Em 1927 a secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo, lançou um livro comemorativo ao bicentenário do café no Brasil. Encarregou para isso o brilhante agrônomo Jorge Dumont Villares, que um ano antes viajou por todas as regiões cafeeiras do mundo realizando um trabalho que rendeu 498 paginas em dois volumes. Este livro é surpreendente, pois do ponto de vista técnico, temos desde despolpadores até lavouras adensadas e tecnologias de produção, que são as mesmas que usamos hoje, com alguns aperfeiçoamentos.
O que importa, é que este espetacular trabalho, que está disponível na biblioteca do IAC, contém um relatório deste conceituado agrônomo. Vou citar apenas um parágrafo que muito nos interessa nesse momento: “Nos países consumidores a propagação e o hábito de usar sucedâneos e misturas terão ação prejudicial no consumo, e o comércio do café Robusta oriental de variedades e preparo aperfeiçoado tende a aumentar, devemos, pois estar atentos.” (Jorge Dumont Villares, pg 287 do vol 2)
Em meados de 1995, a produção de Robusta/Conillon passou a explodir com o crescimento orquestrado e financiado pelos países do primeiro mundo, entre os quais Alemanha e França. O Vietnã foi o que mais cresceu. O objetivo era naturalmente abastecer o mercado com um produto mais rústico, e menos sujeito a oscilações de safras, alem de ser mais barato que o café Arábica.
Como sabemos as qualidades dos dois cafés são distintas do ponto de vista de paladar, aroma e sabor, tendo até mesmo número de cromossomas diferentes. É inegável que o custo de produção de café Arábica é maior que o do café Conillon, deprimindo o resultado final do produto
Não há qualquer reticência nem aguda nem crônica em relação aos blends. Apenas queremos identificar os dois cafés nas embalagens para orientar o consumidor em relação aos aspectos de saúde e preço e assim entendeu o STF (Supremo Tribunal Federal), quando julgou constitucional a Lei de Rotulação do Paraná.
O nosso interesse, como produtor de café Arábica, é naturalmente valorizar o nosso café, através de instrumentos de marketing. Tenho certeza que a valorização do café Arábica levará a reboque o café Conillon, invertendo a tendência dos preços baixos verificados hoje. Quanto a fazer café Conillon com melhor qualidade, ótimo, pois assim o café Conillon se tornará um café mais neutro e não interferirá no blend. O corpo e a acidez não devem ser desconsiderados, pois estas qualidades são atrativas no café Conillon, mas lembramos que não tem aroma, sabor nem paladar. Quanto à nobreza,somos democráticos,sou contra qualquer tipo de nobreza.Estamos numa democracia,mas não podemos fugir à realidade.
È verdadeiro, o fato dos custos e preços finais serem diferentes. Os custos altos e preços baixos do café Arábica,estão levando os cafeicultores de Arábica à falência,mas pode ter certeza que os próximos a sofrer serão produtores de café Conillon, se o mercado permanecer como está.
Quanto a experimentar o Conillon de qualidade, confesso que nunca experimentei, mas gostaria de incentivá-lo a continuar a produzi-lo. Existe uma cafeteria em Paris chamada “Café Marc”,com diversas lojas, sendo uma na 111rue Monffetard, que serve 20 tipos de café,identificados com as diversas porcentagens de cafés em seus diversos tipos de blends,de diversas origens e espécies. É oferecido um café 100% Robusta de origem indiana.O cardápio indica que este café possui o mais alto índice de cafeína de todos (2,32%), e orienta quanto às qualidades aromáticas dos cafés.No caso do café Robusta indiano diz:”Três corsé,Pour lês amateur de sensations fortes”.Me permita traduzir: “Muito relevante(rude).
Para os amantes de sensações fortes”.Confesso que não o tomei, pois não me faz bem muita cafeína.
Temos que lutar pelos cafés do Brasil, nós pelo café Arábica, que é o que produzimos, e vocês pelo café Conillon. Queremos que cada um tenha sua associação,para melhor defendermos o nosso café.Mas no fim tudo é café. A única solução que temos é a união de todos os cafeicultores.
Ricardo Gonçalves Strenge
ricardostrenger@yahoo.com.br