por Maurício Macedo
Um hábito típico dos brasileiros também traz benefícios à saúde mental. Em doses recomendadas, o consumo diário do famoso cafezinho pode prevenir o declínio de funções do cérebro como atenção, percepção, memória, raciocínio, imaginação, pensamento e linguagem. A constatação faz parte de uma pesquisa da neurocientista gaúcha Lisiane Porciúncula.
Publicado no periódico especializado Neurochemistry International, o estudo recebeu a denominação A Cafeína como Estratégia de Prevenção do Declínio Cognitivo no Envelhecimento e em Modelo Experimental da Doença de Alzheimer. A pesquisadora do Departamento de Bioquímica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) fez uma experiência com camundongos e comprovou que a ingestão diária de cafeína ajuda a manter o bom desempenho mental mesmo na velhice.
O estudo analisou a relação da cafeína com a Doença de Alzheimer, que é caracterizada por perda de memória, demência e desorientação. “Foi observado que a cafeína previne a amnésia induzida pelo peptídeo (beta-amiloide) que se acumula ao redor dos neurônios na doença e também a perda de proteínas que fazem parte da sinapse induzida por esse peptídeo”, explica.
Segundo ela, pela primeira vez os animais foram observados desde a idade adulta até o envelhecimento. Ao longo de 12 meses de ingestão diária de cafeína, percebeu-se que os camundongos idosos permaneceram com o mesmo desempenho que os adultos em tarefas de aprendizado e memória. “A cafeína parece então prevenir o declínio cognitivo normal decorrente da idade nesses animais de laboratório”, afirma.
Lisiane diz que a dose recomendada varia de duas a três xícaras de café por dia, algo em torno de 150 a 250 miligramas. “Independentemente da classe social, o café está sempre presente na dieta dos brasileiros, seja em maior ou menor quantidade”, destaca.
Ela lembra ainda que a cafeína também é consumida em chás, mate, chimarrão, chocolates e refrigerantes. “Considerando que a população está envelhecendo pelo aumento da expectativa de vida, a pesquisa auxilia no conhecimento de como um componente usual da nossa dieta pode ser benéfico para a saúde mental”, ressalta.
Novo estudo analisa efeito em fêmeas
A primeira parte da pesquisa foi financiada pelo programa L”Oréal Unesco para Mulheres na Ciência. A neurocientista Lisiane Porciúncula quer agora dar continuidade ao estudo. Para isso, busca uma parceria com a indústria nacional de café.
A pesquisadora se prepara para ingressar em uma nova fase, na qual vai analisar o efeito em fêmeas. A literatura médica mostra que a cafeína atua mais efetivamente em mulheres do que em homens.
“Ela apresenta esse efeito diferencial conforme o gênero. Já se viu isso em duas patologias: na Doença de Parkinson e também para Alzheimer”, garante. “O objetivo será tentar descobrir qual é o efeito, a diferença, que proteína, que molécula, que evento molecular está envolvido nesse efeito distinto da cafeína conforme o gênero.”
O método de pesquisa também vai observar as funções do sistema nervoso central na formação do feto. Tudo isso porque Lisiane quer estabelecer a dose recomendada de cafeína na dieta de gestantes, “pois ainda existem médicos que desaconselham o consumo, principalmente nos três primeiros meses da gestação”.
O estudo com as fêmeas grávidas, que deve durar cerca de um ano, está previsto para começar ainda em 2009. A intenção da neurocientista da Ufrgs é fazê-lo em conjunto com a Universidade de Coimbra, de Portugal.