crescimento na China, Rússia e Índia. A redução na demanda por commodities minerais e agrícolas poderá provocar a redução de suas cotações. Esse movimento já está presente em minério de ferro e petróleo, que parece ter encontrado certa estabilidade em torno de 50 dólares por barril. Com isso, haverá redução na demanda por produtos agrícolas brasileiros em geral.


O terceiro prognóstico do IBGE para a safra de 2009 estimou uma produção de cereais, leguminosas e oleaginosas de 137,3 milhões de toneladas, 5,9% menor que a obtida em 2008, e a área a ser colhida deverá ser de 47,6 milhões de hectares, 0,8% superior à de 2008 (47,2 milhões de hectares).


Entre os produtos investigados, seis apresentam alta em relação à área colhida em 2008: arroz em casca (0,8%), cebola (2,2%), feijão em grão 1ª safra (14,6%), fumo em folha (2,5%), mandioca (0,3%) e soja em grão (0,4%). Com variação negativa, algodão herbáceo em caroço (13,6%), amendoim em casca 1ª safra (3,0%), batata-inglesa 1ª safra (6,9%), café em grão (2,6%) e o milho em grão 1ª safra (1,0%).


Esperam-se altas na produção de arroz em casca (0,5%), cebola (3,9%), feijão em grão 1ª safra (13,9%) e mandioca (0,7%). Com variação negativa: algodão herbáceo em caroço (15,1%), amendoim em casca 1ª safra (7,0%), batata-inglesa 1ª safra (9,8%), café em grão (16,2%), fumo em folha (4,3%), milho em grão 1ª safra (11,9%) e soja em grão (1,9%).


A COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO (CONAB) divulgou em 8 de janeiro o quarto levantamento da safra nacional de grãos 2008/2009, estimada em 137 milhões de toneladas, indicando o clima adverso como o principal fator da redução de 4,9% em relação aos 144,1 milhões de toneladas do ciclo anterior (2007/2008). Por outro lado, a área plantada cresceu 0,2%, saindo de 47,42 milhões de hectares para 47,49 milhões de hectares.


A única região com variação positiva na produção é o Sudeste, que cresceu 0,3% em relação à pesquisa de dezembro. Já o Sul é o mais atingido pelo clima. Houve estiagem em alguns Estados e excesso de chuva em outros. A queda na produção desta região chega a 4,8%, ou seja, caiu de 61 milhões de toneladas projetadas em dezembro para 58,1 milhões de toneladas.


As maiores perdas estão no Paraná. A região litorânea de Santa Catarina também foi atingida pelas chuvas e o oeste do Estado pela seca. O milho primeira safra paranaense apresenta quebra de 19%, ou 1,6 milhão de toneladas a menos, saindo de 8,6 milhões para 7 milhões de toneladas. A soja diminuiu 6,5%, ou 783 mil toneladas, passando de 12,1 para 11,3 milhões de toneladas. No Centro-Oeste, a queda foi menor, de 0,7%, o que corresponde a uma diminuição de 332 mil toneladas na produção total de grãos em todo o País. A região deve colher agora 46,5 milhões de toneladas. As perdas estão na soja (241 mil toneladas) e no milho primeira safra (103 mil toneladas).


A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) estima que a quebra da safra agrícola 2008/2009 ficará em torno de 10%, conforme declaração da presidente da entidade, Kátia Abreu. A representante credita a diferença em relação à previsão da CONAB ao fato de o levantamento de campo do órgão federal ter sido feito em meados de dezembro, antes das adversidades climáticas ocorridas no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul. Além disso, segundo ela, cálculos da CNA apontam para perda de aproximadamente 8% na produtividade agrícola da safra atual por falta de correção adequada do solo, em razão dos altos preços dos fertilizantes no mercado internacional. Conforme dados da Associação Nacional para a Difusão de Adubos, ocorreu uma redução de 50% na quantidade vendida de fertilizantes entre 2007 e 2008.


Os produtos direcionados ao mercado interno devem apresentar crescimento de produção, contribuindo para o controle da inflação. Esse desempenho poderia ser atribuído à recuperação de preços em 2008, gerando incentivos para o plantio, e à disponibilidade de recursos de crédito rural com taxas controladas pelo governo. O principal exemplo é o feijão, com aumento na produção estimado em 13,9% (IBGE).


