28 de abril de 2006 – Em meio à crise pela qual passa o agronegócio, os produtores de café têm o que comemorar. Não que eles também não tenham dívidas. Pelo contrário, vêm de anos de crise. Mas, pela primeira vez, têm uma política diferenciada para o tipo de cultura. Ao contrário dos demais produtos, o café tem um ciclo bianual. Ou seja, em um ano a produção é maior; no outro, menor. Em virtude disso, era necessária uma política que pensasse nos 24 meses e não medidas paliativas anuais.
Pela primeira vez, o agronegócio do café pode planejar sua produção, sabendo que existem mecanismos de aporte governamental e privado suficientes para o remanejamento dos excedentes. Uma das primeiras medidas neste sentido foi a aprovação, inédita, pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), de um único voto que libera todos os recursos do Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé) para uma safra. Anteriormente, a aprovação se dava conforme a necessidade, no decorrer do ciclo de produção e comercialização, causando atrasos e descontinuidade.
Com a liberação dos recursos, o governo começa a consolidar uma política anticíclica, contribuindo para melhorar a distribuição da oferta, com reflexos positivos sobre a renda do setor. A safra atual está estimada em 40,6 milhões de sacas (60 quilos), mas devido à bianualidade das lavouras a previsão é de que a próxima seja menor. A intenção do agronegócio do café, apoiado pelo governo, é deslocar a comercialização de uma parte significativa do excedente da safra atual para o primeiro trimestre de 2008, época em que deverá ocorrer uma menor oferta.
A nova política para o café vem em um momento em que os preços internos começam a cair, pela pressão da proximidade da colheita e pela movimentação de fundos nas bolsas. Aliado a isso, o setor vive, assim como todo o agronegócio, o problema da variação cambial. Essa defasagem se verifica na proximidade entre os preços pagos aos produtores e os custos. Em suma, a crise ainda não acabou.
Tem muito produtor praticamente pagando para colher o seu café. Neste sentido, os recursos anunciados pelo governo surgem quando o setor mais precisa, para deslocar a oferta e reduzir essa tendência. Com essa medida, o agronegócio do café espera começar a reequilibrar suas contas e voltar a se capitalizar para, deste modo, planejar melhor seus investimentos futuros, que serão necessários, como apontam as perspectivas mundiais para o café.
No período de 2000 a 2004, a cafeicultura brasileira viveu um cenário negativo, desencadeando um processo de endividamento do setor. A partir de 2004, com a pressão do setor, o governo programou medidas conjunturais, como uma alocação maior de recursos para o Funcafé. Com isso e, principalmente, com um cenário mundial de oferta reduzida e consumo crescente, houve um aumento nos preços. No período de crise, a saca do café era vendida a US$ 40, muito inferior ao custo de produção. Hoje a saca está em US$ 130 e se o câmbio estivesse melhor, a cafeicultura em pouco tempo estaria livre das dívidas. Agora, se for consolidada uma política estruturante, a perspectiva é de que as oscilações sejam menores e o setor possa recuperar renda e aproveitar os bons tempos que se avizinham.
(Gazeta Mercantil/Caderno B – Pág. B-12) ( (Maurício Miarelli – presidente do Conselho Nacional do Café (CNC).