BRASIL
05/11/2007
O negócio é se promover
O Brasil
começa timidamente a seguir o exemplo dos países que sabem valorizar
sua marca para gerar mais negócios internacionais
Por Angela
Pimenta
Construído sobre uma ilha artificial, o hotel Burj Al Arab é uma bela
tacada de marketing de Dubai, maior cidade dos Emirados Árabes Unidos, para
vender-se como o principal pólo turístico e centro de negócios do Oriente Médio.
O hotel, que imita a forma de um barco a vela, é forrado de ouro, mármore de
carrara e um raríssimo granito azul brasileiro. Nada menos do que 12 000 metros
quadrados da pedra, extraída do norte fluminense, revestem o lobby do hotel. Mas
quase ninguém sabe disso. Ao fornecer o granito para os árabes, a pedreira
brasileira assinou uma cláusula que a impede de associar seu nome ao do Burj Al
Arab. Seja pelo histórico acanhamento tupiniquim em vender a marca “made in
Brazil”, seja pelo talento de Dubai para jogar os holofotes sobre suas atrações
e impedir que outros faturem sobre elas, o caso do granito é exemplar.
Erguida sobre as areias do deserto, nas últimas três décadas Dubai
reinventou-se para se tornar independente do petróleo. Hoje é um entreposto
global estrategicamente situado entre Oriente Médio, Ásia e Europa. Adepto do
livre comércio, o xeque Mohammed bin Rashid, governante local, oferece isenção
de impostos para atrair firmas como IBM, Sony e Nokia. O petróleo responde por
apenas 7% do produto interno bruto (PIB) do emirado, de 37 bilhões de dólares.
Com um vistoso calendário de eventos, o comércio e o turismo geram mais da
metade do PIB. A promoção desses setores é uma prioridade de Rashid. Os troféus
de eventos esportivos, como corridas de cavalo, levam o nome do xeque, que
também é a vedete de feiras como a Gitex, de informática, a maior da região.
O mercado imobiliário dos Emirados e países vizinhos também cresce
velozmente. Estima-se que os projetos em andamento por lá ultrapassem 800
bilhões de dólares. De olho nesse filão, no final de novembro, 50 empresários
brasileiros vão participar em Dubai da Big 5 Show, a maior feira da construção
civil do Oriente Médio. Não é a primeira vez que o Brasil vai à feira, mas neste
ano conta com uma nova estratégia. A Agência de Promoção de Exportações e
Investimentos (Apex), ligada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior, criou um plano específico para aumentar as vendas de pedras
decorativas. Um arquiteto brasileiro vai à feira montar ambientes de acordo com
a vontade de cada cliente. A meta da Apex é dobrar as vendas dos expositores,
que no ano passado somaram 17 milhões de dólares. Recentemente, a agência
demonstrou uma agressividade inédita ao promover os produtos de 150 empresas
brasileiras na Anuga, a maior feira mundial de alimentos, realizada em Colônia,
na Alemanha. Além de criar com os fabricantes novas embalagens para produtos
como geléias, carnes e café, a Apex espalhou cartazes com a marca Brasil pela
cidade. O resultado foi um recorde de vendas de 963 milhões de dólares.
“Alemanha e Dubai são mercados prioritários para a internacionalização de
produtos, serviços e empresas brasileiras”, diz Alessandro Teixeira, presidente
da Apex. Indicado para o cargo há seis meses pela ministra-chefe da Casa Civil,
Dilma Rousseff, Teixeira tem doutorado em comércio exterior pela Universidade de
Sussex, da Inglaterra. Com ele, a Apex passa por uma reestruturação. Além de
formular estratégias para diferentes setores e empresas de todos os portes,
Teixeira usa ferramentas de marketing para explorar o que chama de “inteligência
emocional dos mercados”. Um de seus maiores desafios é aliar a imagem
tradicional do país do samba e do futebol a conceitos como os de eficiência e
qualidade, já associados à imagem de empresas como a Embraer mas ainda distantes
da marca “made in Brazil”.
Para vender sua marca globalmente, a minúscula Dubai dispõe dos ministérios
de Desenvolvimento Econômico e de Turismo, Comércio e Marketing. Mas, quando se
trata de brigar por mercados, as maiores economias do planeta, como Estados
Unidos e Reino Unido, são as referências, dadas as poderosas estruturas que têm
com a única missão de promover o comércio externo. À frente da Apex, o desafio
de Teixeira é transformá-la numa agência com esse modelo, que ajude o Brasil a
elevar a participação nas trocas mundiais. Apesar de ter triplicado o volume de
exportações na última década, o país ainda representa apenas 1,14% do comércio
internacional. “Precisamos acelerar as exportações para acompanhar o ritmo
global”, diz Josué Gomes da Silva, superintendente da Coteminas, uma das maiores
exportadoras de produtos têxteis do país.
