BRASIL
26/04/2009
Genérico ineficaz
Nilo D’Avila
COORDENADOR DO GREENPEACE
Desde os tempos do império, a política brasileira é ditada pelo agronegócio, conhecido em outras épocas por nomes menos pomposos. O sistema de sesmarias que chegou ao Brasil junto com a colonização agraciava alguns poucos detentores de títulos da nobreza com grandes extensões de terras. Uma troca de favores que compunha a espinha dorsal do pacto que sobrevive até hoje entre governantes e essa pequena elite. Não é por acaso que a cultura de café e a rodução do leite, anos mais tare – na República Velha -, batizariam toda uma era política.
Esse é um setor que historicamente treme e reage ao menor sinal de mudanças, sejam elas sociais, políticas ou econômicas. Quando o assunto meio ambiente começou a ganhar algum espaço na sociedade, os representantes do agronegócio foram rápidos em se articular e transformar a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Cmads) da Câmara dos deputados em um genérico ineficaz da Comissão de Agricultura.
Criada em 2004, com o desmembramento da antiga Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias, a Cmads tem como proposta formal garantir os interesses ambientais no processo de elaboração das leis. Suas áreas temáticas são política e sistema nacional do meio ambiente; direito ambiental; legislação de defesa ecológica; recursos naturais renováveis; flora, fauna e solo; desertificação e edafologia (ciência que estuda o solo) e, por fim, desenvolvimento sustentável.
O que se viu na prática, no entanto, foi uma verdadeira ocupação dos deputados da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), que pouco a pouco vão tomando espaços cada vez maiores dentro da comissão. Hoje, dos 36 deputados que compõe a Comissão de Meio Ambiente, 18 têm vínculo com a FPA.
A estratégia dos ruralistas de se infiltrar na Comissão Ambiente tem êxito graças a pouca relevância que o tema tem para o governo federal. Para chegar a composição atual, a base do governo trocou quatro de suas vagas (três titulares e uma suplência) por posto em outras comissões. Possibilitando em uma dança das cadeiras claramente favorável aos ruralistas.
Um exemplo da atuação dos ruralistas na Comissão foi a aprovação recente, por 12 votos contra um, da Proposta de Fiscalização e Controle (PFC) 44/2008. De autoria do deputado Moreira Mendes (PPS/TO), a proposta tem o objetivo explícito licito de empastelar o trabalho do Ibama.
A PFC garante à Comissão de Meio Ambiente a inusitada tarefa de fiscalizar a origem, fundamentação, legalidade, custos, ônus público na formatação de políticas públicas ambientais, em especial em relação na criação de unidades de conservação (UCs). A Comissão agora também pode suspender ou o cancelar atividades produtivas como os Planos de Manejo Florestal Sustentável (PMFS). O que na prática significa dar à Comissão poderosas ferramentas capazes de parar as operações do Ibama de combate ao desmatamento na Amazônia e melar os processos de- criação de unidades de conservaço.
A comissão que deveria zelar para o que a o Brasil tenha uma legislação que garanta o bom uso dos recursos e a saúde ambiental do país é usada para dificultar ainda mais a já dificil missão dos órgãos ambientais.
A defesa cega da manutenção de uma visão ultrapassada de exploração da terra pelo homem impacta todos os setores da sociedade, inclusive o agronegócio, que não está decodificando as preocupações ambientais vindas do próprio mercado e, correndo, assim, o risco de perder espaço comercial. Salvo exceções, evidentemente.
A agricultura brasileira sempre usou e abusou do meio ambiente, exaurindo os recursos naturais que a sustentam. A mata atlântica foi quase extinta e a Amazônia já teve 720 mil k m2 desmatados, sendo que cerca de 80% só para a pecuária. O agronegócio não pode mais se expandir para dentro das florestas. O Brasil tem áreas já convertidas o sufientes para garantir o aumento da produção.
O aquecimento global, outro assunto que deveria estar em pauta constantemente na Comissão, passa ao largo das discussões da bancada ruralista. O que os ruralistas esquecem é que as mudanças climáticas não escolhem endereço.
O estudo da Embrapa, “Aquecimento Global e a Nova Geografia da Produção” , aponta que como uma das consequências das mudanças do clima o agro negocio brasileiro poder perder R$ 7 bilhões em 2020 – valor que pode dobrar em 2070. A proteção do meio ambiente é de interesse de todos. É uma espécie de previdência, garantindo entre outras coisas, o futuro da atividade agropecuaria. No Brasil, de políticos a artistas de televisão, todo mundo quer um boi para chamar de seu, mas esquecem completamente que não existe agricultura sem água, sem solo fértil, sem polinizadores…