16.03.2008
Imagine produzir café de qualidade sem agredir o meio ambiente, conseguir bons preços e até exportar. E melhorar a vida da comunidade. Você não acha que tudo isso merece um prêmio? Pois mereceu mesmo. Em 2007, o prêmio de cafeicultor destaque foi para o presidente da Cooperativa dos Agricultores familiares de Poço Fundo, em Minas gerais.
Poço Fundo é uma cidade do sul Minas Gerais, com 18 mil habitantes e vive principalmente dos cafezais. E foi a seis quilômetros do centro que encontramos Adauto pela primeira vez. Ele estava emparelhando o café. “Nós estamos desde às 6h aqui”, conta. Ele fala no plural porque está incluindo a mulher, Cida.
Na propriedade, de apenas oito hectares, tudo foi dividido de caso pensado.
Seis hectares, em plena encosta do morro, estão plantados com café. Tem um hectare de pastagem e um hectare de mata nativa, que é sagrada.
“A mata no topo ela é estratégica. Toda a chuva que cai, com certeza eu te garanto que ela retém 70% da água da chuva, ela retém lá, que posteriormente vai sendo distribuída depois para a propriedade no decorrer do período mais seco”, explica o agricultor.
Outra técnica que não falha: Adauto distribuiu árvores frutíferas por toda a propriedade. “Eu sei que a maioria dos problemas que eu vou ter de ataque de pragas no café os predadores dela vão ser atraídos se tiverem árvores frutíferas e outras árvores para eles poderem pousar”.
“Todo controle que eu faço ele é biológico. Então, eu tenho que trazer para dentro da minha propriedade o máximo possível da biodiversidade, não só da planta, mas da fauna e flora. O último ataque de pragas que eu tive, que foi problemático e que me causou prejuízo foi há oito anos atrás”, completa.
Esse, sucesso, segundo Adauto, é resultado da mudança mais importante que ele já fez na vida. Transformou em orgânica a sua lavoura. Há 12 anos não usa agrotóxicos nem fertilizantes químicos. O adubo é muito especial. “Aqui tá pronto já o composto que é a mistura da palha de café mais esterco de vaca”, explica.
Adauto tem resposta pronta até para o grande desafio da lavoura orgânica: a fama de que produz menos do que no cultivo tradicional. “Negativo, porque eu tenho aqui na minha propriedade o resultado obtido nos seis, sete anos de manejo orgânico e nós temos chegado à produtividade de 40, 45 sacas por hectare e a média do convencional é de 25, 30 por hectare”.
Da lavoura, pela manhã, ao escritório à tarde. Adauto de Oliveira vira presidente da Cooperativa dos Agricultores Familiares de Poço Fundo. Ele foi um dos fundadores da cooperativa há quatro anos e é o presidente desde então. São 225 pequenos produtores de café abrindo espaço no mercado.
O café, de primeira qualidade, tem mercado garantido no exterior. Mais de 70% da produção de 12 mil toneladas por ano é exportada para a Europa e Estados Unidos. A cooperativa está incluída no “Fair Trade”, ou comércio justo, um certificado de qualidade criado por associações de consumidores internacionais.
A intenção é incentivar uma agricultura que melhore as condições sociais de todos que trabalham no campo. Nas reuniões da cooperativa, aquelas que varam a noite, não têm choradeira. Os produtores discutem como melhorar o que já está bom.
“Isso aí pra nós mudou muita coisa. Para mim principalmente, porque é um preço justo o café que a gente vende. Não mexe com agrotóxico nem nada”, diz o agricultor Donizete Ribeiro.
Com os bons resultados na venda do café, os sócios da cooperativa decidiram que era hora de investir na comunidade. A cooperativa criou cursos para mais de 100 crianças, que não tinham o que fazer depois da escola.
Poderia ser uma coisa ou outra. A cooperativa, a prosperidade dos agricultores, o jeito de tratar a terra. Adauto foi o primeiro produtor de café da agricultura familiar a ganhar o prêmio de destaque do ano do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil.
“As características que me fizeram pensar no Adauto para o prêmio foram o empreendedorismo e o fato de estar tentando uma vida melhor para aquele cafeicultor pequeno no campo”, justifica o agrônomo do IAC Sérgio Pereira.
Antes do próprio Adauto, tem uma pessoa na região que já faz um trabalho há muito tempo de preservação do meio ambiente e de tentar fazer uma agricultura que não agrida o ambiente e fez um trabalho praticamente solitário durante muito tempo. É a dona Madalena de Oliveira, mãe de Adauto.
A luta de Dona Madalena começou quando ela ainda era criança. “A gente vai vendo as mudanças da natureza. Faltava tal passarinho, sumiu, tal bichinho não tem mais. Por que será?”.
No meio da conversa, Adauto volta com o irmão Henrique, que mora na vizinhança. Dona Madalena se anima e se prepara também. A família gosta de cantar as músicas que ela compôs enquanto lutava para defender o meio ambiente. “Vamos estudar meios de preservação. Nós não devemos num deserto transformá-la para não prejudicar as futuras gerações”, diz a música.
O ritmo embala os finais de tarde em Poço Fundo. Amanhã, no ensolarado Vale do Café, será outro dia de muito trabalho.
A próxima meta da cooperativa de Poço Fundo é produzir só café orgânico e aumentar o número de crianças na escola.