Governo federal recompõe estoque regulador de café

22 de setembro de 2009 | Sem comentários Análise de Mercado Mercado
Por: 22/09/2009 - Página Rural

Um ano depois de liquidar as sacas que restavam nos antigos armazéns do IBC, Ministério da Agricultura volta atrás e revê política cafeeira.


Luana Gomes

Brasília/DF – Quase 20 anos após a extinção do Instituto Brasileiro do café (IBC), autarquia federal que definiu as diretrizes da política cafeeira brasileira entre 1952 e 1989, os armazéns do instituto voltarão a receber novos grãos. Um ano depois de anunciar que iria liquidar os estoques públicos de café, o governo voltou atrás e decidiu retomar as compras.


Para enxugar o excesso de oferta e sustentar os preços, anunciou que pretende adquirir, até o final do ano que vem, 10 milhões de sacas, o equivalente a 25% a produção prevista para a safra de 2009. Se isso acontecer, os chamados estoques reguladores nacionais voltarão aos níveis de 1997/98, quando, apesar da desregulamentação do mercado, o país ainda detinha um dos maiores estoques mundiais do produto.


O movimento de recomposição dos estoques internos começou em julho, com quatro leilões de contratos de opções com vencimento em novembro para a compra de 3 milhões de sacas. O governo também pretende adquirir cerca de 2,6 milhões de sacas através da conversão em produto de parte da dívida dos cafeicultores.


Para as demais 4,4 milhões, o governo irá realizar leilões de Aquisição do Governo Federal (AGF). “Sem dúvida isso marca a retomada da política de estoques reguladores”, declara o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes. Uma política de longo prazo, assegura. “Dentro de cinco anos vai faltar café no mundo. Em 2012 e 2013 é provável que haja déficit e que os estoques comecem a ser usados”, prevê.


“A decisão de desregulamentar o mercado, no final dos anos 80, e de zerar as reservas nacionais foi equivocada e a retomada da política de formação de estoques é positiva. Mas não nestes preços”, defende Gilson Ximenes, presidente do Conselho Nacional do café (CNC), órgão que representa produtores e cooperativas de café do país. “Nessa base de preço, o governo não vai comprar uma grama de café”, garante o dirigente. Seja para as operações de AGF ou para a troca de dívida por produto, o governo fixou o preço mínimo de garantia em R$ 261,69 por saca de 60 quilos de café beneficiado (bebida dura tipo 6).


Stephanes reconhece que o preço pode ficar abaixo dos custos de produção em algumas regiões, mas o Ministério da Agri­cultura (Mapa) argumenta que antes de definir o valor um grupo de trabalho formado por produtores e técnicos dos ministérios da Agricultura, Fazenda e Pla­­nejamento consultou 42 cooperativas de café brasileiras sobre seus custos de produção. Se­­gundo o documento, as cooperativas do Paraná indicaram custos em torno de R$ 240.


O governo afirma que é preciso efetuar um choque (redução) de oferta do produto brasileiro para elevar o preço pago aos produtores. Mas a formação de estoques pode não ser a solução, defende o diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria do café (Abic), Nathan Herszkowicz. “Quem foi que disse que 10 milhões de toneladas é suficiente? Pode não ser. E, se não for, não vai adiantar nada o governo retirar esse volume do mercado porque os preços não vão se valorizar”, considera. Segundo ele, a formação de estoques pode ser negativa para o Brasil porque o país corre o risco de perder participação no mercado exportador. “Já não somos mais o grande player mundial que éramos. A regulamentação do mercado provou ser uma prática absolutamente desastrosa”, diz Herszkowicz.


Para o Mapa, dosando bem a oferta por meio da ampliação dos estoques ou da redução da produção é possível evitar a perda de participação do Brasil no mercado internacional. “Preci­samos tirar os estoques das mãos da indústria dos países importadores”, avalia Stephanes. Segundo estudo do ministério, nos últimos anos houve transferência dos estoques mundiais de países produtores para os consumidores. Conforme o relatório, enquanto nos últimos 10 anos os estoques localizados em países que produzem café caíram de 54 milhões para 18 mi­­lhões de sacas, os países importadores elevaram a quantidade de produto armazenado de 8 mi­­lhões para 23 milhões de sacas.


