João Faria da Silva, que já foi o maior produtor de café do mundo, está às voltas com problemas que levaram sua empresa, a Terra Forte, a entrar em recuperação judicial.
11/04/2019 Em 2014, tempos áureos, a companhia chegou a faturar R$ 1,5 bilhão e a lucrar dezenas de milhões de reais por ano, mas hoje, com dívida da ordem de R$ 1,1 bilhão, o que resta é negociar com credores e tentar atrair novos investidores.
O pedido de recuperação da Terra Forte, que tem sede em São João da Boa Vista (SP), foi deferido segunda-feira pelo juiz da 1ª Vara Cível da Comarca de Campinas, Renato Siqueira de Pretto. Como trading, a Terra Forte já chegou a responder por 7% das exportações brasileiras de café.
Há dez anos, o empresário ficou conhecido por plantar 18 milhões de pés de café e chegar a uma produção anual de 180 mil sacas da espécie arábica. O volume expressivo colocava o agricultor nascido em Piratininga (SP) não apenas como o maior produtor do país, mas do mundo. Com sete fazendas em São Paulo e Minas, a Terra Forte ainda produziu 100 mil sacas em 2018.
Segundo os advogados responsáveis pelo processo de recuperação, o intuito agora é criar uma “estrutura de endividamento” que propicie a entrada de novos investimentos. “O pedido foi feito antes de um cenário mais catastrófico. Não há uma situação de estresse absoluto e a empresa é operacional”, afirmou Alexandre Faro, sócio do escritório de advocacia Freire Assis Sakamoto Violante .
“A ideia é criar espaço para receber investimentos. Não é descartado novo controlador, acionista minoritário ou mesmo um investimento em dívida. A empresa tem ativos muito valiosos”, ressaltou.
O “ex-rei do café” também já teve seu nome envolvido em operação da Polícia Federal – a Rosa dos Ventos -, que investigava um esquema de lavagem de dinheiro e sonegação fiscal em Campinas e, vira e mexe, entra em alguma disputa com assentamentos de sem-terras. Mas, segundo o escritório Freire Assis Sakamoto Violante, foi o câmbio que tomou o seu reinado.
A depreciação do real ante o dólar foi um dos principais motivos que levaram à corrosão financeira da Terra Forte, já que grande parte da dívida é em moeda americana. A tempestade perfeita veio com a queda dos preços do café na bolsa de Nova York. “Em situações normais de temperatura e pressão, a Terra Forte não teria sofrido essa situação de estresse financeiro no curto prazo”, completou Gabriel Freire, outro advogado responsável pelo caso.
A incapacidade de honrar pagamentos elevou as despesas financeiras de R$ 136,4 milhões em 2017 para R$ 724,3 milhões no ano passado. O faturamento caiu 40% em dois anos, para R$ 900 milhões. E o lucro de R$ 26 milhões de 2016 virou prejuízo de R$ 541,3 milhões em 2018. “A situação sugou toda capacidade de caixa da empresa”, disse Freire.
Aproximadamente 95% das dívidas da empresa estão nas mãos de instituições financeiras e tradings – os maiores credores são Bradesco (R$ 150 milhões), Banco Cargill (R$ 106 milhões) e Banco do Brasil (R$ 128 milhões). Do total, R$ 1 milhão são dívidas trabalhistas, R$ 110 milhões têm garantia real, R$ 933 milhões não têm garantia e R$ 641 mil são com micro e pequenas empresas.
O pedido de recuperação foi feito em nome do grupo (formado por Jodil Agropecuária e Jodil Participações) e do empresário rural João Faria, sócio-fundador e controlador. “Ele avaliza todas as dívidas do grupo. Não teria como separar a recuperação do nome dele”, afirmou Freire.
Recuperações judiciais em nome de empresários rurais costumam gerar polêmicas e dar pano para manga. O registro de Faria como empresário rural, alegam os advogados, existe há mais de 20 anos, mas o cadastro como empresário em uma junta comercial é mais recente. A lei exige período mínimo de dois anos de cadastro para que a recuperação judicial de uma pessoa física possa ser convertida em jurídica.
“O juiz falou especificamente sobre isso na decisão. O cadastro na junta foi recente, mas, não importa quando foi, pode processar [o pedido de recuperação judicial”, explicou Alexandre Faro. A Terra Forte tem 60 dias para apresentar um plano de recuperação.
Por Kauanna Navarro | De São Paulo
Fonte : Valor