Depois de uma década ou mais de preços abaixo do custo de produção, os cafeicultores do Brasil vêm comercializando café com lucro!
15 de Novembro 2016 – Boa notícia, ainda que não para todos, pois na agricultura sempre há os que sofrem de reveses climáticos ou enfrentam outros contratempos.
Nos últimos dois anos, o que parece que vai se repetir na próxima safra, esse tem sido o caso dos produtores de café do Espírito Santo; fortes secas quebraram as últimas duas safras na ordem de 50 por cento. É muito café!
Somado a esta perda, o maior produtor mundial de café robusta, o Vietnam, terá uma produção no ano agrícola 2016/17 menor que a do ano anterior.
Resultado, há déficit de curto prazo de café robusta no mundo.
O choque mundial da quebra vertiginosa da produção capixaba de café conillon combinado com o ingresso dos especuladores internacionais como fortes compradores do mercado futuro, são as bases das razões do atual nível de preço do café no mercado mundial. Para o produtor brasileiro de café a situação de preço não poderia ser melhor, pois a firmeza dos preços internacionais veio multiplicada pela desvalorização expressiva do real.
Como resultado, o preço de uma saca de café arábica bateu o nível de R$ 600,00, significando, como exemplo, renda bruta por hectare da ordem de R$ 12.000,00 a R$ 24.000,00, dependendo da produtividade de cada um!
O produtor brasileiro vem e deve continuar a aproveitar esta conjuntura favorável com disciplina e foco, o que vale dizer, ir vendendo sua safra agrícola, presente e futura, ao mercado de forma dosada e contínua, afinal lucro foi feito para ser realizado. Ficar idealizando preços cada vez mais elevados não é boa prática em mercados com a volatilidade que o café tem.
Não podemos perder de vista que a principal razão para o presente patamar de preços no mercado mundial é a forte posição comprada dos fundos, dos especuladores.
Os industriais, o segmento mais próximo do consumidor final, não acreditou que a quebra da safra do Espírito Santo fosse razão suficiente para justificar uma elevação nas cotações internacionais e ficou simplesmente olhando o mercado, não precificou em maior volume seus contratos junto à cadeia de fornecedores, pois acreditou que as cotações eram altas e iam cair! Resultado, perderem o bonde.
No último dia oito de novembro, os fundos e investidores de carteiras de índices tinham uma posição líquida equivalente a 28,5 milhões de sacas em contratos de café na Bolsa de Nova Iorque, praticamente o volume total da exportação brasileira de café arábica de um ano!
Já as empresas comerciais, refletindo café comprado e precificado pelo fornecedor, carregam uma posição líquida de contratos futuros vendidos para hedge nesta mesma Bolsa correspondendo a 29,7 milhões de sacas.
Como o mundo importador torra algo da ordem de 10 milhões de sacas por mês temos o desenho de uma situação extremamente explosiva e volátil.
O que faria um torrador precificar a sua matéria prima para um horizonte maior do que de algumas semanas? Se eles não precificaram seus contratos de compra de matéria prima a preços mais baixos, então, por que fariam agora? Eles têm bons volumes contratos junto aos fornecedores, mas não tem preço formado, o X do problema na disputa pelo consumidor final!
Esta cadeia de eventos só entra em equilíbrio e é sustentável quando o torrador toma a decisão de precificar o valor final da matéria prima que repassa como custo, junto com os operacionais e sua margem de lucro, ao consumidor. Quando o torrador erra a tendência de preços da matéria prima ele reajusta os preços ao consumidor e consolida a estrutura de preços do produtor até o consumidor.
Não é o que vem ocorrendo na maioria dos países. O torrador esta comprimindo margens e esperando.
Os torradores estão atrasados na precificação e o seu “papel” de mercado vem sendo temporariamente desempenhado pela posição comprada dos fundos.
Na prática, o comportamento dos torradores até agora tem sido de céticos com o desempenho dos preços das bolsas internacionais.
Nas próximas semanas a agenda mundial do setor cafeeiro estará repleta de questões fundamentais, a saber:
a) Primeiras estimativas da safra brasileira de 2017/18 (algumas empresas já estão estimando produção da ordem de 54 milhões de sacas, o que em minha opinião ainda é um pouco cedo para fazer).
b) Velocidade de comercialização da safra da Colômbia, países da América Central, particularmente Honduras, do México, Vietnam e Indonésia, ressaltando que os diferencias de oferta de café destas origens, sem exceção, vem erodindo.
c) Volatilidade das moedas.
d) Comportamento dos fundos no final do ano, período em que realizam lucro para apresentarem bons resultados aos seus investidores, e o comportamento dos torradores.
Os fundamentos do mercado mundial do café, oferta e demanda, continuam a indicar que não há excesso de café a vista, pelo menos até a florada de 2017, lembrando que a Colômbia e o Brasil, diante de condições climáticas apropriadas, estão com uma cafeicultura em expansão ou revigorada.
Já os fundamentos de curto prazo do mercado brasileiro de café a estória é diferente.
O torrador brasileiro de café, supridor do segundo maior mercado consumidor do mundo, assim como o segmento exportador de café solúvel, estavam por décadas acostumadas a terem oferta abundante de matéria prima, quer pela farta disponibilidade de café conillon ou de café arábica, padrão consumo interno não exportado, representando algo em torno de 15% dos volumes embarcados mensalmente ao exterior.
O choque da quebra da produção brasileira de café conillon e o baixo ritmo da exportação nos três primeiros meses da atual safra deixaram os dois segmentos em difícil situação.
Resultado, uma feroz concorrência no mercado interno por café, qualquer café, por assim dizer!
Os deságios de qualidade e tipo estreitaram, e o grau de concorrência subiu a patamares nunca vistos antes.
Não há nada a vista no curto prazo que altera a situação interna! A tormenta, se vier, vem de fora!