César Miltons – 10/08/2005 Paulo PupimPerfurar um poço artesiano clandestino ou então fora dos padrões técnicos em Maringá deve ficar um pouco mais difícil caso a Câmara Municipal aprove hoje, em segunda discussão, projeto de lei apresentado pelo vereador John Alves Correa (PMDB), presidente da Casa. Pelo projeto, a empresa encarregada pela obra deve fazer o acompanhamento técnico de cada etapa da perfuração dos poços artesianos e semi-artesianos.
De outra forma, a prefeitura pode embargar a obra. O texto também exige o monitoramento periódico da água, com as análises de potabilidade. Cabe ao dono do poço zelar pela aplicação das análises, sob pena de ser obrigado a pagar multa. Num condomínio residencial abastecido por este sistema, a sanção recai sobre o síndico. Responsável pela Hidroingá Poços Artesianos, o geólogo Marcos Otávio Ramari reclama da falta de fiscalização mais eficiente, capaz de inibir eventual perfuração de poços clandestinos. De acordo com ele, um poço pode ser perfurado em quatro ou cinco horas e, se não houver uma fiscalização atuante, a obra pode ser feita fora dos procedimentos técnicos exigidos por lei.
Na prática, o projeto em discussão na Câmara não altera a rotina de trabalho da Hidroingá, pois, conforme o geólogo, a empresa faz o acompanhamento técnico de toda a obra. Além de querer dificultar o surgimento dos poços clandestinos, John diz estar pensando na qualidade da água consumida pelas pessoas. O professor Carlos Barros afirma que a análise físico-química da água retirada do poço artesiano é fundamental, ainda mais se for levado em conta que a cultura do café predominava no solo da região, deixando na terra resíduos de organoclorados (agrotóxicos). Professor do Departamento de Engenharia Química da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Barros assinala que a perfuração de um poço requer um estudo criterioso, que passa inclusive pela certeza de que a obra não afetará o meio ambiente. Lago seco Por si só o assunto é polêmico e já foi alvo de muitas discussões no passado. Não faltou quem apontasse os poços como os responsáveis pelo quase total secamento do lago do Parque do Ingá, anos atrás. O próprio vereador John Alves Correa pensa assim, embora admita ser um leigo no assunto. De qualquer maneira, ele garante: a fiscalização é frouxa. A tese de quem põe os poços no papel de vilões é a de que o excesso deles na área central da cidade, onde fica a reserva de mata nativa, contribuiu para impedir o contínuo abastecimento do lago, especialmente nas épocas de estiagem.
A perfuração precisa ter licença da prefeitura, mas muitas vezes isso não acontece. Não existe um levantamento oficial, somente a informação de que dezenas de clandestinos estariam funcionando em áreas nobres de Maringá. Poços serão recadastrados, segundo a prefeitura Em cerca de 15 dias a prefeitura deve iniciar o recadastramento dos poços artesianos do município, segundo o gerente de Recursos Hídricos da Secretaria de Desenvolvimento Urbano, Planejamento e Habitação (Seduh), engenheiro Carlos Augusto Campélo Lopes. Na descoberta de alguma irregularidade, como a ausência de um profissional capaz de monitorar a qualidade da água, o responsável pela obra pode receber desde uma advertência até o embargo do poço. Segundo Lopes, o trabalho está respaldado pelo Plano Municipal de Recursos Hídricos, em vigor desde o dia 21 de março. Por enquanto, a gerência vem atuando naquilo que o engenheiro chama de “fase de diagnóstico”, para checar primeiro as condições de alguns córregos. O objetivo será identificar a quantidade de resíduos sólidos lançados clandestinamente nos córregos e, em seguida, analisar o impacto causado pelas galerias pluviais em desacordo com a legislação. Paralelo ao trabalho das galerias terá início o processo de recadastramento dos poços.
Lopes não dispunha, durante a entrevista, da quantidade de poços legalizados existentes na cidade, embora garanta que há centenas deles. O gerente discorda da tese segundo a qual os poços influem no nível do lago do Parque do Ingá. Segundo ele, a maioria se alimenta do aquífero Serra Geral, após atingir de 80 a 120 metros de profundidade. O aquífero se estende por toda a bacia do Paraná e sul de São Paulo. Lopes esclarece que o lago da reserva é alimentado pelo aquífero superficial, freático. Nas épocas de seca, o nível da água cai naturalmente. Geralmente, um poço tem o diâmetro médio de 12,5 centímetros, dependendo da vazão. Conforme o engenheiro, na prática a administração municipal já aplica as exigências preconizadas pelo projeto de lei do vereador John Alves, que vai hoje à votação. NÚMEROS 10 a 15 É o número de perfurações de poços artesianos que a prefeitura permite, em média, a cada mês em Maringá Passo a passo A prefeitura exige que a empresa responsável pela obra apresente o plano de perfuração, constando, entre outras informações, os cálculos aproximados de vazão, determinação do tipo de solo a ser encontrado, tempo de perfuração, profundidade aproximada e qual o aquífero a ser explorado. Em caso de pessoa jurídica, a prefeitura exige os documentos pessoais do dono da empresa ou do executivo responsável pela empresa. A obra também não pode ser iniciada sem a entrega das coordenadas geográficas em Unidade Técnica Mercator (UTM) do ponto de perfuração, para saber exatamente o local onde será perfurado o poço.
O interessado precisa assinar um termo de compromisso, que terá a assinatura final do secretário ligado à pasta, após o término da obra, caso os procedimentos estejam corretos. Outro documento é a entrega da anuência da Superintendência de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental do Estado (Sudhersa), na condição de co-responsável pela liberação do poço. Após a perfuração, a prefeitura exige o relatório completo, feito pela empresa perfuradora, dos testes realizados no poço, como a vazão final, classificação do solo e das rochas encontrados durante a obra, e a profundidade atingida. Pede-se a assinatura do secretário ao termo de compromisso anteriormente assinado apenas pelo interessado na obra, constando, de forma clara, a exigência de um químico de nível superior ou engenheiro químico que possa acompanhar as águas exploradas. O profissional será o encarregado de realizar mensalmente as análises bacteriológicas e físico-química.
No termo deve existir a necessidade de emissão de uma Anotação de Responsabilidade Técnica (ATR) pelos procedimentos adotados pelo profissional, além da publicação das análises e o recolhimento da ATR junto ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea). Após isso, finalmente o poço artesiano é liberado. Geóloga afasta influência no lago A geóloga Fernanda Gôngora descarta qualquer influência dos poços artesianos regulares no nível da água do lago do Parque do Ingá. De acordo com ela, de fato os poços se alimentam do aquífero Serra Geral. A perfuração atinge pelo menos 80 metros em média. Já o lago da reserva é abastecido pelas águas do aquífero superficial. Segundo a geóloga, que trabalha na iniciativa privada em Maringá, a dificuldade em preservar o lago tem sido justamente a falta de impermeabilização de água ao redor do Parque do Ingá, decorrente da construção de calçadas e do processo de ocupação urbana da região. Muitas soluções foram bastante estudadas nos últimos anos, algumas implementadas. Entre elas, a adoção de calçadas ecológicas e a implementação de meios que possam facilitar a inflitração da água no processo de construção civil.
Fonte: O Diário de Maringá