Por Ana Rute Silva
Portugal está fora da experiência-piloto que vai decorrer em cerca de 25 cafetarias nos Estados Unidos. A maior rede de cafetarias do mundo reinventa-se e chega este ano à Índia
É um passo arrojado e algo surpreendente. Não se vai à Starbucks beber um copo de vinho e comer queijo, ou bebericar uma cerveja depois de um longo dia de trabalho. Mas Howard Schultz, que regressou em 2008 à liderança da empresa depois de oito anos de ausência, está a dar nova vida à emblemática multinacional norte-americana. Até ao final do ano, 25 cafetarias seleccionadas nos Estados Unidos vão oferecer vinho, cerveja e “comida premium”, como pratos de queijo e fruta ou focaccia(pão italiano). A intenção é clara: chamar mais e novos clientes à maior rede de cafetarias do mundo durante os períodos menos movimentados, sobretudo à noite.
Mas ao mesmo tempo que abre espaço a um novo tipo de consumidor – não tão focado na experiência do café -, a medida responde aos pedidos dos clientes fiéis que queriam “mais opções para relaxar nas lojas à noite”, adiantou ao PÚBLICO fonte oficial da Starbucks. “Esperamos criar um novo pretexto para os clientes visitarem as lojas à noite, num ambiente confortável e convidativo”, acrescentou.
Esta nova aposta só vai acontecer, para já, nos Estados Unidos e em localizações seleccionadas. O café, garante a Starbucks, “vai continuar a ser o centro da experiência”. Portugal e o mercado europeu ficam por enquanto fora desta equação.
A diversificação de produtos faz parte de uma nova estratégia liderada por Howard Schultz para relançar a histórica marca e os seus resultados financeiros. Habituada ao crescimento vertiginoso, a empresa chegou a inaugurar uma média de seis lojas por dia, mas a expansão agressiva tornou-se, nas palavras de Schultz, “cancerígena”. “O crescimento não deve ser, e não é, uma estratégia. É uma táctica. A maior lição que aprendi ao longo dos anos é que o crescimento e o sucesso encobrem muitos erros. Vamos continuar a cometê-los, mas aprendemos uma grande lição”, disse numa entrevista concedida à publicação onlineda consultora McKinsey.
Entre Julho de 2008 e o primeiro semestre de 2009, o grupo encerrou 600 cafés nos Estados Unidos e despediu 12 mil trabalhadores. “Fiquei horrorizado quando soube que as lojas que teríamos de fechar tinham aberto há menos de 18 meses”, confessa Schultz. Com a reestruturação encabeçada pelo CEO regressado, a Starbucks conseguiu aumentar as receitas e apostar em novos (e mais ambiciosos) serviços. De acordo com a Bloomberg, no final do último ano fiscal a facturação cresceu 20%, para 11,7 mil milhões de dólares (cerca de 8,9 mil milhões de euros) em comparação com 2009, quando a empresa teve receitas de 9,77 mil milhões de dólares. No mesmo período, os lucros mais do que triplicaram e a Starbucks conseguiu engolir uma fatia de 33% do mercado do café e snacksnos Estados Unidos, avaliado pela consultora IBISWorld em 26,5 mil milhões de dólares.
Os últimos dados financeiros, referentes ao período de Setembro de 2011 a Janeiro, mostram receitas líquidas recorde de 3,4 mil milhões de dólares (uma subida de 16% face aos meses homólogos). As vendas, mesmo excluindo a abertura de novas lojas, cresceram 9% no mercado global e 2% na região europeia, onde a facturação atingiu os 303 milhões de dólares, mais 17%. A diversificação da multinacional, presente em 55 países com 17 mil lojas, ajudou a atingir estes bons resultados. Além da “experiência do café”, a nova ambição é ser, ao mesmo tempo, retalhista e fornecedora. A chamada divisão de CPG (Global Consumer Products Group) aumentou as receitas 72% graças ao lançamento de cápsulas (K-Cup) de café e de chá que são vendidas directamente em canais de distribuição (como supermercados). A multinacional fez ainda uma parceria com a gigante Kraft Foods (dona das bolachas Oreo, entre outros) para a distribuição de café embalado em supermercados, nos Estados Unidos e Canadá.
Os mercados emergentes são ainda um palco importante para a nova estratégia da Starbucks. Esta semana, juntou-se à Tata Global Beverages (do grupo Tata) para, a partir de Agosto, abrir cafetarias. A intenção é ter 50 lojas nos primeiros 12 meses desta operação, começando por Bombaim e Nova Deli. O café servido nas lojas será fornecido localmente, com a particularidade de as embalagens passarem a ostentar as marcas dos dois grupos. O consumo desta bebida está a crescer na Índia (duplicou na última década), o país com o segundo maior crescimento após a China. E a parceria com a Tata também vai aproveitar as mudanças de hábito dos consumidores.