Vitor Graize
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Em Alfredo Chaves, quando o jovem Felipe de Souza Breda, 13 anos, veste o uniforme do Coral Della Mamma, seus amigos de colégio são implacáveis. O conjunto de camisa branca e bermuda, colete, gravata borboleta e boné pretos dos meninos é motivo de gozação dos colegas que não fazem parte do grupo de música italiana, fundado por sua avó há nove anos.
O pai de Felipe, Maurílio Breda, 43, não se conforma com o descaso pela cultura que sua mãe luta para preservar. “Em casa as crianças ficam com vergonha quando a família canta em italiano”, diz o funcionário público. Hisena Paganini Breda, 67, vive no distrito de São João de Crubixá, onde ensaia as 22 crianças que formam o coro. “Alguns começam a crescer, ficam com vergonha e querem sair”, conta ela.
Vêneto. Dona Hisena começou a cantar ainda jovem e disputou competições que reuniam cerca de 25 corais italianos. A tradição ficou adormecida por um período, foi retomada há nove anos e voltou a parar um tempo depois. A atual formação se reuniu em 2005. “Eles cantam oito músicas, mas ainda tenho umas 20 para passar”, diz Hisena, que ensina as canções em vêneto, dialeto do Norte da Itália.
O empresário e músico Leandro Fardin também fala o vêneto. “Só aprendi português na escola. Em casa meus pais ainda falam no dialeto”. Para preservar a cultura dos imigrantes, Leandro fundou, em junho de 1998, a banda Gioco di Morra, cujo repertório é baseado em canções italianas. O nome é uma homenagem ao jogo (gioco) trazido da Itália e que ainda é praticado pelos imigrantes nas festas típicas.
Recentemente, Dona Hisena e Leandro se uniram e criaram a Associação Vêneta de Alfredo Chaves. “Vamos organizar este ano o festival da imigração italiana, previsto para outubro”, adianta Leandro.
Palco. No calendário anual de festas da cidade, a Mostra de Teatro também tem data definida. As mais de 70 crianças que fazem o curso de dramaturgia do Dinâmico – Centro de Produção de Texto apresentam em outubro as peças que escrevem, montam e encenam. “É um processo muito intenso e muito bonito”, diz a diretora do centro, Francisca Mota.
Os espetáculos acontecem no salão paroquial, único palco da cidade. “A nossa batalha é para que, em pouco tempo, a cidade adquira um espaço cultural”. Entre as montagens, o grupo de teatro já homenageou a escritora Haydée Nicolussi (1905-1970), nascida em Alfredo Chaves.
Assim como a poeta, a banda de fanfarra também faz parte da história da cidade. Há 30 anos, a fanfarra se apresentava nos desfiles cívicos, mas logo foi desativada. Há um mês e meio, 65 estudantes da Escola Ana Araújo, orientados por um maestro e pela professora de Educação Física Márcia Mendonça, ensaiam para o desfile de 7 de Setembro. A maioria nunca havia tocado um instrumento. “Esse era o fator mais limitante. Ninguém queria participar porque não sabia tocar”, conta Márcia. “Mas eles têm vontade de fazer bonito.”
Ao contrário da Fanfarra Ana Araújo, que só agora começa a dar os primeiros passos, o grupo de Folia de Reis Estrela do Oriente existe há 13 anos. A tradição é antiga, e o grupo, formado por 24 adultos e duas crianças, é um dos oito da cidade. “Nossos pais e avós cultivavam isso. Tínhamos o desejo de imortalizar o costume”, diz Danilza Rosalém.
Outra manifestação popular local, o congo teve origem com os escravos que receberam lotes da fazenda de Dona Macrina, cujo nome batiza o bairro. O Grupo de Congo São Benedito foi fundado há mais de 100 anos e tem sede própria, com capela, barracão e uma sala.
“Comecei a brincar com 15 anos. Jongava três dias e três noites sem parar”, conta Oswaldo Duarte, 81, que, junto com Afonso Cardoso, 70, ensina 35 crianças da banda mirim. “Aqui a gente faz com a cara e a coragem”.
História
Bananas. O engenheiro Alfredo Rodrigues Fernandes Chaves foi enviado por Dom Pedro II, em 1878, para expulsar os índios instalados nas sesmarias do Alto Benevente. Em homenagem ao desbravador, a cidade, situada a 81 quilômetros ao sul da Capital, recebeu o nome de Alfredo Chaves. Emancipado em 1891, o município ganhou impulso com a chegada de imigrantes italianos. Após a crise do café, nos anos 60, os agricultores passaram a cultivar a banana, que ainda hoje é o principal produto da cidade, de 14.400 habitantes. O Alfrendense Futebol Clube, criado em 1910, foi o primeiro time de futebol do Estado.