Clóvis Campos/Agência Sebrae |
Dos US$ 91 bi movimentados pelo setor anualmente, apenas US$ 9 bi ficam com os países produtores |
São Paulo – Considerado o segundo maior produtor mundial de riquezas, perde apenas para o petróleo, o café gera hoje algo em torno de US$ 91 bilhões anuais ao mundo. Mas grande parte dessa riqueza não beneficia os 60 países produtores de café onde 25 milhões de pessoas sobrevivem dessa atividade. Para se ter uma idéia do que o café representa para a economia da grande maioria dos países produtores basta citar alguns exemplos.
De acordo com o Banco Mundial, em Uganda o café é a principal fonte de sobrevivência para mais de 25% da população; na Etiópia, contribui com 54% das receitas das exportações; em Ruanda assegura 31% das divisas; na Índia emprega três milhões de trabalhadores; no México, congrega 280 mil das famílias mais pobres do estado de Puebla.
Mesmo assim o cruel jogo imposto pelas multinacionais – que ditam preços ao mercado produtor, aproveitando-se da dependência que as economias dessas nações têm da cafeicultura – faz com elas fiquem com a parte do leão da receita gerada anualmente pelo café. Ou seja, dos US$ 91 bilhões movimentados anualmente pelo mercado cafeeiro, os países produtores ficam com apenas US$ 9 bilhões. Dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) mostram que hoje os principais importadores de café verde, normalmente os países desenvolvidos, pagam US$ 100 por saca. Depois que o produto é processado e industrializado o café passa a valer US$ 10 mil.
“Isso dá a dimensão da diferença do preço recebido pelo produtor e o despendido pelo consumidor na ponta da cadeia”, disse o então ministro da Agricultura Roberto Rodrigues ao participar, em setembro de 2005, da 2ª Conferência Mundial do Café, em Salvador.
Dados do relatório do Programa de Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), divulgado em 2006, mostram que países como Alemanha, Itália, Bélgica, Estados Unidos, França, Espanha, Holanda, Canadá, Inglaterra, Suíça, conseguem, com as exportações de café, receitas superiores a grande parte dos países produtores como El Salvador, Nicarágua, Quênia, Camarões, Peru, Equador, Honduras, Costa do Marfim e demais relacionados na lista da Organização Internacional do Café (OIC).
Por isso, os especialistas do mercado cafeeiro entendem que o grande desafio é a reordenação do mercado internacional que, no entender dessas fontes, é o principal capítulo da luta por um comércio mundial mais justo.
Para os mentores da política cafeeira do Brasil, a política cafeeira mundial deve ter como objetivo a estabilidade a longo prazo, que termine com a distorção de quem planta ganha pouco, e quem processa ganha muito.
Hoje, as cinco maiores indústrias de torrefação (Nestlé, Kraft Foods, Procter & Gamble, Sara Lee e Tchibo) adquirem 70% da oferta mundial de café verde. “O que quer dizer que você tem que realmente disputar o mercado contra gigantes”, explica Guilherme Braga Abreu Pires Filho, diretor geral do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).
Segundo ele, as grandes indústrias investem milhões de dólares a cada ano para promover a imagem de suas respectivas marcas. Usando diferentes marcas e produtos, as torrefadoras diferenciam seus produtos por meio de imagem e sabores específicos, evitando a concorrência via preços.
Outro fator destacado por Braga é que o grande canal de distribuição do café é o supermercado, o que exige das empresas capacidade de estocagem e logística. “Por exemplo, o supermercado não estoca produto, a empresa precisa repor, portanto, tem de dispor de armazéns. Além disso, o empresário precisa ter um bom esquema de distribuição, com vários pontos de venda”, explica.
Tudo isso somado à divulgação do produto custa muito dinheiro. “Ninguém entra num mercado consolidado sem o apoio de uma campanha promocional. Isso tudo cria um grau de dificuldade grande para quem quer se tornar um exportador de torrado e moído e solúvel”, diz Guilherme Braga.
Segundo ele, um caminho possível é começar por nichos específicos de mercado. “Por exemplo, os supermercados que têm espaço para marcas próprias. Então você produz o café aqui e já envia com a embalagem final, que leva a marca do comprador. Outra possibilidade é você atuar via distribuidores regionais, que não atuam em grandes supermercados mas em redes auxiliares, como padarias, por exemplo”, ensina.
Fonte: http://www.anba.com.br/especial_retranca.php?id_especial=338&id=264 – Acessado em 26 de janeiro 2006