Fazendas de café |
O livro “São Paulo – Memória e Sabor”, de Rosa Belluzo, para a Editora Unesp, desvenda a culinária dos engenhos e cafezais |
Eliane Barbosa |
Rosa Beluzzo lembra que “reviver a variedade de sabores e aromas da tradicional cozinha de São Paulo significa valorizar a compreensão da história do cotidiano das famílias paulistas”. Na primeira matéria sobre seu mais recente livro, “São Paulo – Memória e Sabor”, publicada em 15 de fevereiro, abordamos a culinária sertaneja. Ou seja, o que comiam os índios, bandeirantes, tropeiros e os colonizadores portugueses. Gente que se adaptava ao que a terra dava e ao que traziam do além mar. Tudo mudou com as primeiras famílias assentadas que inauguraram um novo ciclo em São Paulo. Os canaviais avançaram pelo Interior com a vinda da família real e, a partir de 1760, a cultura cafeeeira expandiu-se pelo Vale do Paraíba, complementando-se às roças de feijão, arroz, farinha de mandioca, milho, açúcar e à produção de aguardente e à criação de porcos. Mineradores endinheirados (vindos de Minas Gerais), tropeiros e comerciantes compraram terras, abriram veredas e formaram extensas fazendas de café. Uma onda verde acompanhada de uma onde negra de escravos. Enquanto os homens partiam para a lida diária, as mulheres serviam nas casas grandes. Além de limpar, lavar e fazer o chão brilhar, se encarregavam da comida, sob a supervisão de exigentes sinhás. C. Lemos, autor de “Cozinhas”(Edusp), lembra que as fazendas eram o mundo das sinhás. “Quanta fazendeira rica não ficava de chinelas perambulando pelos casarões enormes (….) sendo aquele o seu mundo, a sua civilização, o seu reino de fogões fumarentos, de despesas repletas de “quitandas” e de caixas de marmeladas, pessegadas e marmeladas”. O fogão à lenha no Oeste Paulista A cultura do café introduziu o fogão à lenha, em detrimento do rústico fogão de chão, herança indígena do fogo de tucuruva. As panelas de barro foram substituídas por tachos e caldeirõesde cobre ou de ferro, e as cuias, pelos pratos de estanho ou ágata. Também introduziram o almofariz para triturar ervas e o pilão para socar farinha, café e arroz. A comida escrava Os pobres escravos tinham acesso a uma alimentação deficiente em proteínas (angu de milho, feijão com toucinho e melado). Raramente carne (de porco e apenas aos domingos) o que os levava a caçar animais silvestres. Mas nas casas grandes a cozinha era farta, hábito mantido até hoje em muitas propriedades. Rosa lembra que “A região do Vale do Paraíba ainda hoje mantém a tradição da mesa farta e das especialidades culinárias dos velhos tempos: a paçoca de carne de panela ou de carne-seca, o afogado, a canjiquinha com costelinha de porco, a leitoa pururuca, o pernil, a galinha ao molho pardo, a iça torrada, o arroz com suã, o cozido ou panelada de carne de porco e de vaca com abóbora e batata, acompanhada de pirão de farinha de mandioca. Os peixes na Quaresma “O rio Paraíba oferece uma variedade de peixes consumidos em geral na Quaresma. Bons exemplos de preparo são o peixe frito ou ensopado e o tradicional bolinho caipira, cuja massa é composta de milho, recheado com peixe”. Os doces e as quitandas foram mantidos, incluindo os de preparo caseiro, como o furrundum (cidra e mamão ralados, adoçados com rapadura, o pão-de-ló, a paçoca de amendoim, doces em calda, brevidades, rosquinhas, o mamão em pedaços, a broinha, o pudim e a taiada (composta de melado de cana, farinha de mandioca e gengibre ralado) que tem o mesmo formato da rapadura. As vendas da Capital As plantações de café foram se expandindo para outras regiões do Estado, incluindo Campinas e Ribeirão Preto. O avanço da cultura cafeeira permitiu o enriquecimento dos barões do café. São Paulo entrou em ebulição no fim da década de 1860, com a criação da primeira estrada de ferro, em 1867, a São Paulo Railway, ligando a capital a Jundiaí. Campinas se desenvolveu, concentrando uma nova camada dominante e recebeu duas ferrovias: a Mogiana e a Sorocabana. Com o advento das ferrovias ( o Governo Imperial também concluiu a estrada de ferro que ligava São Paulo ao Rio de Janeiro), os deslocamentos tornaram-se mais rápidos e mais eficientes e os barões do café e suas famílias mudaram-se para a metrópole. Moravam na Capital e tinham suas fazendas no Interior. No inverno, fugiam do frio e da umidade paulistana se refugiando em suas propriedades rurais. São Paulo prosperou com o aumento das exportações. Foi inaugurado o jardim da Luz e fundada a Academia de Direito no largo de São Francisco. Os estudantes procuram cafés e restaurantes para se alimentar e as quitandeiras de rua. Os escravos, na década de 1860, foram libertados e passaram a conviver com outros homens livres e humildes: tropeiros, vendeiros, lavradores, enquanto as famílias patriarcais viviam retiradas em seus sobrados. A ida dos fazendeiros para São Paulo causou um aumento demográfico. Novos bairros se abriram, chácaras foram loteadas, foi inaugurada a primeira linha de bonde e cresceu o abastecimento de gêneros alimentícios. Secos & molhados “A cozinha passou a integrar o corpo da casa, recebeu janelas e foi munida com fogão à