Roberto Tenório
Depois de 47 anos de íntima relação com a cafeicultura, Luiz Marcos Suplicy Hafers, de 73 anos, nascido em 1935, na cidade de Santos (SP), reflete a vivência e o conhecimento de quem lida diariamente com um segmento em constante transformação. A simpatia e o bom humor mostra também que ele não se abateu diante das frequentes adversidades proporcionadas por um setor constantemente ameaçado pelo clima e pelas oscilações bruscas de preços, típicas do mercado de commodities.
A voz rouca – resultado de uma luta vitoriosa contra um câncer de garganta diagnosticado há 25 anos – expressa as duas paixões de sua vida além do café: o pólo e o Santos Futebol Clube. A atenção e a desenvoltura com que trata os assuntos mostra que a idade não afastou o carisma e muito menos o prazer de viver do atual diretor de café e ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB).
Hafers dispensa com simplicidade a construção personalista sobre sua vida e observa que é um fazendeiro. “Minha vida não tem importância. O café, sim”, ressaltou. A história de sua família com a cafeicultura teve início em 1840, período considerado a “era de ouro” da cultura – que respondia pela maior parte da riqueza produzida com as exportações brasileiras. Já sua primeira fazenda foi comprada em 1962, quando tinha 26 anos, no município de Ribeirão Claro, norte pioneiro do Paraná. É lá o lugar onde até hoje mantém uma propriedade de 150 hectares cultivados com café.
O cafeicultor acredita que o mercado mudou muito ao longo desses anos, de uma gestão mais patrimonial para gerencial. Segundo afirmou, o grande consumo registrado no Brasil nos últimos anos só foi possível com o final da intervenção estatal. “Os preços eram tabelados para controlar a inflação e prejudicavam a qualidade. Isso afastou o consumidor, que precisa sentir prazer ao apreciar a bebida”. Hafers destacou sobretudo o trabalho feito da indústria do café, por meio da Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), promovendo a qualidade.
Sem se sentir incomodado, contou sobre sua experiência negativa em plantar a variedade arábica no oeste baiano, no final dos anos 1990. Essa variedade é conhecida por depender de clima ameno durante o amadurecimento dos frutos para manter um bom padrão de qualidade. Hafers explica que seu maior problema foi de “acabamento”. “Tive acabamento de dinheiro. Fiz os cálculos esperando a recuperação dos preços que nunca chegaram”, brinca o diretor da SRB.
Com relação à fazenda de 200 hectares irrigados que montou na região, disse que foi vendida. “Mas ainda há ainda 10 mil hectares cultivados naquela região”, completa. Para manter a qualidade, ele explica que optou à época pelo sistema de cereja descascada. E é exatamente essa produção com qualidade e foco no consumidor final que, na sua opinião, será o fator determinante para o sucesso da cafeicultura nacional nos próximos anos.
Para Hafers, a crise não é preocupante no que diz respeito à queda no consumo, pois a bebida é barata e proporciona prazer. “Mas agora é o melhor momento para discutir novas políticas de renda. Precisamos trabalhar no previsível para administrar o imprevisível”. O principal motivo para essa discussão é o alto custo de produção. Conforme informou, a mão-de-obra representa 50% do custo por hectare.
A principal crítica ficou com a política fiscal e agrícola adotada atualmente. “Elas sempre foram baseadas no financiamento. Precisamos parar de oferecer crédito para esperar o mercado reagir depois. O negócio é financiar o produto e não o produtor”. Disse ainda que não existe uma “bala de prata” para liquidar a situação. Mas avaliou que as opções públicas para equalizar o mercado seria uma das melhores opções. Um bom patamar de preços seria R$ 350 a saca, enquanto o atual paga R$ 260 na saca.
Hafers alerta que se nada for feito em relação à renda na cafeicultura pode ocorrer futuramente um colapso na oferta. “A produção não deverá acompanhar o consumo. Os preços devem disparar e incentivar a produção paralela. Seria muito ruim, pois poderíamos perder a referência de qualidade”.