OPINIÃO : União e mobilização de cafeicultores precisa ir além do debate sobre importação de conilon do Vietnã

A possibilidade de redução de impostos para importação do café conilon (robusta) do Vietnã para atender à demanda da indústria produtora de café solúvel causou protestos e dividiu opiniões entre produtores de café no Brasil.

23 de fevereiro de 2017 | Sem comentários Mais Café Opinião
Por: Por José Marcos Chicaroni, produtor rural jmchicaroni@ibicafe.com.br

A possibilidade de redução de impostos para importação do café conilon (robusta) do Vietnã para atender à demanda da indústria produtora de café solúvel causou protestos e dividiu opiniões entre produtores de café no Brasil. O diálogo e a mobilização iniciados com esta polêmica precisam continuar vivos entre os cafeicultores. Crises geram oportunidades e, na posição de maiores exportadores de café do mundo, é tempo de debatermos com seriedade, profundidade e coragem políticas de Estado para a produção de café no Brasil.


Falta voz ao cafeicultor junto ao poder público. Infelizmente, por uma série de motivos alheios aos anseios dos produtores rurais, as lideranças representativas do setor não têm realizado este trabalho fundamental. Não os consideramos nossos legítimos representantes. Um órgão como o Conselho Nacional do Café (CNC) deveria ter líderes eleitos pelo voto direto dos cerca de 300 mil produtores brasileiros de café.


É tempo de rediscutir e redefinir as responsabilidades de cada um na cadeia do café. Num encontro do Ministro da Agricultura com cafeicultores em Guaxupé, Minas Gerais, Blairo Borges Maggi pediu aos produtores uma pauta de reivindicações sérias e inteligentes. A chama acesa pelo debate sobre estoques e importação do café conilon do Vietnã deve ser a guia para que juntos possamos apresentar ao Ministério da Agricultura nossas demandas. 


Não há no Brasil uma política de preços e de estoques para o café. É necessário começar por rever o preço mínimo. Não sei a razão de sua existência, mas uma vez que existe, o atual está tão fora da realidade que sequer cobre nossos custos de produção.


Precisamos de mecanismos inteligentes e modernos para criar nos mercados interno e externo um preço justo para a saca de café brasileiro. No passado, o governo oferecia uma operação de opção de compra de safra dando ao agricultor o direito de exercício. Há cerca de três anos, sem explicação alguma, esta operação deixou de existir e, como consequência, parou de ajudar a elevar o preço do café pago ao produtor. Sem ela, voltamos a ser quase exclusivamente reféns das bolsas de Nova York e Londres, as mais especulativas do mundo, para a criação de nossos preços.


Por outro lado, a indústria de produtos de café, situadas em sua maioria na Itália, Suíça e Alemanha, com sua enorme margem de lucro, tem condições de pagar mais pelo café brasileiro. O exemplo da Colômbia pode e deve ser seguido por nós, modernizado e adaptado à nossa realidade. Nosso vizinho, numa bem-sucedida parceria entre cafeicultores e governo, transformou o café colombiano numa grife respeitada no mercado internacional como sinônimo de qualidade.


Já somos reconhecidos no mercado internacional por ter um produto de qualidade superior ao café colombiano. Temos, portanto, condições de sucesso e competitividade. Precisamos trabalhar nossa imagem junto ao mercado externo, criar uma marca para o café do Brasil. Um bom exemplo doméstico é o da indústria da carne brasileira. Em dez anos, o Brasil passou a Argentina e tornou-se o maior exportador de carne do mundo. O agronegócio da carne fez seu trabalho: quebrou barreiras, buscou mercados, melhorou a qualidade do produto, criou uma imagem séria, cumpridora de contratos.


Evitaríamos a fragilidade de nosso segmento se tivéssemos mais investimentos em pesquisas e informação científica de qualidade. Como vimos agora com a suposta quebra de safra do conilon, não temos informações credíveis sobre nossa produção e estoque. Sequer sabemos ao certo se os estoques de conilon estão baixos a ponto de necessitarmos importar sacas do Vietnã para atender à indústria brasileira de café solúvel. Sem informação confiável é impossível traçar estratégias para o futuro e para o crescimento da cafeicultura no Brasil.


Metade da produção de café do Brasil destina-se ao mercado externo, a outra metade é consumida no próprio país. É bom lembrar que falamos aqui do quinto produto no ranking da balança comercial brasileira. Empregamos mais de 3 milhões de pessoas. Somos uma maioria de pequenos produtores caracterizados pela agricultura familiar. Ao mesmo tempo, nosso histórico é de ótimos pagadores, ao contrário do que pregam alguns de nossos supostos representantes. É importante não confundir a saúde financeira das cooperativas com a dos produtores. Não pedimos ao governo perdão de dividas. Queremos apoio para sermos mais competitivos e criarmos um preço justo para nosso produto tanto no mercado externo quanto no mercado interno.

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