Otávio Zanetti nasceu e viveu sob a sombra dos cafezais até os 76 anos. Em 2001, a crise mundial nos preços do café levou o produtor de Cravinhos (SP) a desistir da atividade. “Plantava 55 mil pés de café e desisti da atividade quando a saca, que custava US$ 115, caiu para US$ 35. Quem vai produzir sabendo que terá prejuízo?”, questiona.
Aos 81 anos, Zanetti trocou a atividade agrícola pelo arrendamento de terras. Os 120 hectares que utilizava para plantava os cafezais atualmente são arrendados a produtores de cana-de-açúcar.
Carlos Amorim produz laranja, café, grãos e gado em seis fazendas em Minas Gerais e São Paulo. Ele também arrenda parte da área para a produção de cana-de-açúcar. Dos segmentos em que atua como produtor, apenas um gera rentabilidade positiva: o café.
“Tenho 400 mil pés de café e pretendia plantar outros 200 mil, mas não faço porque não confio no cenário futuro para o setor agrícola”.
Ele observa ainda que grãos e pecuária têm os piores resultados em termos de receita. E a laranja, que no mercado externo apresenta preços em alta, custa ao produtor R$ 12 por caixa de 40,8 quilos. Mas as indústrias – que mantêm contratos de longo prazo com produtores – pagam US$ 3 por caixa.
“O mercado interno não absorve a produção agrícola brasileira. O setor depende da exportação e do câmbio e não tem perspectiva de melhora no curto prazo”, diz. O desânimo de Amorim e Otávio Zanetti reflete o espírito de quase toda a cadeia do agronegócio no país.
Produtores, empresas e analistas, que desejavam uma retomada do crescimento no ciclo 2006/07, já falam em um início de recuperação apenas na safra seguinte. “O problema é a falta de liquidez. Como já estão endividados, os produtores vão depender de crédito para investir no próximo plantio”, avalia Paulo Molinari, consultor da Safras&Mercado.
Para Molinari, a próxima safra ainda será difícil, principalmente porque a maior parte das dívidas dos produtores – estimadas em cerca de R$ 30 bilhões – foi contraída junto ao setor privado.
Leonardo Tavares, diretor superintendente da Agromen Sementes, diz que 70% das vendas de insumos são financiadas pelas empresas e ele teme um aumento significativo da inadimplência. “Estou preocupado porque as contas dos produtores não fecham”.
De acordo com Tavares, a produtividade da soja nas praças de São Paulo, Minas Gerais e Goiás está de 5% a 15% menor do que na safra 2004/05, devido a problemas climáticos e ao avanço da ferrugem. “O produtor vai reduzir o investimento em tecnologia e vai reduzir área”, afirma Tavares. Previsões divulgadas por analistas até agora falam em uma redução de até 3 milhões de hectares – isso apenas nas lavouras de soja.
“Excluindo o setor de cana, que vai bem, a expectativa é que as demais áreas tenham uma recuperação a partir do segundo semestre de 2007, quando os produtores tiverem sanado boa parte das dívidas”, estima Francesco Pallaro, vice-presidente comercial da empresa de máquinas CNH para a América Latina.
A crise de rentabilidade tem afetado fortemente o setor de máquinas e equipamentos agrícolas, que já demitiu em torno de 7 mil pessoas este ano. A Agrishow Ribeirão Preto – tida como um termômetro de vendas do setor de máquinas para o ano – teve menos negócios que o esperado. Os organizadores estimam que o evento gerou R$ 500 milhões em vendas, 34% menos que na edição anterior e 29% abaixo que o previsto inicialmente.
No campo, produtores de vários Estados prometem manter os protestos até a divulgação do próximo Plano de Safra, na quinta-feira (18-05). Na sexta-feira, houve fechamento de estradas em Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo. No Mato Grosso, depois do confronto com a Polícia Federal na quinta-feira para liberar a BR-163, produtores decidiram bloquear armazéns de grãos e insumos.
Cibelle BouçasFonte: Valor Econômico