AS GRANDES POTENCIAS mantêm legiões
de representantes comerciais pelo mundo. Só no Brasil, a agência de promoção dos
Estados Unidos (a USCS) tem 54 funcionários distribuídos por quatro cidades para
assessorar empresários americanos. A USCS mantém sites em várias línguas, nos
quais anuncia oportunidades de negócios. Escrito em português, o site
FocusBrazil.org.br procura empresas brasileiras para parcerias com as
americanas. Uma delas, no momento, é a dona da marca Build-a-Bear, que quer
abrir uma franquia no Brasil para oferecer seus bichos de pelúcia personalizados
a crianças. Enquanto isso, os grandes emergentes tentam não ficar atrás. Durante
o último Fórum Econômico Mundial, a Índia enviou uma ruidosa caravana de
empresários à Suíça para atrair capital estrangeiro para sua indústria de
informática. Já o conselho chinês de promoção do comércio internacional realiza
duas edições anuais da feira de Cantão, gerando negócios de 70 bilhões de
dólares.
Em sua nova fase, a Apex está organizando um departamento de inteligência
comercial que prevê o envio de forças-tarefa a mercados prioritários. Na
geopolítica comercial, foco é sinônimo de eficiência. Até recentemente, a Apex
tinha 33 mercados-alvos. O número foi cortado pela metade e os mercados são
estudados cruzando dados estatísticos com informações colhidas pelo envio de
missões comerciais. Além de criar estratégias específicas, as forças-tarefa
também definem metas de vendas e critérios de avaliação de resultados. Em
parceria com a União da Agroindústria Canavieira de São Paulo, a Apex monta um
projeto de promoção do etanol brasileiro junto a formadores de opinião nos
Estados Unidos, Bélgica, Japão, Índia e China. Outra meta é a ampliação da rede
de centros de negócios no exterior, em locais ainda a ser definidos. Hoje eles
são cinco, em Miami, Lisboa, Frankfurt, Varsóvia e Dubai. A Apex também está
reforçando o time. No final do ano, deverá ter 170 profissionais, 50 a mais que
o quadro atual, dos quais 20 trabalhando no exterior. Apesar do aumento, é um
número quase irrisório ante os 2 400 britânicos e 36 000 americanos atuando nos
órgãos de promoção comercial deles.
Se por um lado o comércio global inclui a disputa acirrada por mercados, por
outro estimula a articulação dos órgãos de comércio exterior de diferentes
países. No mês passado, o secretário de Comércio dos Estados Unidos, Carlos
Gutierrez, visitou Brasília acompanhado de uma dezena de executivos-chefes de
grandes empresas americanas. O objetivo era fazer recomendações para destravar
gargalos comerciais entre os dois países. Depois foi a vez dos britânicos. A
convite da Apex, Andrew Cahn, diretor da UKTI, a agência de promoção do Reino
Unido, acaba de visitar Rio de Janeiro, São Paulo e Piracicaba, no interior
paulista, onde conheceu uma usina de etanol. “O Brasil é um mercado-chave para
nós, e estamos sub-representados no comércio brasileiro,” disse Cahn a EXAME.
“Queremos um relacionamento de duas mãos, que inclua investimentos britânicos no
Brasil e de brasileiros no Reino Unido.” Além do etanol, os britânicos estão
interessados nos setores aeroespacial e de finanças. Ambiciosos, eles querem
convencer os brasileiros de que a Citi londrina, e não mais Wall Street, é o
melhor destino para o fechamento de negócios no exterior. “Temos o centro
financeiro mais global e menos protecionista do mundo. Queremos vender essa
idéia ao Brasil”, diz Cahn, como bom mercador da imagem de seu país. Em tempos
de crescimento acelerado do mundo — pleno, portanto, de oportunidades de
negócios –, o desafio do Brasil é conseguir replicar as melhores experiências
internacionais nessa área.
Mercadores da imagem
Compare as estruturas de promoção comercial de
Brasil, Reino Unido e Estados Unidos
Brasil
Agência de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex)
Reino Unido
Agência de Comércio e Investimento do Reino Unido (UKTI)
Estados Unidos
Serviço de Promoção Comercial dos Estados Unidos (USCS)
Orçamento (em milhões de dólares)
Brasil
177
Reino Unido
368
Estados Unidos
9 400
Número de funcionários
Brasil
120
Reino Unido
2 400
Estados Unidos
36 000
Escritórios no exterior
Brasil
5
Reino Unido
46
Estados Unidos
149
Participação no comércio mundial
Brasil
1,14%
Reino Unido
4,86%
Estados Unidos
8,66%
Fontes: UKTI, USCS, Apex, The World Book/CIA e Fitch Ratings