O primeiro café expresso

Quando o empresário espanhol Rafael Gil Gil afirmou que o Aeroporto de Congonhas era o melhor lugar de São Paulo, ele não estava sendo irônico ou fazendo pouco caso da Cidade. “Fui eu quem instalou as primeiras máquinas de café expresso do aeroporto. Lembro que muita gente ia até lá só para conhecer a novidade ou tomar um cafezinho”, disse Rafael, 72 anos.

A trajetória da família Gil Gil em São Paulo começou como toda boa história deveria começar: com um dilema amoroso. A Guerra Civil Espanhola fez com que os pais de Pepita tivessem de deixar Barcelona. Mas, ao embarcar em um navio rumo ao Brasil, a jovem Pepita (então com 14 anos) teria que abandonar o seu namorado, o barman do exército espanhol, Rafael.

Pepita chegou ao País no dia 14 de julho de 1955. Rafael continuou seu trabalho na Espanha. “Eu não podia sair de lá. Tinha compromissos com o exército”, lembrou Rafael. “A gente trocou correspondência por quatro anos. Foi um tempo muito difícil”, disse Pepita. “Sem ele, a Cidade me dava um pouco de medo.”

Em 1960, a espera de Pepita terminou. Rafael cumpriu sua palavra e veio buscá-la. “Eu já estava com a passagem de volta comprada. Eu vim com intenção de voltar para a Espanha”, afirmou. Mas não foi o que aconteceu. A mãe de Pepita pressionou e o barman foi ficando.

“Como não sou homem de me acomodar, com um pouco mais de 24 horas de São Paulo, eu já tinha arranjado um trabalho. Eu fazia sanduíches em uma lanchonete do Centro”, lembrou. “Mas não vim para cá para fazer isso. Sempre quis mais”, completou.

O querer mais de Rafael o transformou em técnico de máquinas de café expresso – mas não demorou para que ele abrisse o seu próprio negócio. “No começo éramos eu, minha mulher de secretária e um ajudante. Eu mesmo vendia e instalava as máquinas por aí.”

As condições de vida foram melhorando para a família Gil Gil. Na década de 70, eles tiveram três filhas e já se sentiam totalmente integrados ao País. “A empresa estava indo bem. O paulista ama um cafezinho. Toda hora tem alguém com a barriga encostada no balcão, tomando um para se esquentar ou jogar conversa fora”, explicou Rafael.

Caminho de volta

Mesmo com o sucesso das máquinas de café expresso, um violento assalto assustou o casal. “Perdemos o sono. Decidi levar todos para Barcelona. Não queria correr riscos”, explicou. E assim a família Gil Gil fez o caminho de volta.

Mas, após quatro meses de Espanha, Pepita engravidou. “Disse para o meu marido que queria ter esse bebê no meu País, na minha terra, perto das pessoas de que eu gostava e com médicos que eu confiava”, contou Pepita. Rafael não teve dúvida, reuniu todo mundo e voltou para São Paulo.

Nascia aqui o caçula, Rafael Gil Gil Filho. As lendas familiares dizem que, ainda no berço, em 1977, o bebê teria comemorado o tão falado gol de Basílio, que tirou o Corinthians dos seus 22 anos de fila (sem títulos). Na família Gil Gil, todo mundo é corintiano.

A questão corintiana é tão relevante para Rafael (o pai) que ele acabou passando por uma experiência sobrenatural com o clube. O espanhol afirmou que a primeira vez em que pisou no Parque São Jorge sentiu que já conhecia aquele lugar .

“Eu entrava em uma sala e pensava: eu já estive aqui, conheço isso, conheço aquilo. Eu sabia onde estava cada coisa.”

Só mesmo um corintiano fanático para sentir uma coisa dessas…

ESPANHA PAULISTA

Cerca de 800 mil espanhóis vivem no Brasil. Segundo dados do censo do Consulado da Espanha, o Estado de São Paulo abriga atualmente 77% de toda a população espanhola residente no País. A maioria dos imigrantes se fixou em bairros como Mooca, Brás, Cambuci, além de cidades como São Bernardo e São Caetano.

REI ESPANHOL

Em 1641, o filho de um espanhol de Sevilha, Amador Bueno, só não virou “rei de São Paulo’’ porque não quis. Com a notícia da restauração portuguesa, os paulistas declararam sua independência, aclamando Amador Bueno como rei. Ele disse não e refugiou-se no Convento de São Bento até convencer os paulistas a permanecerem fiéis ao novo rei português, D. João IV. São de origem espanhola famílias quatrocentonas como as dos Ramirez, Bueno e Martinez…

MELHOR CULINÁRIA

Você sabia que a famosa paella espanhola foi um prato inventado por homens? Aos domingos, eles iam para cozinha e colocavam na panela tudo o que tinham caçado ou pescado

SALVE CORINTHIANS!

Coração corintiano: não é à toa que boa parte dos espanhóis é torcedor fanático do timão. O presidente mais famoso do clube paulista foi Vicente Matheus, um espanhol legítimo.