MARCELO EDUARDO DOS SANTOS
O desafio dos profissionais do setor do café, em especial os analistas, de tentar prever a evolução dos preços da commodity ficou mais difícil. Não só as geadas têm ocorrido de forma bem menos intensa do que nos anos 70 e 80, quando provocavam fortes disparadas das cotações, como a cultura tem migrado para regiões ao norte, como Bahia, cerrado mineiro e Espírito Santo, em áreas onde a estiagem tem um peso maior.
Mas o que influenciou e muito os preços, em especial entre janeiro e março, foram as cotações do petróleo, das demais commodities e até das ações da bolsa chinesa. Segundo o economista especializado em agribusiness, Gil Carlos Barabach, da Safras & Mercado, do grupo de consultoria gaúcho CMA, nesse período o mercado chegou à conclusão de que estava tudo sobrevalorizado e a ordem passou a ser o ajuste, com a consequente queda, inclusive do café.
Esses mercados de commodities em bolsa, como café e petróleo, têm recebido nos últimos anos investimentos cada vez maiores de fundos especuladores bilionários, que, de tão grandes, atuam no agronegócio, óleo ou metais ao mesmo tempo.
O peso dos fundos nas commodities já tinha sido notado por vários analistas, mas com a crise da bolsa chinesa em março, despencando 8% em um só dia, os reflexos ficaram mais evidentes.
Barabach lembra que, no começo do ano, os fundos entenderam que era hora de realizar lucros (vender ativos) e que o petróleo e as demais commodities, assim como o valor das companhias chinesas, estavam sobrevalorizadas em uma economia mundial de anos de crescimento econômico contínuo. Era a hora de aparar as gorduras. ‘‘Eles realizaram o petróleo e realizaram nos outros mercados também’’.
Deve-se lembrar que ajustes como esse acontecem de forma mais rápida devido à tecnologia. Assim como os investidores entram em um mercado rapidamente, podem sair dele com facilidade. Por outro lado, o trabalho dos analistas está sofisticado e cada detalhe do mercado é investigado.
CLIMA
O comportamento do clima também tem surpreendido os analistas. Segundo ele, as últimas geadas severas ocorreram em 27 de junho e 9 de julho de 1994 e houve uma devastadora em 18 de julho de 1975. Os estados particularmente atingidos por esses fenômenos eram Paraná, São Paulo e Sul de Minas, que concentravam 80% da produção.
Hoje, lembra Barabach, essas trêsregiões concentram apenas 45%. Além do aquecimento do planeta, que provavelmente reduziu a intensidade das geadas, e do uso de tecnologia para se proteger do clima, os produtores têm avançado ao norte. Nessas áreas — Bahia, Espírito Santo, Rondônia e cerrado mineiro, entre outras —, há terras de menor custo com temperaturas mais altas, porém, suscetíveis à seca.
O analista afirma que essa mudança interfere nas expectativas de preços, pois obviamente a possibilidade de uma geada afeta o movimento das cotações. Mas, ressalta ele, enquanto a geada pode significar extermínio da produção, a seca pode ser combatida com irrigação ou resultar em recuperação do plantio após a chegada das chuvas. ‘‘A geada tem um efeito mais profundo e longo do que a seca’’.