Com saturação do mercado para lojas comuns, rede investe em unidades de valor
agregado, onde vende 1 kg de café por US$ 90
Stephanie Strom – The New York Times / Estado de São Paulo
SEATTLE – A abertura de uma nova cafeteria, em especial Starbucks, deixou de ser um “evento”
nos Estados Unidos há algum tempo. Por isso, ao longo do último ano, a Starbucks desenvolveu um
projeto voltado à alta renda: a Starbucks Reserve Roastery & Tasting Room. O projeto tem a intenção de
atrair os aficionados em café, dispostos a pagar até US$ 90 por um quilo de grãos raros. A empresa
acredita que tem potencial de chegar a cem unidades “chiques” em todo o país.
No entanto, a empresa não chega sozinha a este mercado. Concorrentes como Stumptown Coffee
Roasters, Dillanos Coffee Roasters e Blue Bottle Coffee estão entre os líderes do ramo de cafés raros.
Esses grãos especiais muitas vezes têm origem em uma só fazenda ou em pequenas cooperativas. Por
isso, a produção é limitada e distribuída algumas vezes por ano.
Esse raciocínio é justamente o oposto do praticado da Starbucks, que sempre priorizou a
produção em massa. Tanto é assim que a diretora de cafés da Cherry Street Coffee House, Laila
Ghambari, chama a Starbucks de “McDonald’s do café”. A Cherry é uma das empresas que já atuam
neste segmento e tem hoje dez lojas na região de Seattle.
Para distanciar as lojas Reserve de sua “prima pobre”, a Starbucks está abandonando sua famosa
marca para tentar atrair quem realmente acha que entende de café. O logotipo com a sereia foi
abandonado. As lojas Reserve são identificadas por uma marca composta por uma estrela e a letra “R”,
escrita em vermelho. A Starbucks diz que o preço médio por xícara da linha Reserve deverá variar de
US$ 4 a US$ 7.
Sob pressão. As cafeterias comuns crescem pouco nos Estados Unidos. Entre os fatores que
atrapalham os resultados de grandes redes como a Starbucks está a emergência de cafeteiras caseiras no
estilo gourmet, como a Nespresso. “Quando se olham as importações de café nos últimos anos, fica claro
que o mercado está bem maduro”, diz Josh Green, presidente da Panjiva. “Estamos falando de um
crescimento geral bem modesto – e é nesse momento que as empresas começam a busca nichos
lucrativos.”
Cada loja da versão “chique” da Starbucks deverá custar R$ 20 milhões. A loja lembra uma
espécie de “fantástica fábrica de café”. Tubos transparentes instalados no teto e nas paredes alimentam
torrefadores de cobre com café verde. Há canecas, grãos de café e acessórios espalhados pelo espaço de
15 mil metros quadrados. “Esse é o lugar mágico onde o café passa a existir”, diz Liz Muller, diretora de
de design da Starbucks. “Nós vamos levar o consumidor para uma jornada, durante a qual ele será
apresentado a cafés raros”, diz Howard Schultz, presidente da rede Starbucks.
Segundo a presidente da divisão de consumo da empresa de marcas Daymon Worldwide,
Virginia Morris, está cada vez mais claro que os consumidores com dinheiro para gastar buscavam
experiências singulares no setor de café. No entanto, as companhias especializadas em grãos raros
jamais pensaram que uma gigante do mercado de massa iria apostar no nicho. “Acho que você pode
começar pequeno e crescer. Mas, se você já é grande, é difícil convencer o cliente de sua autenticidade”,
diz David J. Morris, sócio da cafeteria Dillanos.
Enquanto busca um nicho “chique”, a gigante do café também busca melhorar seu negócio
“comum”. Embora as vendas da Starbucks tenham sido recordes no ano fiscal encerrado em setembro,
com faturamento de US$ 16,4 bilhões, os resultados nos Estados Unidos não foram tão bons. Por isso, a
empresa começou a testar um sistema de pagamento móvel na cidade de Portland, no Oregon. Além
disso, premiou 14 clientes com cartões dourados que garantem um suprimento ilimitado de produtos da
rede – ao estilo Willy Wonka, de A Fantástica Fábrica de Chocolate.
Origem. Os microlotes dos cafés “chiques” nos Estados Unidos não têm só região de origem.
Como nos vinhos, recebem os nomes das fazendas onde foram produzidos, como a Finca El Manzano,
de El Salvador. Essa empresa, que fornece para a Dillanos, produziu somente 60 sacas de café no ano
passado. O grão foi usado por Laila Ghambari, diretora de cafés da Cherry Street, no concurso anual de
baristas americanos – que ela ganhou.
