Rodrigo Sias
Economista pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
27/08/13 16:30
Nas últimas semanas, o noticiário econômico esteve movimentado. A crise na Zona do Euro ainda está longe do fim – embora se estabilizando — a China está crescendo menos e os EUA devem iniciar a retirada gradual de seus enormes estímulos monetários.
O impacto no Brasil tem se refletido primordialmente na taxa de câmbio. Com o fechamento em R$ 2,45, na última quinta-feira, o real chegou ao seu nível mais baixo frente ao dólar desde setembro de 2008, data do início para valer da crise mundial.
Comparados às moedas de outros países emergentes, a moeda brasileira foi aquela que mais se depreciou nos últimos meses, sugerindo que há fatores internos específicos para explicar tal movimento.
Quais seriam esses fatores? Em mais de dez anos, pouco foi feito para elevar a produtividade da economia. O modelo de concessões desenhado para destravar a infraestrutura ficou engavetado por anos, devido a preconceitos ideológicos. Os salários aumentaram acima da inflação seguidamente e o custo da mão de obra se elevou. Com uma economia de produtividade estagnada, nossas exportações foram perdendo espaço em praticamente todos os mercados.
Graças à aposta no consumo e na expansão do crédito público para acelerar o crescimento, nossas importações seguiram se elevando. Com isso, a balança comercial passou a registrar superávits cada vez menores e mais dependentes do preço das commodities básicas. Para 2013, já se projeta que a balança feche com déficit pela primeira vez em 13 anos.
Com saídas seguidas de capitais, investimentos estrangeiros diretos em mesmo patamar e com saldos comerciais desaparecendo, é natural que a taxa de câmbio se deprecie para refletir a escassez relativa de dólares.
Por um lado, a taxa depreciada pode ter o efeito benéfico de ajudar a indústria brasileira, tornando as importações mais caras e as exportações mais competitivas. Por outro lado, um câmbio volátil e em depreciação impacta negativamente na contenção da inflação. É este impacto que preocupa o governo.
Curiosamente, no início da década de 2010, o governo brasileiro só fez reclamar da liquidez injetada pelos EUA. “Tsunami de dólares” e “guerra cambial” eram expressões usadas pelo Ministro da Fazenda todo o tempo, para justificar as medidas de controles de capitais e intervenções no câmbio.
Bem verdade, Mantega tinha certa razão. Ancorado na premissa de John Conally, ex-secretário de Tesouro dos EUA na década de 1970, para quem “o dólar é nosso, mas o problema é de vocês”, o Federal Reserve introduziu o quantitative easing, injetando um volume inédito de liquidez com o objetivo de reativar a economia americana. O efeito colateral foi a avalanche de dólares nas economias emergentes.
Se, naquela ocasião, era razoável protestar, torna-se incoerência reclamar do fim gradual dos estímulos agora.
“O inferno são os outros”, diria Sartre. Assim como o intelectual e militante francês, o governo brasileiro se exime de sua própria responsabilidade, preferindo projetar culpas em inimigos imaginários.
As últimas intervenções do BC foram bem feitas e devem acalmar o mercado cambial, mas sem contar com um “plano B”, de nada adianta lamentar-se da nova conduta do Fed. Parafraseando o ditado popular: os ministros ladram e os dólares passam.
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Rodrigo Sias é economista pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)