Por decisão da 5ª Turma Especializada do TRF (Tribunal Regional Federal) da 2ª Região, dez empresas exportadoras de café deixarão de receber uma indenização de cerca de 300 milhões de libras esterlinas (mais de R$ 1 bilhão, pela cotação atual). A reparação seria decorrente de danos materiais e morais ocorridos após a malsucedida operação Patrícia, realizada em 1986, durante o governo Sarney.
Segundo informações dos autos, a operação foi realizada há 21 anos e recebeu o nome por causa da filha do presidente do extinto IBC (Instituto Brasileiro do Café), Hugo Napoleão.
Preocupado com a queda do preço do café no mercado internacional, o IBC celebrou contrato com as exportadoras. As empresas se obrigavam a adquirir estoques de café no Terminal de Londres, retirando o produto do mercado externo, de forma a elevar a cotação no país e melhorar a receita cambial do Brasil. Em até 90 dias, o IBC entregaria lotes de outro tipo de café ou ressarciria os gastos, em dólares.
Em fevereiro de 1987, contudo, o governo brasileiro decretou moratória unilateral, ou seja, o pagamento dos juros relativos à dívida externa aos bancos privados internacionais foi suspenso. A decisão, do então ministro Dílson Funaro, visava conter a expansão do consumo interno e a supervalorização da taxa de câmbio causada com a implementação do Plano Cruzado no ano anterior. E ainda, repor as reservas cambiais do país, que estavam muito baixas.
Com a crise cambial decorrente, o IBC não conseguiu honrar o compromisso contratual com as empresas Mercantil Trading S/A, Exportadora Brasileira de Cafe S/A – Brascafe, Cafenorte S/A Importadora e Exportadora, Unicafe Lausanne S/A, Citoma Trading Limited, Tristao Trading Inc., Usicafe S/A, Peracio International S/A, Atlantic Coffee Corporation e Bourbon Instant Coffee, que ajuizaram ação indenizatória na Justiça Federal do Rio. Segundo a defesa, apenas uma parcela, de US$ 15 milhões, chegou a ser paga.
Ação
A decisão do TRF-2 foi tomada em apelação cível apresentada pela União contra o pagamento da indenização. Segundo o advogado das empresas, além destas dez, oito outras empresas teriam participado da operação e foram prejudicadas com o insucesso. Ainda de acordo com dados do processo, as exportadoras acabaram vendendo o café adquirido.
O Ministério Público Federal argumentou que o IBC seria incompetente para firmar o contrato que viabilizou a operação Patrícia. A autoridade que poderia celebrá-lo, disse o procurador da República, seria o Conselho Monetário Nacional. Além disso, o objeto do contrato seria ilícito, porque não se trataria de fomento interno às exportações, mas de manipulação no mercado internacional, com a tentativa de criar um preço artificial, burlando, inclusive, os contratos comerciais brasileiros.
Para o desembargador federal Paulo Espírito Santo, que proferiu o voto vencedor no julgamento ocorrido no TRF-2, o contrato era lícito e o agente (o IBC) era competente, considerando que a extinta autarquia existia para regular, legitimar e incrementar o mercado brasileiro e internacional com vistas à obtenção de melhores e mais eficientes divisas para o Brasil. E foi isso, afirmou, que o instituto fez ao montar a operação e convidar as empresas para tomar parte nela.
No entanto, lembrou o desembargador, as exportadoras celebraram o contrato espontaneamente e atuaram em uma operação de risco, como, aliás, é inerente a qualquer atividade empresarial. Ele argumentou ainda que a operação só não produziu os resultados econômicos esperados por conta das crises cambiais de 1987 e 1988, e não por culpa do governo.
Ainda conforme o relator, a apuração do caso em um processo administrativo não demonstrou ter havido dolo por parte da direção do IBC ou das empresas que operam no mercado cafeeiro.
Por fim, destacou que não há, no caso concreto, por parte da União, responsabilidade civil objetiva, que geraria a obrigação de indenizar. Nos termos do artigo 37 da Constituição Federal, é necessário, para isso, que a atuação do agente público tenha sido, comprovadamente, a causa do dano sofrido por aquele que pede a indenização.
“Não posso admitir uma responsabilidade civil da União, que sucedeu uma autarquia que agia juntamente com os interesses dos empresários, na elevação dos preços no mercado nacional e internacional, no contexto de um prejuízo, porque houve um fato que não era previsto, um fato aleatório, que era o risco do câmbio”, concluiu.
Proc. 1992.51.01.000378-1
Segunda-feira, 4 de junho de 2007