29/05/2012
Preservar a natureza faz parte do cotidiano de uma geração de agropecuaristas que não precisam de leis para respeitar o meio ambiente
DANIEL POPOV | Dinheiro Rural
Após dois anos de discussões sobre o novo texto para o Código Florestal brasileiro, a Câmara dos Deputados aprovou, no dia 25 de abril, o texto-base do projeto que modifica a legislação em vigor, criada em 1965. Durante todo esse período, a tramitação do novo Código foi cercada de passionalismo. De um lado, as ONGs de todas as matizes, preocupadas em evitar que o documento cristalizasse séculos de práticas danosas ao meio ambiente. Do outro, agricultores e empresários ligados ao agronegócio, temerosos de que a interferência e os rigores da lei inviabilizassem suas atividades no campo. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra. O fato é que, para um grupo cada vez mais expressivo de agropecuaristas, tanto faz se será essa a nova lei no campo daqui para a frente. Esse grupo procura agir com correção em sua relação com o meio ambiente, independentemente da sanção ou do veto da presidenta Dilma Rousseff ao novo Código.
Mas o que é ser correto, hoje, para produzir alimentos sem agredir a natureza? O empresário paulista Jovelino Mineiro Filho, vice-presidente da Associação Brasileira dos Criadores da Raça Zebu (ABCZ), é taxativo. “Os maiores interessados na preservação do meio ambiente são os produtores, que justamente dependem dele para sobreviver”, afirma Mineiro Filho. Ele está coordenando a elaboração de um documento da ABCZ de defesa do setor produtivo, a ser apresentado na Rio+20, a grande conferência mundial sobre o meio ambiente, marcada para junho, no Rio de Janeiro. A senha de que é preciso esclarecer que o desmatamento e a destruição do meio ambiente não fazem parte do DNA dos produtores rurais brasileiros está no centro dos argumentos que serão apresentados pela ABCZ.
Concorda com ele o professor do Departamento de Ciências Florestais da Universidade de São Paulo (USP), Pedro Henrique Santin Brancalion. Para ele, boas práticas ambientais podem representar ganhos financeiros e a garantia de fornecimento de alimentos ao mercado externo. “Os países importadores de alimentos estão exigindo a comprovação dessas boas práticas de seus fornecedores”, diz Brancalion. “E quem não pensar nisso não vai vender daqui para a frente lá fora.” Segundo ele, essa preocupação já pode ser vista em algumas culturas como a do café, laranja, cacau e pecuária de corte (leia a reportagem Certificação Verde, na pág. 82).
No Centro-Oeste, a Aliança da Terra vem mudando a maneira de o produtor lidar com o gado e a agricultura desde 2004. 0 grupo reúne mais de 500 fazendas com uma área ocupada de três milhões de hectares, totalmente preservados e manejados de forma sustentável. A ideia de formar o grupo foi do americano John Carter, que chegou ao Brasil no início da década de 1990 para montar uma fazenda de gado, em Goiás, e passou a ficar incomodado com a sua imagem de destruidor da natureza. Hoje, Carter faz palestras na Universidade Harvard aos seus compatriotas. A universidade é dona de uma fazenda de gado em Mato Grosso. A Aliança da Terra fechou parcerias, para a realização de pesquisas, com o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e com o Woods Hole Research Center, de Massachusetts, instituto especializado em florestas, solos, ar e água. “Quando o trabalho é feito em harmonia com a natureza, é fácil entender o papel de uma mata ciliar para ajudar a manter o solo da lavoura saudável e com riqueza de nutrientes”, diz Charton Jahn Locks, gerente de projetos da Aliança da Terra.
No Paraná, um grupo de 133 pequenos agricultores de Apucarana está mostrando que o campo pode ser o responsável pelo bem-estar nas cidades. Os agricultores estão cuidando de 800 hectares de matas ao redor de 385 nascentes que deságuam nos rios Pirapó e Tibagi, este responsável pelo abastecimento das cidades de Maringá e Londrina, dois centros importantes do interior paranaense, que abrigam uma população de 800 mil habitantes. Entre os agricultores está Satio Kayukama, proprietário da Chácara Alvorada. Dos sete hectares da Alvorada, dois fazem parte da reserva legal. Produtor de café, ele não abre mão de ser um dos principais incentivadores para que outros apicultores da região façam parte do Projeto Oásis, nome do movimento paranaense. “Não tem preço ver os animais raros voltando à região e o volume intenso de vazão das águas que brotam das minas, mesmo nos períodos de seca mais intensa”, diz Kayukama.