O objetivo do ministério é diminuir a oferta de café no mercado em 2010, período em que o Brasil terá uma safra de bienalidade positiva. A florada do novo ciclo ocorre entre setembro e outubro e as mesmas chuvas que atrapalham a colheita da safra de 2009 são um prenúncio de boa produção no ciclo de 2010. Tirando 10 milhões de sacas de café do mercado até o próximo ano, o governo quer puxar os preços ao produtor para a casa dos R$ 300 por saca. Hoje, segundo o Mapa, os produtores brasileiros recebem entre R$ 230 e R$ 290 pela saca de café arábica, valor que remunera o custo de produção em algumas regiões, mas abaixo do custo em outras, dependendo do modelo tecnológico utilizado.


No controle ou não do setor, a estratégia da intervenção

Esta não é a primeira vez que o governo intervém no mercado do café para forçar a alta dos preços do grão. A primeira intervenção federal oficial aconteceu ainda em 1906, quando foi firmado o chamado Convênio de Taubaté, que definiu uma política para a valorização do produto. Após a fixação de preços mínimos, os governos estaduais se comprometeram a comprar toda a produção e usar os estoques para impedir oscilações bruscas no preço do produto, além de proibir novos plantios para evitar queda das cotações.


Entre 1931 e 1944, o governo chegou a literalmente queimar cerca de 78 milhões de sacas de café, o equivalente a três anos de consumo global na época, para estimular a valorização dos preços. Na década de 30, a quebra da Bolsa de Nova York e a grande depressão norte-americana derrubaram o preço do produto nos mercados externo e externo e levaram à criação, em 1931, do primeiro instituto federal com a função de fortalecer a cadeia cafeeira no Brasil, o Conselho Nacional do café (CNC).


Outros institutos surgiram desde então, entre eles o De­­partamento Nacional de café (DNC), autarquia federal subordinada ao Ministério da Fazenda que controlou o setor de 1933 a 1946, e o famoso Instituto Bra­­sileiro do café (IBC). Criado em 1952, o IBC definiu as diretrizes da política cafeeira até 1989. Hoje, o setor é regido pelo Con­selho Deliberativo da Política do café, criado em 1996, vinculado ao Ministério da Agricultura (Mapa).


A extinção do IBC foi um dos mais duros golpes para o setor cafeeiro, que já vinha combalido desde a grande geada negra de junho 1975. Com a extinção do instituto, os estoques reguladores brasileiros, formados nos anos de 1987 a 1989, foram gradativamente vendidos a partir de 1993 e praticamente liquidados no ano passado. Há seis anos, quando foram retomados os leilões de venda após a extinção do IBC, o Brasil contava com quase 17 milhões de sacas estocadas, mais de 10 milhões delas armazenadas no Paraná. Desde então, sem novas aquisições e com leilões de venda periódicos, esse volume vem caindo ano a ano. No final de 2008, os estoques públicos do país somavam apenas 521,5 mil sacas, conforme levantamento do Departamento de café (Decaf) do Mapa.


A maior parte dos estoques governamentais remanescentes (379,2 mil sacas) está em Minas Gerais, estado que hoje é o principal produtor de café do país. No Paraná, que já foi o maior produtor nacional, chegou a ser responsável por 28% da safra mundial no início da década de 60 e hoje ocupa a quarta colocação no ranking nacional, o volume armazenado é apenas simbólico. O levantamento do Mapa, referente a julho de 2008, acusa estoques de quase 35 mil sacas no estado, mas na prática a realidade é outra. Armazenados quase 20 anos, os grãos adquiridos pelo governo durante a década de 80 perderam qualidade e peso.


Das 34,9 mil sacas que constam no levantamento, 6 mil que foram entregues ao governo como garantia de financiamento aguardam decisão judicial para poderem ser comercializadas; 23 mil foram doadas ao Instituto Agronômico do Paraná (Iapar); e outras 2 mil foram roubadas. A conta fecha com a chamada quebra de peso, que exclui os grãos que já chegaram ao armazém com umidade elevada e os que estragaram com o tempo. São aproximadamente 4 mil sacas.


 


Comentários


Ricardo Luis Olivi 
Sou a favor da recomposição do estoque regulador e de agradecer a opinião do diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria do café (Abic), Sr Nathan Herszkowicz , pois vem comprovar que é um real absurdo o que acontece com a cafeicultura brasileira onde mesmo retirando 25% da produção prevista talvez se não seja suficiente para elevar os preço. O governo sim tem que intervir e terminar de vez com os estoque externo.

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