16/10/2009 – Uma pesquisa analisou quatro diferentes experiências, realizadas no sistema agroindustrial de café no Brasil, que tiveram o objetivo de agregar valor ao produto, com base em uma economia sustentável. O resultado foi o livro Estratégias de diferenciação e apropriação da quase-renda na agricultura: a produção de pequena escala, que acaba de ser lançado.
De acordo com a autora, Maria Sylvia Macchione Saes, professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da Universidade de São Paulo (USP), a preocupação com a qualidade do alimento e com a sustentabilidade socioambiental se traduz em diversas maneiras possíveis de diferenciação na produção rural. Essa é uma das principais discussões levantadas pelo livro, que teve apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Publicações.
“O objetivo da obra é discutir como o produtor de pequena escala cria estratégias factíveis e sustentáveis que possibilitem reverter a queda de sua renda com a atividade agrícola”, disse a autora à Agência FAPESP .
A questão da queda de renda do setor agrícola, segundo ela, não é problema exclusivo dos produtores de países pobres. “A análise sobre a queda da renda na agricultura não se centra na dicotomia entre países pobres e ricos, que são faces distintas do mesmo fenômeno com que se depara a economia do século 21, mas no âmbito das cadeias agroindustriais”, apontou.
O livro é resultado de sua tese de livre-docência. Atualmente, Maria Sylvia coordena a pesquisa intitulada “Comportamentos oportunistas em negociações envolvendo investimentos específicos: um estudo com metodologia experimental”, apoiada pela FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular.
“Enquanto nas etapas da cadeia produtiva há uma tendência à sofisticação e à diferenciação, no segmento rural os produtos agrícolas permanecem, de forma geral, como commodities, cujas características são baixas barreiras à entrada e forte concorrência-preço”, disse.
A autora desenvolve a ideia de que a criação e a apropriação de valor devem ser determinadas conjuntamente, uma vez que “a consistência da estratégia de diferenciação depende não apenas das características das fontes de valor, mas também das relações entre os segmentos da cadeia produtiva”.
A obra é dividida em duas partes. Na primeira são abordadas quatro diferentes linhas teóricas da economia das organizações, a partir das quais são discutidos casos específicos: “análise de posicionamento”, “visão baseada nos recursos”, “economia dos custos de transação” e “teoria dos lucros de Knight”.
“Nessa primeira parte, discuto como os empresários escolhem estratégias que criam e capturam valor. A partir dessas teorias, construo um modelo e analiso casos concretos, que são experiências no sistema industrial do café”, explicou Maria Sylvia.
As quatro experiências adotadas no sistema agroindustrial de café no Brasil – e analisadas no estudo, a partir do modelo proposto – foram a Cooperativa Regional de Cafeicultores Guaxupé (Cooxupé), maior cooperativa de café no mundo, a torrefadora italiana de cafés especiais Illycaffè e as experiências dos produtores de Baturité (CE) e de Poço Fundo (MG).
Segundo a economista, trata-se de experiências únicas, que tentam agregar valor ao produto, pautados em uma economia sustentável. Ou seja, caracterizam-se, entre outros fatores, pela capacidade de crescimento do consumo de produtos de origem, orgânicos e socialmente responsáveis.
“O modelo de análise mostrou que existem condições mais ou menos favoráveis para se agregar valor à produção. E essas condições vão depender da forma como os produtores se relacionam com os compradores ou do momento da cadeia produtiva”, disse.
Cooperação facilitada
Na avaliação de Maria Sylvia, nos dois primeiros casos – Cooxupé e Illycaffè – é uma tarefa complexa compreender “quem é o comprador” e como se dá a relação entre eles.
“Os produtores precisam ter entre eles um acordo para realizar a negociação. São relações muito mais difíceis para serem gerenciadas. Por isso mesmo, elas oferecem uma oportunidade maior de ganho”, disse.
O trabalho destaca, entre outros pontos, que o quanto o produtor se apropria da quase-renda criada pelos investimentos específicos na relação “depende da oferta de cafés especiais e da demanda das outras firmas entrantes no mercado que estão investindo no nicho de cafés especiais”.
A quase renda é a diferença entre a receita bruta e os custos variáveis totais, ou custos operacionais – isto é, a capacidade do ativo de gerar efetivamente uma renda. “A quase renda incide sobre a diferença existente entre um produto diferenciado, com valor agregado e um produto não diferenciado, como uma commoditie”, explicou.
“Outro ponto é que a forte identificação dos produtores como fornecedores da empresa produz um relacionamento idiossincrático, cujas partes tendem a preservar a relação e facilitar a cooperação”, disse.
Maria Sylvia acrescenta que, quanto mais complexa se torna essa relação, mais barreiras são criadas, porque para alguém imitar fica mais difícil.
“Se a sustentabilidade desse mercado depende da restrição artificial, nada impede que outras empresas certificadoras se aproveitem do crescimento do mercado consumidor e criem seus selos de comércio justo levando à diminuição do prêmio de preço”, destacou.
Livro: Estratégias de diferenciação e apropriação da quase-renda na agricultura: a produção de pequena escala
Autora: Maria Sylvia Macchione Saes
Páginas: 194
Preço: R$ 38
Mais informações: http://www.annablume.com.br
As informações partem da Agência Fapesp, noticiou o Agrolink / Café e Mercado.