Até recentemente, a Dillanos predominantemente atuava no ramo de clientes comerciais,
ajudando marcas de grandes redes a desenvolver rótulos de cafés especiais. “Eles precisam de muito
café, e não de pequenos lotes de um café sensacional. Então, ficava difícil ter uma qualidade constante”,
diz Chris Heyer, outro sócio da Dillanos.
Os fundadores da Dillanos começaram, há uma década, o projeto One Harvest (colheita única),
uma linha de café sustentável e que trabalhava no conceito de comércio justo, promovendo acesso a
saúde, educação e outros benefícios aos agricultores parceiros. Esse trabalho levou ao desenvolvimento
de uma linha exclusiva de cafés, a DCR, que evoluiu para o conceito de origem específica da El
Manzano.
A dúvida agora é o que acontecerá quando a Starbucks começar a vender esses grãos preciosos,
sendo que alguns deles estarão disponíveis apenas por alguns meses do ano. A rede Peet’s Coffee hoje
vende um pacote de meio quilo do raro Jamaica Blue Mountain por US$ 45 – ou US$ 90 o quilo.
Essas companhias especializadas, que durante anos desenvolveram relações com os fazendeiros,
estão dispostos a protegê-los de uma massificação. “Nós trabalhamos com os produtores por um longo
período e vamos continuar a fazê-lo”, disse Eric Hoest, diretor de operações da Stumptown, uma das
referências em cafés especiais dos EUA.
No Brasil, rede ‘comum’ chega perto de cem lojas
A rede de cafeterias americana Starbucks chegou ao Brasil há oito anos. Embora a empresa tenha
iniciado sua operação no Brasil com um parceiro local, hoje o negócio está totalmente sob o controle da
matriz americana. Atualmente, a empresa está próxima de atingir a marca de cem unidades no País,
embora a cadeia de cafeterias ainda esteja restrita basicamente aos Estados de São Paulo e Rio de
Janeiro, com forte concentração no primeiro. A estratégia da companhia, aliás, é continuar a ganhar
mercado nos dois Estados em que já está presente. Ao contrário do que ocorre com outras empresas de
fast-food, que costumam definir uma distância mínima entre duas lojas, a rede de cafeterias prefere ter
várias unidades em uma área geográfica relativamente pequena, para reduzir custos logísticos. Só na
região da Avenida Paulista, em São Paulo, são nove lojas.
O Estado de S. Paulo – 08/12/14
Com saturação do mercado para lojas comuns, rede investe em unidades de valor agregado, onde vende 1 kg de café por US$ 90
SEATTLE – A abertura de uma nova cafeteria, em especial Starbucks, deixou de ser um “evento” nos Estados Unidos há algum tempo. Por isso, ao longo do último ano, a Starbucks desenvolveu um projeto voltado à alta renda: a Starbucks Reserve Roastery & Tasting Room. O projeto tem a intenção de atrair os aficionados em café, dispostos a pagar até US$ 90 por um quilo de grãos raros. A empresa acredita que tem potencial de chegar a cem unidades “chiques” em todo o país.
No entanto, a empresa não chega sozinha a este mercado. Concorrentes como Stumptown Coffee Roasters, Dillanos Coffee Roasters e Blue Bottle Coffee estão entre os líderes do ramo de cafés raros. Esses grãos especiais muitas vezes têm origem em uma só fazenda ou em pequenas cooperativas. Por isso, a produção é limitada e distribuída algumas vezes por ano.
Esse raciocínio é justamente o oposto do praticado da Starbucks, que sempre priorizou a produção em massa. Tanto é assim que a diretora de cafés da Cherry Street Coffee House, Laila Ghambari, chama a Starbucks de “McDonalds do café”. A Cherry é uma das empresas que já atuam neste segmento e tem hoje dez lojas na região de Seattle.
Para distanciar as lojas Reserve de sua “prima pobre”, a Starbucks está abandonando sua famosa marca para tentar atrair quem realmente acha que entende de café. O logotipo com a sereia foi abandonado. As lojas Reserve são identificadas por uma marca composta por uma estrela e a letra “R”, escrita em vermelho. A Starbucks diz que o preço médio por xícara da linha Reserve deverá variar de US$ 4 a US$ 7.
Sob pressão. As cafeterias comuns crescem pouco nos Estados Unidos. Entre os fatores que atrapalham os resultados de grandes redes como a Starbucks está a emergência de cafeteiras caseiras no estilo gourmet, como a Nespresso. “Quando se olham as importações de café nos últimos anos, fica claro que o mercado está bem maduro”, diz Josh Green, presidente da Panjiva. “Estamos falando de um crescimento geral bem modesto – e é nesse momento que as empresas começam a busca nichos lucrativos.”
