Governo fará megarrevisão de concessões de terminais

23 de janeiro de 2009 | Sem comentários Análise de Mercado Mercado
Por: VALOR ECONÔMICO

Daniel Rittner, de Brasília


O governo, por meio de suas companhias docas, resolveu fazer uma megarrevisão dos contratos de áreas arrendadas nos portos. A Codesp, que administra o porto de Santos, detonará esse processo ainda no primeiro semestre. Empresas como a Santos Brasil, do grupo Opportunity, e a Libra Terminais serão diretamente afetadas. Todas as áreas com arrendamento anterior a 1993, ano de promulgação da Lei 8.630 (Lei dos Portos), serão licitadas novamente à medida que os contratos expirarem – é o caso de um dos terminais da Cargill.


Nos demais contratos, a partir do quinto ano de aniversário, o governo, como poder concedente, deverá pleitear seu reequilíbrio econômico-financeiro à Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), responsável pela mediação entre as partes envolvidas. A alegação da Secretaria Especial de Portos (SEP) é de que os contratos em vigência não previam a proliferação de “serviços acessórios e correlatos” principalmente à movimentação de contêineres nos terminais, que se transformaram em um dos negócios mais rentáveis dos portos.


“O perfil dos negócios foi mudando e os contratos nunca passaram por uma adaptação”, afirma o ministro-chefe da SEP, Pedro Brito. Para ele, não é “justo” que a autoridade portuária fique sem dinheiro ou dependa de recursos orçamentários de Brasília para investir na infra-estrutura dos portos enquanto há arrendatários que faturam, com um terminal de contêineres, mais do que toda a companhia docas.


O pano de fundo é justamente a retomada do investimento público. “Não se trata de um pacote simplista em que os operadores darão mais e estaremos quites”, diz Brito. O ministro tem como objetivo a criação de portos “auto-sustentáveis”, que financiem as próprias obras, mas com “contrapartidas claras”. Em maio, a Codesp assinará um contrato de R$ 167 milhões para a dragagem de aprofundamento do canal de acesso a Santos, que aumentará de 12 para 15 metros seu calado.


O programa nacional de dragagem da SEP tem orçamento de R$ 1,4 bilhão até 2010 e há investimentos previstos também em infra-estrutura de acesso viário aos portos. Só na margem direita da avenida perimetral de Santos estão sendo aplicados R$ 55 milhões. Além disso, a secretaria prepara uma base legal para o novo padrão de administração dos portos, que pode incluir até um projeto de lei para dar mandato aos gestores e definir critérios de qualificação profissional.


“O modelo de hoje é patrimonialista e reflete uma realidade operacional de dez anos atrás”, afirma o presidente da Codesp, José Roberto Serra. Por patrimonialista, Serra entende a cobrança dos arrendatários unicamente pela área que ocupam, sem levar em consideração o tipo de atividade desenvolvida dentro do terminal. Se uma década atrás a movimentação era apenas de embarque e desembarque de cargas, uma explosão de serviços surgiu nos últimos anos, como o monitoramento de contêineres frigoríficos, lembra o executivo.


Serra compara os contratos atuais ao arrendamento de uma fazenda ou de uma loja em um shopping. Os negócios feitos na área arrendada proliferaram, mas o dono do pedaço continua recebendo o mesmo aluguel. “Se é bom negócio para o arrendatário, tem que trazer um benefício também para a autoridade portuária”, diz o presidente. “O que não dá mais é que um porto como o de Santos, por onde passa 27% do comércio exterior brasileiro, tenha que pedir recursos da União para fazer qualquer obra.”


Segundo ele, o Brasil é um dos poucos países do mundo em que ainda prevalece esse tipo de relação. “Na Europa, a autoridade portuária costuma ficar diretamente com uma parte do lucro ou do faturamento”, garante Serra. Apesar de reconhecer que o resultado da megarrevisão será um aumento de receitas para as companhias docas e um desembolso maior das empresas, Serra assegura que não motivação arrecadatória na iniciativa. O objetivo é ter uma relação clara de parceria. “O porto não é mais um pedaço de terra que você cede e recebe aluguel”, diz Pedro Brito.


Todos os novos contratos já serão assinados com essas premissas. Quanto aos antigos, a revisão ocorrerá com base na Lei de Concessões, de 1995. Mas as alterações não vão mexer no objeto dos contratos, conforme ressalta o presidente da Codesp, mas os preços contratuais. “Não vamos quebrar nenhum contrato, isso é importante dizer. Mas é claro que mesmo assim não será nada fácil”, afirma Serra, já antevendo alguma possibilidade de a renegociação chegar à Justiça, caso autoridade portuária e empresas não entrem em entendimento, com a intermediação da Antaq.


O diretor-presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), Wilen Mantelli, recebeu mal a proposta do governo. “É querer ganhar em cima dos outros”, protesta. Para ele, os terminais foram privatizados por valores altos e não têm motivos para transferir mais recursos à autoridade portuária.


“Antes de ir para cima dos terminais, que têm boa eficiência graças aos elevados investimentos que fizeram, o governo deveria dedicar-se a reestruturar as companhias docas”, afirma Mantelli. “Em vez de corrigir os erros, eles querem manter práticas obsoletas e cobrar mais de quem é eficiente. E se os terminais começarem a apresentar prejuízo, será vão dividir também as perdas?”.


Mantelli acredita que estatais como a Codesp teriam auto-suficiência para investir nos portos caso não tivessem excesso de funcionários e um passivo tão grande. “O problema é que toda a receita que entra está comprometida com o passivo trabalhista. O dinheiro entra e, em vez de ir para obras de infra-estrutura, paga indenizações trabalhistas.”


Para ele, a reestruturação das companhias docas deve começar pela profissionalização de seus diretores, que ainda seria apenas parcial. “Na Europa, troca o rei, troca a rainha e os gestores são mantidos. E o mais importante que eles têm autonomia administrativa e financeira”.


 

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