A suíça Nestlé está “disposta” a fazer aquisições no Brasil, seu maior mercado na América Latina.
O vice-presidente para as Américas da empresa, Laurent Freixe, vê espaço para consolidação, como ocorre no segmento de lácteos, em comida para animais de estimação (petfood) e em café. “Fazemos screening [rastreamento] de oportunidades no Brasil”, afirmou ao Valor.
Freixe esteve ontem na apresentação do balanço da Nestlé de 2017, quando a expansão das vendas foi a menor desde meados dos anos 90. Estados Unidos e Brasil ajudaram nessa desaceleração.
“O Brasil é um mercado de 200 milhões de habitantes com um potencial de consumo enorme e vamos investir em inovação, em nossas marcas e olhamos oportunidades de crescimento externo”, disse Freixe. Para ele, o mercado brasileiro, com muitas empresas regionais de alimentos, não é tão concentrado como na Europa e no México.
A Nestlé não está sozinha no interesse pelo setor de café no Brasil. Concorrentes como a multinacional Jacobs Douwe Egberts (JDE), a brasileira 3Corações e a alemã Melitta fizeram aquisições estratégicas nos últimos anos.
Embora queira se desfazer de alguns ativos em certos mercados, no Brasil o plano da Nestlé só inclui mesmo prosseguir na venda de certas marcas de chocolate por causa da fusão com a Garoto. “No Brasil, procuramos mais é ampliar nosso perímetro do que reduzi-lo”, garantiu Freixe.
A estratégia de Nestlé é direcionar seu portfólio global para categorias de alimentos e bebidas de expansão rápida, que atendam a novas preferências do consumidor e tenham margens mais elevadas.
Na América Latina, na semana passada, a Nestlé anunciou a compra da Terrafertil, maior produtora mundial de “uvillas” (ou physalis peruviana), uma fruta ica em vitaminas e antioxidantes. A empresa foi fundada em 2005 no Equador, e tem fábricas também no México, Colômbia e Chile. Sua marca principal, “Nature’s Heart” está presente também no Reino Unido. O valor da operação não foi revelado.
O Brasil passou a ser o quarto maior mercado da Nestlé no mundo, depois que o grupo dobrou sua presença na China justamente com aquisições bilionárias. O primeiro mercado é os EUA, o segundo a China, e a França e o Brasil se revezam nos dois seguintes.
O novo CEO mundial de Nestlé, Mark Schneider, que assumiu no ano passado, permanece sob forte pressão do investidor ativista americano Dan Loeb, que comprou US$ 3,5 bilhões de ações do grupo suíço e exige mais agilidade e aumento dos lucros da companhia.
Schneider, que ontem comentou os resultados da companhia em 2017, promete uma “gestão ativa do portfólio” de produtos, estimando nisso mais potencial para aquisições pequenas e médias, sem descartar compras maiores.
A multinacional quer assim responder a novas desafios na indústria de alimentos, que inclui a busca do consumidor por mais produtos naturais e mais saudáveis, produzidos a partir de plantas orgânicas, livres de lactose e de glúten ou com alta proteína.
No ano passado, a Nestlé desembolsou US$ 2,3 bilhões pelo fabricante canadense de vitaminas Atrium Innovation, crescendo em produtos de saúde para o grande público a fim de compensar o declínio em atividades tradicionais como alimentos processados.
Nos EUA, adquiriu uma parte da rede de café premium Blue Bottle Coffee; a Chameleon Cold-Brew, em primeira posição no mercado de café frio biológico. E também comprou a Sweet Earth de comidas vegetarianas.
Com isso, posiciona-se para enfrentar a concorrência no segmento de produtos naturais e orgânicos. A parcela de produtos premium, com mais valor, passou a 21% do total das vendas em 2017 comparado a 14% em 2014.
Ao mesmo tempo, a companhia vendeu seu negócio de doces nos EUA para a Ferrero por US$ 2,8 bilhões. Conforme analistas do banco UBS, a Nestlé busca renovar 10% de seu faturamento por meio de fusões e aquisições, e de venda de ativos com fraco crescimento.
A empresa quer crescer na área de saúde, mas seu CEO evitou comentar se teria feito propostas pelos produtos sem receita médica dos laboratórios farmacêuticos Pfizer e Merck.
Schneider anunciou ontem que a companhia não vai renovar o pacto de acionistas entre a Nestlé e a família Bettencourt no grupo francês de cosméticos L’Oréal. A participação de Nestlé é estimada em cerca de EUR 24 bilhões. O CEO não deu qualquer indicação de qual será a posição do grupo suíço, quando expirar o pacto de acionistas no dia 21 de março. Para certos analistas, a venda da fatia na L’Oréal daria mais munição para grandes aquisições. (Ver reportagem Portas abertas para vender fatia na L’Oréal)