Camilla Muniz
Ciência Hoje/RJ
Os amantes do bom cafezinho que têm problemas com a ingestão de cafeína poderão em breve experimentar uma versão da bebida naturalmente descafeinada. Pelo menos é o que esperam os pesquisadores do IAC (Instituto Agronômico de Campinas), que estão realizando testes com uma planta cujo teor da substância é de apenas 0,07% – dez vezes menos que o café consumido habitualmente.
O cafeeiro é um exemplar da espécie Coffea arabica, que normalmente possui cafeína em sua composição e é a mais consumida no mundo.
\”A característica diferenciada da planta que usamos nas pesquisas é resultado de uma mutação natural\”, explica a engenheira agrônoma do IAC Maria Bernadete Silvarolla.
Para os pesquisadores, o cafeeiro é um verdadeiro tesouro. Trazido da Etiópia para o Brasil, através da Costa Rica, na década de 1970, ele foi descoberto em meio a 2.500 mudas preservadas em banco genético, após muita dedicação e paciência da equipe.
O objetivo dos testes é verificar se este café naturalmente descafeinado pode ser introduzido nas lavouras e render boas safras. Segundo a engenheira agrônoma, a mutação que reduziu a concentração de cafeína na planta também reduz sua produtividade, o que a diferencia das cultivares melhoradas de Coffea arabica, que são altamente produtivas. Por isso, os pesquisadores do IAC estão trabalhando no melhoramento genético do cafeeiro, a fim de viabilizar a produção em larga escala.
Por meio da hibridização, a equipe espera reunir em uma só planta duas características: baixo teor de cafeína e alta produtividade. A técnica consiste em fazer cruzamentos dirigidos manualmente, visando a transferência dos genes do café descafeinado para sementes de uma cultivar modelo de Coffea arabica. Os pesquisadores já obtiveram a segunda geração desse vegetal híbrido e agora realizam mais testes.
\”Esta etapa é importante para que nós possamos verificar quais genes estão governando as características da planta, além de corrigir defeitos e analisar necessidades de plantio, como adubação e espaçamento entre as plantas\”, conta a engenheira.
O café descafeinado encontrado hoje nos supermercados é produzido industrialmente. O método mais utilizado é à base de solvente químico – geralmente o diclorometano -, passado nos grãos para extrair o estimulante.
De olho no exterior
A engenheira agrônoma acredita que a produção de café naturalmente descafeinado no Brasil pode ajudar a incrementar as exportações do País, maior produtor e exportador mundial do produto.
Por aqui, apenas 1% da bebida consumida é sem cafeína, mais procurada por aqueles que apresentam dores de cabeça ou agitação ao ingerirem a substância. Já no exterior, o café descafeinado é o preferido de aproximadamente 10% dos consumidores.
\”Nossa meta é proporcionar às pessoas mais uma alternativa\”, ressalta a pesquisadora do IAC.
Quanto às propriedades da bebida, Maria Bernadete Silvarolla garante que o descafeinado não fica devendo nada ao café comum.
\”O fato do cafeeiro encontrado também pertencer à espécie Coffea arabica, que é o tipo mais saboroso e aromático de café, nos dá ainda mais esperanças de que poderemos obter bons resultados nos testes.\”
Brasil desenvolve método de produção para pés de café desprovidos de cafeína
06/07/2010
Renato Grandelle
RIO – Descobertos há seis anos, os pés de café desprovidos de cafeína finalmente podem chegar ao mercado – e graças a um método desenvolvido no Brasil, onde, ironicamente, os descafeinados não têm grande apelo popular. Um estudo coordenado pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (Fapesp) usou agentes químicos para induzir mutações no DNA de pés de café. Trata-se de uma técnica empregada há décadas na agricultura, mas nunca com esta planta.
– A primeira etapa é fazer alterações pontuais no material genético – explica Paulo Mazzafera, diretor do Instituto de Biologia da Unicamp e coordenador da pesquisa. – Depois, colocamos as sementes que passaram por aquele tratamento para germinar. Daí só resta a seleção das plantas que desenvolveram a característica desejada: a ausência total de cafeína.
Cerca de 35 mil sementes foram analisadas, com diferentes doses de agentes químicos e tempo de tratamento. Os pesquisadores encontraram sete plantas sem cafeína. Uma proporção altíssima, considerando a ocorrência de mutações na natureza.
Os pés desprovidos de cafeína produzirão sementes com a mesma característica. A partir daí, portanto, o experimento parecia encaminhado. Mas não foi simples assim.
A mutação induzida fez com que as flores desses pés de café florescessem mais cedo do que o normal. Este fenômeno diminui a produtividade de sementes.
O cafeeiro normal começa a produzir o pólen quando a flor ainda está fechada, garantindo uma numerosa autofecundação. Nas plantas obtidas pelo experimento, a flor floresce precocemente, antes mesmo da produção do pólen.
– Não registramos autofecundação em muitos pés de café que passaram por mutações – lamenta Mazzafera. – É um problema, porque essas plantas passam a receber pólen de cafeeiros normais. E este cruzamento origina grãos de café com cafeína.
