O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello, em voto, manifestou-se contrário ao entendimento tradicional dos Tribunais, que reconhece a imunidade tributária em relação ao pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) dos imóveis localizados em áreas portuárias da União. Caso a decisão seja seguida pelos demais ministros em julgamento a ser realizado nessa semana, pode ser instalado precedente judicial que oneraria as sociedades de economia mista que administram portos em todo País.
Marco Aurélio é relator do recurso extraordinário nº 253.472, interposto pela Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), pleiteando o reconhecimento de imunidade tributária de IPTU. O ministro entendeu que o STF não deve dar provimento ao recurso, pois a Codesp, por exercer atividade econômica, deve o imposto à Prefeitura de Santos.
Após o voto do relator, o julgamento foi remetido ao pleno por decisão unânime da Primeira Turma. Para Marco Aurélio, a Codesp requer a imunidade de IPTU em relação aos imóveis que compõem o acervo do Porto de Santos por isso a imunidade não se justificaria. A questão controvertida é saber se a chamada imunidade recíproca é aplicada ao caso ou não. Essa modalidade de imunidade, que é garantida pela Constituição Federal, determina que é vedado à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios instituir imposto sobre patrimônio, renda ou serviços uns dos outros.
Segundo a Companhia Docas do Estado de São Paulo suas instalações portuárias são de propriedade da União, razão pela qual caberia a própria União a gestão do patrimônio e, conseqüentemente, não haveria incidência impostos.
Para o ministro Marco Aurélio, a União realmente tem a propriedade do imóvel, mas ante a concessão de obras e serviços, o domínio útil cabe à Companhia Docas do Estado de São Paulo.
Marco Aurélio justifica que, no caso, trata-se de sociedade de economia mista a explorar atividade econômica “não podendo, por verdadeiro empréstimo, cogitar da imunidade”. Para ele, a regra de imunidade contida na Constituição Federal está restrita à instituição de imposto sobre patrimônio ou renda ou serviços das pessoas jurídicas de direito público, motivo pelo qual não seriam beneficiadas as sociedades de economia mista.
O ministro ainda citou que o parágrafo 3º do artigo 150 da Constituição Federal revela que as imunidades não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços relacionados com a exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ao pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exoneram o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.
“Ora, a recorrente detém o domínio útil do imóvel e atua na exploração de atividade econômica, sujeitando-se, ante o disposto no parágrafo 2º do artigo 173 da Constituição Federal, à incidência tributária”, concluiu o ministro.
Para os especialistas, entretanto, o Supremo Tribunal Federal irá manter o entendimento que vem tendo há anos, reconhecendo a imunidade dos imóveis localizados em áreas portuárias da União. Os imóveis localizados em regiões portuárias são de propriedade da União, que através de um regime específico, como a concessão no caso da Codesp, pode transferir o direito de trabalho e exploração de atividade econômico deles para terceiros, afirma Maria Catarina Rodrigues, do escritório Emerenciano, Baggio e Associados – Advogados . “A União não passa nem a posse, nem o domínio, nem a propriedade dos imóveis para terceiros, por isso não há de se falar em incidência de Imposto Predial e Territorial Urbano”, diz.
“Existem reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal, inclusive favorecendo a própria Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), reconhecendo a imunidade dos imóveis nessa mesma situação”, diz Rodrigues.
Em 2003, o recurso extraordinário nº 357.447, que teve como relatora a ministra Ellen Gracie, afastou a cobrança de IPTU pela Prefeitura de Santos dos imóveis administrados pela Codesp.
A advogada faz a ressalva de que as decisões referem-se a impostos, visto que elas reconhecem que taxas, como a de limpeza pública por exemplo, podem ser cobradas.
“Acredito que o Supremo Tribunal Federal irá manter o entendimento que teve até o momento”, afirma Rodrigues.
A Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (APPA) informa que também possui problemas relacionados ao reconhecimento da imunidade de impostos sobre os imóveis localizados em áreas portuárias da União.
“A Prefeitura de Paranaguá está tentando receber impostos sobre esses imóveis através do ajuizamento de execuções fiscais”, informa Mario Marcondes Lobo Filho, diretor administrativo financeiro da APPA. No caso da Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina a situação é um pouco diferente, visto que se trata de uma autarquia federal, e não de uma sociedade de economia mista como a Companhia Docas do Estado de São Paulo, motivo que por si só garantiria a imunidade. “Mas também usamos isso como argumento para garantirmos o reconhecimento da imunidade”, afirma Lobo Filho.