Wilson Baggio
Diversos segmentos da sociedade, como o político e o governamental e até mesmo a mídia, há uma percepção muito errônea de que a cafeicultura vive um bom momento, gerando renda para os produtores, e, portanto, o setor tem capacidade de saldar seus compromissos.
É comum também, se ouvir que os setores da cana, cítrus e café vão bem, o que não acontece, vivendo o café, a semelhança de várias commodities da agropecuária brasileira, um momento extremamente delicado, em consequência principalmente de três fatores:
1) A grave crise de preço e renda que marcou o período 2001/2004;
2) A desvalorização do dólar;
3) A forte especulação do mercado;
O primeiro fator provocou descapitalização do setor. O câmbio, problema comum a todas as commodities, colocou o custo de produção e o preço de venda praticamente idênticos, deixando o produtor sem margem de ganho. E por fim, as especulações nas bolsas, provocando grande volatilidade nos preços.
O período 2001/2004 manteve os preços médios anuais extremamente baixos, entre US$ 43 e US$ 73 por saco, valores esses muito abaixo do custo estimado no período, entre US$ 70 e US$ 96 por saco, gerando nestes quatro anos um prejuízo para o setor como um todo, uma perda superior a US$ 2,5 bilhões.
No final de 2004, houve pequena recuperação dos preços do café, esperando o setor que se iniciasse um período favorável, assegurando renda para o mesmo. Entretanto, esse período de preços um pouco melhores foi muito curto tendo terminado em meados de 2005, por causa da desvalorização do dólar frente ao real, anulando os ganhos do mercado internacional. Assim, o cafeicultor amargou quatro anos de crise e teve meio ano de pequena recuperação, muito longe de cobrir o prejuízo passado.
A partir de meados de 2005, o preço do café caiu muito, vindo ainda a aumentar os prejuízos passados, correndo o setor o risco de entrar em novo ciclo de quebra financeira.
A Conab estima o custo do café fino em R$ 229,49 para uma produtividade de 25 sacas por hectare, mas no ano passado que foi de baixa produtividade, a média foi de 13 sacos por hectare.
Nessas condições, um produtor médio, com uma colheita anual de 500 sacas de café teria uma renda líquida de R$ 5 mil por ano, ou seja 1,2 salários mínimos por mês, porém 90% dos cafeicultores produzem menos de 300 sacos por ano, ou seja 200 mil produtores e suas famílias vivem com menos de um salário mínimo por mês.
Considerando o forte processo de descapitalização vivido pelo setor entre 2001 e 2004, verifica-se que a cafeicultura, a semelhança de outros setores do agronegócio não tem renda suficiente para saldar seus compromissos.
Caso não haja uma política consistente que venha a assegurar renda para esta safra, que é um pouco maior, permitindo capitalização do setor, uma parcela significativa de produtores, por certo, deixará o mercado, causando impacto negativo em mais de 2 mil municípios que tem café como atividade econômica importante, correndo assim, o risco de o setor simplesmente não conseguir sair da crise que o aflige a anos, entrando num novo ciclo de quebra financeira.
WILSON BAGGIO é presidente de honra do Sindicato Rural de Cornélio Procópio, membro conselheiro do Conselho Nacional do Café (CNC) e membro suplente da produção do Conselho Deliberativo da Política Cafeeira (CDPC)