Cada loja da versão “chique” da Starbucks deverá custar R$ 20 milhões. A loja lembra uma espécie de “fantástica fábrica de café”. Tubos transparentes instalados no teto e nas paredes alimentam torrefadores de cobre com café verde. Há canecas, grãos de café e acessórios espalhados pelo espaço de 15 mil metros quadrados. “Esse é o lugar mágico onde o café passa a existir”, diz Liz Muller, diretora de de design da Starbucks. “Nós vamos levar o consumidor para uma jornada, durante a qual ele será apresentado a cafés raros”, diz Howard Schultz, presidente da rede Starbucks.
Segundo a presidente da divisão de consumo da empresa de marcas Daymon Worldwide, Virginia Morris, está cada vez mais claro que os consumidores com dinheiro para gastar buscavam experiências singulares no setor de café. No entanto, as companhias especializadas em grãos raros jamais pensaram que uma gigante do mercado de massa iria apostar no nicho. “Acho que você pode começar pequeno e crescer. Mas, se você já é grande, é difícil convencer o cliente de sua autenticidade”, diz David J. Morris, sócio da cafeteria Dillanos.
Enquanto busca um nicho “chique”, a gigante do café também busca melhorar seu negócio “comum”. Embora as vendas da Starbucks tenham sido recordes no ano fiscal encerrado em setembro, com faturamento de US$ 16,4 bilhões, os resultados nos Estados Unidos não foram tão bons. Por isso, a empresa começou a testar um sistema de pagamento móvel na cidade de Portland, no Oregon. Além disso, premiou 14 clientes com cartões dourados que garantem um suprimento ilimitado de produtos da rede – ao estilo Willy Wonka, de A Fantástica Fábrica de Chocolate.
Origem. Os microlotes dos cafés “chiques” nos Estados Unidos não têm só região de origem. Como nos vinhos, recebem os nomes das fazendas onde foram produzidos, como a Finca El Manzano, de El Salvador. Essa empresa, que fornece para a Dillanos, produziu somente 60 sacas de café no ano passado. O grão foi usado por Laila Ghambari, diretora de cafés da Cherry Street, no concurso anual de baristas americanos – que ela ganhou.
Até recentemente, a Dillanos predominantemente atuava no ramo de clientes comerciais, ajudando marcas de grandes redes a desenvolver rótulos de cafés especiais. “Eles precisam de muito café, e não de pequenos lotes de um café sensacional. Então, ficava difícil ter uma qualidade constante”, diz Chris Heyer, outro sócio da Dillanos.
Os fundadores da Dillanos começaram, há uma década, o projeto One Harvest (colheita única), uma linha de café sustentável e que trabalhava no conceito de comércio justo, promovendo acesso a saúde, educação e outros benefícios aos agricultores parceiros. Esse trabalho levou ao desenvolvimento de uma linha exclusiva de cafés, a DCR, que evoluiu para o conceito de origem específica da El Manzano.
A dúvida agora é o que acontecerá quando a Starbucks começar a vender esses grãos preciosos, sendo que alguns deles estarão disponíveis apenas por alguns meses do ano. A rede Peets Coffee hoje vende um pacote de meio quilo do raro Jamaica Blue Mountain por US$ 45 – ou US$ 90 o quilo.
Essas companhias especializadas, que durante anos desenvolveram relações com os fazendeiros, estão dispostos a protegê-los de uma massificação. “Nós trabalhamos com os produtores por um longo período e vamos continuar a fazê-lo”, disse Eric Hoest, diretor de operações da Stumptown, uma das referências em cafés especiais dos EUA.
No Brasil, rede comum chega perto de cem lojas
A rede de cafeterias americana Starbucks chegou ao Brasil há oito anos. Embora a empresa tenha iniciado sua operação no Brasil com um parceiro local, hoje o negócio está totalmente sob o controle da matriz americana. Atualmente, a empresa está próxima de atingir a marca de cem unidades no País, embora a cadeia de cafeterias ainda esteja restrita basicamente aos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, com forte concentração no primeiro. A estratégia da companhia, aliás, é continuar a ganhar mercado nos dois Estados em que já está presente. Ao contrário do que ocorre com outras empresas de fast-food, que costumam definir uma distância mínima entre duas lojas, a rede de cafeterias prefere ter várias unidades em uma área geográfica relativamente pequena, para reduzir custos logísticos. Só na região da Avenida Paulista, em São Paulo, são nove lojas.