Preços melhores deixam cafeicultores esperançosos

1 de março de 2006 | Sem comentários Entrevistas Mais Café
Por: Estado de São Paulo

Sonia Racy
soracy@estado.com.br

Depois de anos de preços baixos, o café finalmente começou a se
recuperar. Para falar sobre o ânimo dos produtores e as conseqüências desse
aumento de preços, convidamos o cafeicultor Luiz Hafers, presidente da
Associação Paranaense de Cafeicultores, que tem no café sua grande
paixão
.

A seguir, trechos de sua entrevista.

Desde 2001, o café andou com os preços internacionais muito baixos,
que só agora começam a se recuperar. Como anda o animo do produtor de
café?

Não era sem tempo. Os preços finalmente chegaram a níveis razoáveis e as
expectativas é que perdurem por algum tempo, pois a relação oferta, demanda e
estoque beira o dramático. Após tantos anos de dificuldades, essa situação
legitima uma boa dose de esperança entre os produtores. A situação ruim, de
preços baixíssimos, foi conseqüência da combinação de um excesso de oferta com a
distorção de preços por parte dos fundos. Foram anos de maus-tratos que agora se
materializam na queda da produção, simultaneamente a um aumento do consumo
mundial.

O que essa melhora dos preços significa para os produtores?

Melhores preços, mais o tamanho da colheita, estimula melhores tratos, o que
significa um aumento de produção. O Brasil produz bem, mas precisa de um esforço
maior para atingir a quantidade de café que se espera dele nos próximos anos. E
isso só acontecerá com dois ou três anos de preços compensadores. O grande temor
neste momento é que uma explosão nos preços traga uma nova expansão
irresponsável dos plantios, o que faria com que daqui 4 ou 5 anos tivéssemos uma
nova superprodução e uma nova crise.

O que é preciso para que a situação do café se estabilize?

Precisamos de uma parceria com o governo para que se regulamente instrumentos
de mercado que levem à formação de estoques nas safras grandes e a desova, nas
pequenas. Do lado da lavoura, o que se espera é responsabilidade. É agora que
devemos programar o futuro. Seria preciso estabelecer políticas contracíclicas
que evitassem tanto baixas exageradas quanto altas pirotécnicas, como já vi
acontecer três ou quatro vezes no passado. Isso não interessa nem ao consumidor,
nem ao produtor.

O senhor está falando em intervenção?

 Não, não se trata de intervenção. Sempre fui frontalmente contra isso e
continuo sendo. O que prego é uma regulamentação elaborada em parceria entre
produtores e governo. Já não tenho a ilusão do liberou geral, do deixar tudo nas
mãos do mercado, pois é ineficiente no caso de lavouras de ciclo longo: demora
tanto para responder ao estímulo quanto ao desestímulo. O Brasil precisa ter uma
política de pelo menos dez anos à frente, em que se administre o previsível para
poder estar preparado para administrar o imprevisível, quando acontecer. Vivemos
de políticas circunstanciais, de apagar incêndios passados, o que vai contra o
bom senso e a eficiência. Precisamos de uma discussão responsável sobre o médio
e o longo prazos, com o governo como parceiro e não como tutor e a lavoura como
responsável e não como vassala.

Com essa melhora dos preços, o senhor acha que a área plantada de
café pode avançar?

Por enquanto é difícil, pois os produtores ainda estão ariscos, com muitos
cadáveres insepultos – leia-se dívidas – a serem resolvidos. Uma expansão
modesta é necessária, mas todos temem a repetição do passado, com a explosão de
preços trazendo produtores de fora do café, na esperança de lucro rápido, o que
vira prejuízo no longo prazo.

A forte elevação do preço do açúcar e as boas perspectivas com o
álcool podem levar a cana a avançar sobre as terras do café?

O preço do açúcar já transformou muito cafezal em canavial no Brasil. Hoje,
porém, a grande expansão da cana é feita em cima de pastagens. Com a melhora dos
preços, o que deve acontecer é uma expansão do café, principalmente entre os
pequenos proprietários, pois por ser uma cultura muito intensiva de mão-de-obra,
a propriedade familiar leva vantagem.

O café brasileiro continua sendo competitivo em relação aos demais
produtores?

O Brasil continua sendo o mais competitivo e o mais competente no café, mesmo
com o avanço de novos produtores como o Vietnã. Produzimos entre 30% e 35% do
total mundial, exportamos 30% e somos responsáveis por 12% do consumo mundial.
Mesmo com o café perdendo espaço para a soja, ainda somos o maior produtor, o
maior exportador e o segundo maior consumidor.

E quanto à produtividade? Dá para avançar mais?

Se a produtividade do café brasileiro é boa; a das novas plantações de café é
muito boa. Técnica existe, o que faltou para melhorar a produtividade nos
últimos anos foi capital, que agora, com melhores preços, vai refletir em
melhores práticas. Na zona do cerrado, por exemplo, há várias práticas de
irrigação e mecanização a serem implementadas. Essa região sofre mais porque as
lavouras são mais vulneráveis a preço, demandando muito capital. No Paraná, se
não adubar, dá para tapear; na Bahia, o cafezal morre.

Por que o café brasileiro perdeu tanto terreno, em termos de imagem,
para o café colombiano e até para o da Costa Rica?

 Não é bem assim. A Colômbia investiu US$ 500 milhões em propaganda em
dez anos e não aumentou nem 1% sua participação no bolo mundial. Hoje, a
evolução da qualidade do café brasileiro é reconhecida, tanto que resultou num
aumento do consumo interno e num aumento da participação externa. Nos piores
dias, o Brasil respondia por 18% do consumo mundial, hoje responde por 30%. O
progresso da Colômbia não deve ser menosprezado, mas os retornos não foram assim
tão bons.

Os mecanismos da BM&F não ajudam o agronegócio?

Ajudam muito. As CPRs, por exemplo, são importantes como instrumento de
adequação de fluxo. A política de opções feita pelo governo em 2005 se provou um
sucesso. Tudo contribui para redução do risco da agricultura, que é muito alto.
Mas ações diretas na Bolsa são muito sofisticadas para a maioria dos lavradores.

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