O alarmante crescimento dos casos positivos para o COVID-19, reforçado pela triste e assustadora situação acompanhada por todos nós na Itália, fez governos locais e federais forçarem seus cidadãos a ficarem em casa ao redor do mundo.
A cautela, essencial para não exaurir a capacidade dos sistemas de saúde, derruba os mercados acionários, causa estresse nos mercados de renda-fixa, tira dinheiro dos ativos de risco e, dada a incerteza do quão mais grave a conjuntura pode ficar e de quanto tempo durará, traça cenários recessivos mundialmente – entre tantas outras preocupações.
Pessoas fora das ruas, sem viajar e com os comércios e hotéis fechados causam demissões nas economias mais liberais e para tentar amenizar o efeito alguns países, como os Estados Unidos, planejam mandar cheques para aqueles que tiverem suspensão de seus rendimentos.
Os índices de commodities mantem a trajetória negativa liderados por perdas das matérias-primas energéticas, sendo que o petróleo apenas nos últimos cinco dias derreteu 30% – acumulando no ano uma perda de 64%, similar à da gasolina.
As commodities agropecuárias performaram bem na semana – menos as alimentícias onde apenas o milho cedeu – e entre os componentes do CRB o café arábica da ICE apreciou 11.82%.
Discussões sobre ser ou não “alimento” essencial, assim como as possíveis perdas no consumo são frequentes nas conversas entre os participantes do mercado de café.
Outro tema é a interrupção do abastecimento, ocasionado tanto pelo fechamento dos pontos de compras de comerciantes nas origens, como pela eventual maior diminuição do fluxo de embarques.
O contrato “C” para a entrega de maio de 2020 teve uma acentuada subida causando um maior estreitamento da estrutura, sendo que o spread entre primeira e a segunda posição negociou à prêmio – o que não víamos acontecer desde o fim de 2011 (obrigado pelos dados Fernando Correa Rebelo).
Dada a demanda aquecida no curto-prazo influenciada pela estocagem dos consumidores (e por consequência para os torradores que operaram no seguimento do torrado e moído, o sentimento é positivo em função da necessidade de garantia de abastecimento.
O risco de os embarques caírem vertiginosamente acelera o interesse pelos cafés “sentados’ nos portos dos destinos, sejam certificados ou não, fazendo do terminal o “provedor” de última instancia – mesmo que caibam contra-argumentos pela localização do inventário.
Sobre o consumo ser ou não impactado no atual momento achei em minha pesquisa, antes de escrever este comentário, que nos Estados Unidos em 2011 – quando os spreads inverteram – 80.9% do consumo da bebida se dava dentro de casa. Infelizmente não achei dados mais recentes (caso alguém tenha fiquem a vontade para compartilhar no rcostasts@yahoo.com – não distribuo nada que recebo, fiquem tranquilos), portanto assumindo que tenha-se perdido algo por conta da terceira onda ou de monodoses, a princípio no maior consumidor do mundo o impacto pode não ser tão grande. Bom notar que a duração da “quarentena” faz diferença.
Já na Europa, principalmente na Itália e França, o consumo fora-de-casa tem uma participação maior, estimulado também pelo turismo – a Itália só perde para a China em visitas mundiais, mas absolutamente talvez o efeito não seja tão grande.
Segundo o último relatório do USDA (para citar estatísticas disponíveis gratuitamente a todos), a União Europeia em 19/20 responde por 46.2 milhões de sacas do consumo mundial de 166,361 milhões de sacas, ou seja, 27.8%.
Se nestes mercados o consumo fora de casa representar 20% (número aparentemente consensual entre alguns analistas) e nada for reposto pelo o que é bebido dentro de casa (o que é um exagero), a perda mundial seria de 9 milhões de sacas em um ano – causando um excesso suficientemente negativo para os preços. Aqui cabe dizer que se durar 3 meses, vira 2.25 milhões de sacas – apenas para aquela região.
Volto a dizer o que mencionei na semana passada, há muitas variáveis e podemos tentar adivinhar o que quisermos, mas é difícil se agarrar desapaixonadamente em um único argumento.
Positivamente para o café é a performance vista até agora, que pode se manter caso a pandemia dure até dois meses. Caso dure menos, o dólar perde força e a commodity ganha ainda mais força.
Como sempre, timing é tudo na vida.
Fiquem positivos, em casa e assim logos estaremos todos juntos tomando café e trocando nossas experiencias de “home-office”.
Uma ótima semana
Rodrigo Costa*