Abelhas garantem produtividade
O pesquisador desenvolveu duas estratégias para driblar esta deficiência. A primeira: cultivar separadamente plantas normais e \”mutantes\” – um espaço razoável entre elas cessaria a troca de pólen. O segundo passo é colocar abelhas nas plantações onde não há cafeína. O inseto aumenta a polinização do café. Com a autofecundação acelerada, cresce a produção de novas sementes.
O método desenvolvido pela Unicamp é mais barato e eficiente do que os usados atualmente em todo o mundo para a produção de café descafeinado. Duas das três fórmulas mais conhecidas sacrificam substâncias importantes para o desenvolvimento do aroma e sabor do café.
– O método mais eficiente usa a forma líquida do CO2 para lavar os grãos de café. Mas esse processo demanda alta pressão e temperaturas de até 70 graus Celsius, ou seja, um aparato que encarece o produto – ressalta o pesquisador da Unicamp.
No Brasil, a receptividade ao café descafeinado é muito menor à observada em outros países. Embora o produto seja responsável por 10% de todo o café comercializado internacionalmente, aqui ele responde por apenas 1% das vendas.
– As palpitações provocadas pela cafeína podem causar efeitos na saúde das pessoas. Aparentemente os brasileiros são menos sensíveis a este efeito estimulante – cogita Mazzafera.
O café descafeinado mais encontrado no país é solúvel – algo não muito digerido pelos brasileiros. O descafeinado em grãos, como o produzido pela pesquisa, é mais caro e difícil de encontrar.
Com a resistência dos consumidores nacionais ao produto, o pesquisador da Unicamp mira o mercado estrangeiro. A expectativa é levar para o campo, até o ano que vem, as mudas produzidas com sementes mutantes. As exportações começariam em três ou quatro anos.
Brasil desenvolve método de produção para pés de café desprovidos de cafeína
CIÊNCIA
06/07/2010
Renato Grandelle
Descobertos há seis anos, os pés de café desprovidos de cafeína finalmente podem chegar ao mercado — e graças a um método desenvolvido no Brasil, onde, ironicamente, os descafeinados não têm grande apelo popular.
Um estudo coordenado pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (Fapesp) usou agentes químicos para induzir mutações no DNA de pés de café. Trata-se de uma técnica empregada há décadas na agricultura, mas nunca com esta planta.
— A primeira etapa é fazer alterações pontuais no material genético — explica Paulo Mazzafera, diretor do Instituto de Biologia da Unicamp e coordenador da pesquisa. — Depois, colocamos as sementes que passaram por aquele tratamento para germinar.
Daí só resta a seleção das plantas que desenvolveram a característica desejada: a ausência total de cafeína.
Cerca de 35 mil sementes foram analisadas, com diferentes doses de agentes químicos e tempo de tratamento.
Os pesquisadores encontraram sete plantas sem cafeína. Uma proporção altíssima, considerando a ocorrência de mutações na natureza.
Os pés desprovidos de cafeína produzirão sementes com a mesma característica. A partir daí, portanto, o experimento parecia encaminhado.
Mas não foi simples assim.
A mutação induzida fez com que as flores desses pés de café florescessem mais cedo do que o normal.
Este fenômeno diminui a produtividade de sementes.
O cafeeiro normal começa a produzir o pólen quando a flor ainda está fechada, garantindo uma numerosa autofecundação. Nas plantas obtidas pelo experimento, a flor floresce precocemente, antes mesmo da produção do pólen.
— Não registramos autofecundação em muitos pés de café que passaram por mutações — lamenta Mazzafera.
— É um problema, porque essas plantas passam a receber pólen de cafeeiros normais. E este cruzamento origina grãos de café com cafeína
Abelhas garantem produtividade
O pesquisador desenvolveu duas estratégias para driblar esta deficiência.
A primeira: cultivar separadamente plantas normais e “mutantes” — um espaço razoável entre elas cessaria a troca de pólen. O segundo passo é colocar abelhas nas plantações onde não há cafeína. O inseto aumenta a polinização do café. Com a autofecundação acelerada, cresce a produção de novas sementes.
O método desenvolvido pela Unicamp é mais barato e eficiente do que os usados atualmente em todo o mundo para a produção de café descafeinado.
Duas das três fórmulas mais conhecidas sacrificam substâncias importantes para o desenvolvimento do aroma e sabor do café.
— O método mais eficiente usa a forma líquida do CO2 para lavar os grãos de café. Mas esse processo demanda alta pressão e temperaturas de até 70 graus Celsius, ou seja, um aparato que encarece o produto — ressalta o pesquisador da Unicamp.
No Brasil, a receptividade ao café descafeinado é muito menor à observada em outros países. Embora o produto seja responsável por 10% de todo o café comercializado internacionalmente, aqui ele responde por apenas 1% das vendas.
— As palpitações provocadas pela cafeína podem causar efeitos na saúde das pessoas. Aparentemente os brasileiros são menos sensíveis a este efeito estimulante — cogita Mazzafera.
O café descafeinado mais encontrado no país é solúvel — algo não muito digerido pelos brasileiros. O descafeinado em grãos, como o produzido pela pesquisa, é mais caro e difícil de encontrar.
Com a resistência dos consumidores nacionais ao produto, o pesquisador da Unicamp mira o mercado estrangeiro. A expectativa é levar para o campo, até o ano que vem, as mudas produzidas com sementes mutantes. As exportações começariam em três ou quatro anos.