lenha, construído com tijolos importados, acionado com carvão ou coque; instalou-se uma chaminé para escoar a fumaça”, narra Rosa. Multiplicaram-se os “secos e molhados” e vendedores ambulantes iniciaram a venda de pães, carne e leite em carrocinhas puxadas por muares. Para a burguesia foram instaladas lojas de produtos importados, enquanto que as quituteiras vendiam nas ruas empadas, fatias de cuscuz, pé-de-moleque, bolos de milho verde e pamonha. FEIJÃO TROPEIRO Ingredientes: 500 g de feijão carioquinha 250 g de toucinho em cubinhos 1 cebola picada 2 dentes de alho amassados sal a gosto ½ xícara (chá) de farinha de mandioca 1 pimenta dedo-de-moça, sem sementes, picada (opcional) ½ xícara (chá) de salsinha e cebolinha picadas Preparo: Colocar o feijão em uma panela e cobrir com água. Levar ao fogo para cozinhar até que os grãos estejam macios e inteiros. Escorrer o caldo e reservar o feijão. Dourar o toucinho em uma panela com uma colher (sopa) de óleo). Retirar o toucinho com uma escumadeira e secar em papel toalha. Na mesma gordura que ficou na panela, refogar a cebola e o alho. Acrescentar o feijão, o toucinho frito, temperar com sal e pimenta. Misturar tudo muito bem e juntar a farinha de mandioca aos poucos. Na hora de servir salpicar salsinha e a cebolinha. Servir com costelinha de porco, lingüiça e ovos fritos. GALINHADA Ingredientes: 1 galinha caipira cortada na junta 1 cebola em cubinhos 1 dente de alho picadinho 2 ½ xícaras (chá) de arroz 3 tomates sem pele e sem sementes em cubinhos Sal a gosto 5 xícaras (chá) de água 3 colheres (sopa) de salsinha picada óleo Preparo: Limpar a galinha com limão e temperar com sal. Levar ao fogo uma panela com óleo, dourar a cebola e o alho. Acrescentar os pedaços de galinha e fritar até ficarem douradas. Juntar o arroz, colocar os tomates picados e deixar cozinhar por uns minutos. Acertar o sal. Adicionar a água fervente até cobrir o arroz. Cozinhar com a panela tampada por cerca de 30 minutos ou até que o arroz e a galinha estejam cozidos. Se necessário, complementar com mais água. Na hora de servir, salpicar com salsinha. TIGELADA DE CHUCHU Ingredientes: 6 chuchus maduros 1 colher (chá) de sal 1 cebola média picada 2 dentes de alho espremidos 3 gemas 3 claras batidas em neve 3 colheres (sopa) de far. de trigo 1 ½ xícara (chá) de leite 2 colheres (sopa) de queijo meia-cura ou parmesão ralado sal a gosto 3 colheres de (sopa) de salsinha óleo vegetal para untar e farinha de rosca para polvilhar a forma Preparo: Preaquecer o forno a 180ºC. Descascar os chuchus e tirar o miolo. Cortar ao meio no sentido do comprimento e cozinhar em água e sal. Amassar a polpa do chuchu com um garfo deixando escorrer toda a água. Colocar em uma tigela e misturar os demais ingredientes. Bater as claras em neve e acrescentar delicadamente à massa. Untar um refratário ou uma forma para bolo com óleo e polvilhar com farinha de rosca. Levar ao forno para assar por 40 minutos. BOLINHO DE ARROZ Ingredientes: 4 xícaras (chá) de arroz branco cozido 2 ovos 1 colher (sopa) de farinha de trigo 1 colher (chá) de fermento em pó 4 colheres (sopa) de queijo parmesão ralado Sal e pimenta do reino a gosto 3 colheres (sopa) de salsinha picada Óleo para fritar Preparo: Em uma tigela funda colocar o arroz e misturar os ovos batidos. Juntar os demais ingredientes e misturar bem. Aquecer o óleo em uma panela. Com o auxílio de duas colheres de sopa, pegar pequenas porções da massa, formatar os bolinhos e fritar em óleo bem quente. Se preferir, enrolar com as mãos untadas de óleo. Retirar com uma escumadeira e colocar sobre papel toalha. AFOGADO DE SÃO LUIZ DO PARAITINGA Ingredientes: 200 g de toucinho defumado em cubinhos 1 cebola grande em cubinhos 2 dentes de alho picadinhos 1 pimentão vermelho em cubinhos 4 tomates, sem pele e sem, sementes, em cubinhos 1 ½ kg de mandioca cortada em cubos de 2 cm 12 xícaras de água fervente 1 folha de louro sal e pimenta-do-reino a gosto ½ xícara (chá) de ervas picadas: folhas de hortelã, manjericão, salsinha e cebolinha 3 xícaras de farinha de mandioca crua Óleo vegetal Banana cozida Molho de pimenta-vermelha para servir Preparo: Preparar o afogado na véspera de servir. Levar uma panela (grande) ao fogo com um pouco de óleo e dourar ligeiramente o toucinho. Juntar a cebola, o alho, o pimentão e o tomate até murchar. Acrescentar a carne deixar dourar. Adicionar a água, o louro, o sal e a pimenta. Cozinhar lentamente em fogo baixo, por aproximadamente 3 horas, com a panela tampada. Remover a espuma que se formar na superfície. Retirar do fogo e deixar esfriar. Levar à geladeira até o dia seguinte. Descartar a camada de gordura que se formar na superfície. Separar o caldo e, com um garfo, lascar a carne. Acrescentar novamente ao caldo. Levar o afogado ao fogo e deixar cozinhar por mais 5 minutos. Juntar as ervas e acertar o sal. Servir o afogado em uma sopeira da seguinte maneira: colocar 3 colheres (sopa) de farinha de mandioca em um prato fundo e regar com uma concha do caldo, misturando com um garfo até virar um pirão. Acrescentar a carne por cima do pirão, regando com mais caldo. Servir com banana cozida e molho de pimenta. |