Novidade é guardada a sete chaves. Mudas são originárias da Etiópia, berço de todos os cafés.
ALBERTO GASPAR
Campinas (SP)
Patrimônio plantado por mãos brasileiras. O Instituto Agronômico de Campinas (IAC) é do tempo do imperador Pedro II. Foi criado para estudar o café, que se expandia no país no século 19. Aos poucos, uma enorme riqueza foi sendo depositada na terra. Uma reserva genética de valor incalculável. Hoje são 120 mil plantas de café.
“Essa reserva genética permitiu que o Brasil chegasse ao patamar que chegou em termos de cafeicultura. O Brasil é o maior produtor, maior exportador e o segundo maior consumidor de café, graças, em parte, às variedades das plantas que mantemos em coleção”, explica o pesquisador Oliveiro Guerreiro Filho, do IAC.
Beleza não é fundamental. Não importa se a planta tem porte de árvore ou é um arbustinho raquítico – qualquer uma pode esconder algo que os pesquisadores procuram, ou apenas surpreender visitantes. Quem já viu grãos de café com formato de carambola?
Pois foi vasculhando em um mar de cafés que alguém encontrou um tesouro: mudas de um café descafeinado pela própria natureza. A origem é a Etiópia, berço de todos os cafés. A descoberta, no Brasil, foi fruto de muita paciência.
“A palavra certa seria garimpar entre cerca de quase 3 mil plantas, procurando um material que fosse promissor para esse tipo de trabalho”, diz a pesquisadora Maria Bernadete Silvarolla, do IAC.
Um lote de plantas que saiu da Etiópia passou pela Costa Rica e chegou ao IAC nos anos 70 foi o escolhido por estar mais perto das origens africanas. Foram mais de cinco anos em laboratório, testando os grãos de cada planta, medindo o teor de cafeína. A pesquisadora até pensou em desistir.
“Quando veio o resultado positivo, nem acreditamos. O café arábica normal tem em torno de 1,2% de cafeína nos grãos. Esse material tem em torno de 0,07 de cafeína nos grãos. É muito próximo de zero”, constata Maria Bernadete.
A agulha encontrada no palheiro é um segredo muito bem guardado. A equipe do Globo Repórter não pode nem ver a planta original no campo, só as mudinhas clonadas a partir dela. Existe uma corrida mundial atrás do que Maria Bernadete já tem nas mãos.
“Existe um mercado para o café descafeinado constituído por aquelas pessoas que apresentam algum efeito colateral em relação à cafeína, ou seja, dores de cabeça, palpitações. É um café como qualquer outro, você não nota diferença nenhuma. As pessoas em geral dizem que o café descafeinado é diferente porque, aparentemente, o solvente tiraria algo além da cafeína que poderia fazer falta em questão de aroma e sabor. Sai alguma coisa além da cafeína. E aqui não”, esclarece Maria Bernadete.
Gostoso, mas ainda longe de chegar aos supermercados. A planta não tem cafeína, mas também produz poucos grãos. Não seria bom negócio para o agricultor. O desafio agora é melhorar esse aspecto. Mais trabalho de pesquisa.
“Prevemos em torno de nove a dez anos de trabalho ainda”, diz Maria Bernadete.