Société Générale compra o banco da família Coimbra e acirra a disputa no bilionário e lucrativo mercado de crédito ao consumidor
Foi um domingo e tanto para os franceses. Depois de quatro meses de negociações, o grupo financeiro Société Générale fechou, no último dia 25, a compra do Banco Cacique, da família Coimbra. O valor do negócio foi estimado em R$ 850 milhões à vista e representa quase três vezes o patrimônio líquido da instituição. A operação, comunicada ainda no fim-de-semana ao presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, mostra que o apetite dos banqueiros pelo pujante mercado de crédito ao consumidor no Brasil continua forte.
Há um mês, o Bradesco adquiriu o Banco BMC, por R$ 800 milhões em trocas de ações, de olho numa carteira de crédito consignado (com desconto direto do salário ou na pensão do INSS) de R$ 1,5 bilhão. Numa única tacada, o Bradesco dobrou sua fatia nesse bolo. Agora, ao dar seu maior passo em 40 anos de presença no Brasil, o Société Générale compra uma montanha de R$ 900 milhões somente em empréstimos consignados. Ao que tudo indica, este é o negócio da China no Brasil atual. O consignado tem baixíssimo risco e inadimplência idem, pois é descontado mês-a-mês diretamente dos vencimentos dos clientes assalariados ou pensionistas do INSS. A taxa de juros é generosa. O Cacique cobra 2,7% ao mês (quase 38% ao ano) de seus aposentados. A taxa Selic, o juro básico do Banco Central e parâmetro de captação no mercado interbancário, está em 13%. Como diz o bordão da campanha de marketing da instituição, a operação “é do Cacique!”.
O Société Générale venceu outros interessados no negócio. Também cobiçaram o Cacique os grupos BNP Paribas, Santander Banespa, ABN Amro Real e GE Capital. Ao encampar uma máquina de fazer empréstimos com 1.800 funcionários, 600 mil clientes ativos, 150 agências próprias e 1.800 pontos de distribuição em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, o Société Générale tem tudo para brigar com os grandes concorrentes no varejo bancário.
Os franceses querem dobrar a rede nos próximos quatro anos. “Estamos muito felizes com esta aquisição, que nos permite aproveitar o savoir-faire do Banco Cacique”, diz o diretor de Serviços Financeiros Especializados do Société Générale, Jean- François Gautier. “Esta compra representa uma etapa importante
em nosso desenvolvimento no mercado brasileiro.” O capital do banco francês no País será ampliado de US$ 100 milhões para US$ 500 milhões para fazer face ao novo momento.
O grupo francês atua como banco de investimentos, tem uma corretora de futuros e é dono de 70% do Banco Pecúnia. Também faz parte do fundo de private equity Brazilian Derivative Fund, que aplicou US$ 1 bilhão em empresas dos setores de açúcar e álcool. Há um ano, passou a investir no mercado de locação de veículos e gestão de frotas, com a ALD Automotive. A idéia é ampliar ainda mais os negócios no País, aproveitando o bom momento do mercado de capitais e a expansão do crédito e do Investimento junto às pessoas físicas. “Não vamos parar por aqui. O Brasil é o nosso foco”, afirmou o presidente do Société Générale Brasil, François Dossa, ao jornal Valor Econômico. As áreas de administração de recursos de terceiros, gestão de fortunas e crédito imobiliário também atraem seu interesse.
Com maior acesso às grandes empresas, o Soclété Générale pretende levar o crédito consignado muito além das fronteiras do sistema previdenciário do País e do funcionalismo, oferecendo as linhas aos empregados das companhias privadas. O crédito para pequenas e médias empresas poderá ser mantido e ampliado. Vamos olhar o segmento das pequenas e médias empresas para ver se vale a pena desenvolvê-lo”, afirmou Dossa.
O nome e a estrutura do Cacique serão mantidos. Os quatro principais executivos – os diretores Wanderlei Vettori, Renato Oliva, Fernando Casali e Sylvio Santoro Filho – foram convidados a ficar. O atual presidente, Cesário Coimbra, será substituído por um diretor-geral. A farm1ia Coimbra, que fundou a financeira Cacique em 1984 e abriu o banco cinco anos depois, deixará de atuar no setor financeiro. Irá se dedicar aos tradicionais negócios com café solúvel. Da marca Cacique, claro.