No caso dos produtos brasileiros com participação relevante no mercado internacional, são esperadas reduções na produção. Isso pode ter sido motivado pela escassez de crédito das empresas de insumos, agroindústria e tradings, em decorrência da crise global.


Para a soja, o movimento ocorrido foi um ligeiro aumento de área plantada com menor quantidade de insumos, gerando um crescimento estimado de 1,9% na produção (IBGE). Tendo em vista as perspectivas de redução na demanda global, o baixo crescimento esperado não deverá provocar impactos negativos no setor, podendo até contribuir para a sustentação de preços recebidos.


No caso do milho, espera-se uma redução de 11,9% na produção (IBGE). A diminuição prevista poderá ser prejudicial ao setor já que esse produto não deverá apresentar redução expressiva na demanda, tendo em vista a sua participação como insumo para a produção de etanol nos EUA e nas cadeias produtivas de alimentação animal. Como os produtores brasileiros se encontram em uma fase de aumento de participação nos mercados externos, a falta de produto poderá prejudicar esse processo.


O algodão deve apresentar queda de 15,1% na produção (IBGE). Neste caso, a redução deverá prejudicar as cadeias produtivas de confecções, visto que esse setor poderá aumentar sua competitividade em relação aos produtos asiáticos, reduzindo as importações e podendo aumentar as exportações em razão da desvalorização do real em relação ao dólar. Essa cadeia tem passado por dificuldades com a valorização do real nos últimos anos. A recuperação da produção de algodão depende dos incentivos de demanda e dos preços dos insumos, que, por sua vez, dependem das cotações do petróleo e do câmbio.


Na última década, o governo federal tem direcionado os programas de crédito com taxas de juros subsidiadas para o segmento de agricultores com menor escala e fornecedores de produtos para o mercado interno. Esse segmento aparentemente foi menos afetado pela escassez de crédito provocada pela crise global, ainda que tenham ocorrido dificuldades na renegociação de dívidas para a tomada de novos recursos.


Por outro lado, as cadeias produtivas que envolvem agroindústrias de alimentos e energia e exportação passaram a criar mecanismos de financiamento dos agricultores participantes, usualmente de escala elevada e perfil empresarial. Corporações internacionais nas áreas de insumos agropecuários, agroindústrias de alimentos e empresas de trading têm fornecido a maior parte dos recursos para o custeio dos agricultores, utilizando como garantia a produção prevista.


As modalidades de financiamento são a CPR (Cédula do Produtor Rural), a troca de insumos por produtos agrícolas, os contratos de venda antecipada e as antecipações de contratos de câmbio para exportações. Essa situação foi reforçada pela resistência das instituições financeiras em oferecer empréstimos com recursos livres aos agricultores, em razão do alto risco do setor e da baixa difusão do seguro rural. Os agricultores que utilizam os instrumentos de crédito citados foram prejudicados em 2008 pela redução na oferta de recursos em decorrência da crise global.


Internamente, a taxa de câmbio parece ter encontrado novo patamar em torno de R$ 2,30 por dólar, o que poderá contribuir para a competitividade das exportações gerais e oferecer ganhos de renda aos exportadores, incluindo os agricultores. O Comitê de Política Monetária (COPOM) do Banco Central poderá iniciar em janeiro um movimento de redução na taxa básica de juros, tendo em vista a necessidade de minimizar a redução no ritmo de crescimento da economia. A depender da magnitude da redução a ser operada durante o ano, o acesso dos agricultores ao crédito por meio de recursos livres dos bancos poderá ser facilitado.


Os primeiros impactos da crise global foram a escassez de crédito e a redução da demanda de produtos brasileiros, como soja e carnes, gerando perda de empregos em empresas com foco em exportação. Em seguida, espera-se que ocorra um ajuste de produção e a retomada dos negócios. Se isso se confirmar, as perspectivas passarão a ser mais positivas para o setor exportador brasileiro, dado o ajuste ocorrido no câmbio.


Apesar das dificuldades que podem ser encontradas no mercado internacional, o agronegócio brasileiro poderá apresentar avanços em 2009. Entretanto, um desempenho positivo dependerá da ação dos agentes públicos e privados para construir soluções criativas para remover os entraves à produção nas áreas de crédito e seguro rural.

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