Robusto e endividado

31 de março de 2008 | Sem comentários Comércio Mercado Interno
Por: visão DO cORREIO

OPINIÃO / 30/03/2008 
  

O antagonismo salta aos olhos. O PIB do agronegócio brasileiro contabilizou crescimento de 7,89% em 2007 e, estima-se, deve avançar mais 5,8% este ano. Contudo, os produtores rurais se apresentam à nação de pires nas mãos, com dívidas vencidas e a vencer superiores a R$ 87 bilhões. O montante não surgiu de uma hora para outra. Foi acumulado ao longo de três décadas. É rolado desde 1995, em sucessivas renegociações, sempre que chega a hora do pagamento. Esta semana começa com os envolvidos tentando fechar mais uma repactuação dos débitos. O problema é que o martelo está para ser batido e não há solução definitiva à vista. Ao brasileiro, fica a sensação de que novas reprises do filme desgastado voltarão a cartaz.


Pior para todos. O setor firma fama de mau pagador, o governo consolida imagem de frouxo na cobrança e o cidadão se sente condenado a passar a vida pagando dívida interminável que, mais grave, sequer é sua. Melhor, portanto, as partes encerrarem o círculo vicioso. Primeiro, há que se reconhecer a parcela de culpa do Estado na formação desses débitos. Eles foram engordados pelo confisco do Plano Collor e ganharam mais adiposidade com o descompasso entre as correções dos contratos pela TR e o freio nos preços imposto pelo combate à inflação no Plano Real. E não é só. A falta de um seguro para perdas de safras decorrentes de causas climáticas e a precariedade da logística (armazenamento, por exemplo) e infra-estrutura (sobretudo estradas e portos) comprometem a capacidade de pagamento dos ruralistas.


Mais: safras plantadas com o dólar em alta, pagando-se caro por insumos, defensivos e fertilizantes, foram colhidas depois da reversão do câmbio, com preços em baixa. Há ainda a concorrência desleal com a produção dos países ricos, fortemente subsidiada. Ou seja, sobram argumentos ao campo. Menos para deixar de pagar ou fixar a cultura de empurrar os compromissos com a barriga. A atual exuberância do agronegócio brasileiro deve abrir ao contribuinte a expectativa de herança igualmente exuberante, não a de um saco sem fundos onde se enterrar para sempre. E o momento da virada é este. Os ventos sopram a favor interna e externamente. No país, a recuperação do poder de compra da população tem assegurado vendas recordes. No cenário internacional, o mercado é igualmente atrativo, com a economia mundial expandindo-se e as commodities valorizadas.


Amanhã, o governo oficializa sua proposta de renegociação — a quarta só na administração Lula —, em reunião dos ministros da Agricultura, Reinhold Stephanes, e Fazenda, Guido Mantega, com representantes do setor e parlamentares da bancada ruralista. Há disposição para rolar 64,23% do total, algo da ordem de R$ 56 bilhões. As condições a serem postas na mesa devem resultar num custo de R$ 7 bilhões para o Tesouro Nacional, os fundos constitucionais e o Funcafé (de apoio à cafeicultura). Ajustes, naturalmente, serão possíveis, até pela complexidade da questão. Importante é que, ao final da rodada, as tormentas do passado tenham ficado para trás e as carregadas nuvens do endividamento já não ameacem a bonança presente no campo.

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