O GLIFOSATO E O MEIO AMBIENTE

Por: Luiz Alberto Silveira Mairesse*

O advento da moderna biotecnologia na agricultura levará, inexoravelmente, ao fim do uso dos agrotóxicos convencionais, não só pela incorporação de resistência genética às pragas (insetos, fungos, bactérias e vírus, dentre outras) em plantas cultivadas, independentemente das espécies doadoras ou receptoras, como também pela possibilidade de obtenção dessas substâncias naturais de defesa, a partir de microorganismos e plantas cultivadas especialmente para esta finalidade.

A síntese, pela moderna química, de novas moléculas praguicidas, a partir de moléculas-moldes encontradas na natureza, completará o conjunto desta nova tecnologia, que vai aliar altas produtividades agrícolas com segurança alimentar e ambiental. Vislumbra-se ainda, num futuro próximo, a criação de plantas transgênicas alelopáticas que desbancarão também os herbicidas.

No contexto atual, entretanto, os herbicidas ganham grande importância, quando se generaliza mundialmente o uso da resistência de plantas a herbicidas não seletivos. É o caso da resistência ao glifosato e glufosinato de amônio, já utilizados em todo o mundo. Se isto pode determinar uma ampliação do uso destes dois agrotóxicos convencionais, por outro lado significa a substituição de herbicidas altamente impactantes por produtos menos tóxicos e menos agressivos ao ambiente. Os herbicidas deste grupo (glicinas) atuam inibindo a enzima 5-enolpiruvato-chiquimato-3-fosfato sintase (EPSPS), impedindo, por conseqüência, a síntese dos aminoácidos fenilalanina, tirosina e triptofano. Por apresentarem mais de um mecanismo de ação, limitado ao metabolismo da planta e praticamente nenhum efeito residual, esses herbicidas são considerados produtos com baixa probabilidade de selecionar espécies resistentes. São favoráveis sob o ponto de vista ambiental porque se ligam fortemente às partículas do solo, degradando-se rapidamente em compostos que ocorrem naturalmente no solo, como o gás carbônico. A intensificação de pesquisas nesta área acena para avanços imensos. Genes de resistência a herbicidas são muito comuns na natureza, atuando das mais diversas formas, fazendo desta opção uma das mais importantes na preservação ambiental, apesar da resistência que tem havido por parte de grupos de ambientalistas leigos.

Na lavoura convencional de soja, além do glifosato (utilizado como dessecante), outros herbicidas bem mais tóxicos e com muito maior poder residual são comumente utilizados. Tem sido muito comum, na Região do Planalto do Rio Grande do Sul, observar-se prejuízos, nos mais diversos graus, à culturas subseqüentes, como o milho e principalmente o trigo, devidos aos resíduos desses herbicidas. Estas constatações podem ser também confirmadas com pesquisadores das estações e dos centros de pesquisa da FEPAGRO, EMBRAPA, FUNDACEP e outros da Região. Os problemas com os resíduos de herbicidas são tão sérios no cultivo convencional, que no Centro de Pesquisa de Sementes de Júlio de Castilhos (FEPAGRO), onde trabalhamos por mais de vinte anos, se costumava evitar realizar experimentos com trigo em áreas, onde nos anos anteriores, houvesse sido cultivado soja convencional.

Com o advento da soja transgênica, resistente ao glifosato, tem sido voz corrente no RS que são muito evidentes os benefícios à cultura do trigo, pelo exuberante crescimento e desenvolvimento inicial das plantas, comparativamente com lavouras desta gramínea em sucessão com soja convencional. Evidentemente, precisa haver comprovação científica (se já não houve) deste fato. Entretanto, os indícios são muitos claros e tais resultados já eram esperados, pela conhecida rapidez com que o glifosato é degradado no ambiente.

Outra observação importante e que tem sido relatada é a maior ocorrência de minhocas no solo de lavouras de soja transgênica, comparativamente com a lavoura convencional. Este também deve ser um tema importante para a pesquisa científica. Além das características bem conhecidas do glifosato de menor toxicidade e de deixar menos resíduos de produto no solo, não pode ser descartada a possibilidade de ocorrência do fenômeno da hormese, característico deste herbicida. Doses baixas do herbicida glifosato (no caso, baixos resíduos) podem estimular o crescimento não só de minhocas, como também de outros componentes da fauna e da flora do solo.

Com o aumento da área de plantio de cultivares resistentes a herbicidas, o surgimento de espécies resistentes é uma possibilidade concreta, pela possível seleção de genótipos pré-existentes nas populações. Esta é uma situação que a ciência tem enfrentado, em condições muito mais complexas, desde que o primeiro herbicida foi inventado. Por isto não deverá ser difícil a solução por parte da engenharia genética, pois novos herbicidas, mais eficientes, menos tóxicos e menos agressivos ainda ao ambiente, já estão sendo pesquisados, visando estabelecer novos sistemas. De qualquer forma, é preciso lembrar que o glifosato, dos herbicidas utilizados em todo o mundo é um dos produtos com menor possibilidade de selecionar espécies resistentes.

As restrições impostas ao plantio de soja transgênica resistente ao herbicida glifosato em determinadas áreas, visando proteção das mesmas, chega a ter caráter surrealista. Com relação ao gene de resistência, é óbvio e consensual a impossibilidade de fluxo gênico e, conseqüentemente, qualquer impacto ambiental. Ora, como suposta proteção a essas áreas, o que se consegue na prática é evitar a utilização de um herbicida dos menos tóxicos e menos agressivos ao ambiente, para continuar permitindo a aplicação de produtos que, comprovadamente, são poluidores do meio ambiente.

As medidas de restrição conseguem tão somente desproteger ainda mais o meio ambiente e causar ainda mais prejuízos econômicos aos agricultores e às regiões alvos deste inexplicável equívoco.

* O autor é engenheiro agrônomo, Doutor em Agronomia e conselheiro da Pró-Terra, Associação Brasileira de Tecnologia, Meio Ambiente e Agronegócios (www.proterra.org.br) .
E-mail: mairesse@terra.com.br

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