Gestão do risco e seguro na agricultura

17 de junho de 2008 | Sem comentários Mais Café Opinião
Por: O ESTADO DE S. PAULO

A agricultura brasileira passa por uma conjuntura excepcional, as perspectivas são melhores ainda e os obstáculos e fragilidades a serem vencidos e superados são proporcionais às oportunidades: ao lado das deficiências sistêmicas, a agricultura precisará adequar-se às cada vez mais exigentes e necessárias regras de proteção ambiental e social e se manter competitiva e eficiente.


A agricultura brasileira é frágil do ponto de vista financeiro, como demonstram as sucessivas crises de inadimplência e renegociações da dívida, com ônus para o Tesouro e para o próprio setor, que se ressente das limitações de investimentos públicos em outras áreas estratégicas. Tal fragilidade está associada a vários fatores, entre eles ao elevado risco da produção agropecuária e à ausência de mecanismos de proteção. A produção e a renda da agricultura, fortemente associadas a eventos da natureza, apresentam acentuada variabilidade, que dificulta o planejamento de médio e de longo prazos. E a maior rigidez do processo produtivo, com hora certa para plantar e colher e pouca margem para diferentes combinações de fatores, reduz os benefícios dos momentos de boom e eleva o ônus das fases de crise. Independentemente do empenho e eficiência do produtor, as perdas de um “ano ruim” – de clima ou mercado – podem eliminar os ganhos de vários “anos bons”, levando à inadimplência, à descapitalização e até a perda da propriedade.


O risco da agricultura é crescente, seja por causa da instabilidade climática, associada ao aquecimento global, e da intensificação do capital na composição da produção, seja por causa dos efeitos do câmbio flutuante sobre a renda do setor. Nesse contexto, a gestão de risco assume um papel cada vez mais importante para a sustentabilidade e competitividade da produção rural.


Um instrumento importante de gestão de risco é o seguro rural. No passado, a experiência do Proagro foi desastrosa. Mal desenhado, utilizando mecanismos de monitoramento falhos, sujeito a desvirtuamento administrativo, produziu mais distorções que benefícios. Durante anos, o Proagro foi uma das culturas mais rentáveis para muitos produtores, que “plantavam Proagro” para colher indenização. A maioria, mesmo seguindo as regras, nada recebia e acabava no prejuízo. Atualmente o Proagro está corretamente voltado para o agricultor familiar e, se bem orientado, poderá ser um instrumento importante para garantir a renda e estimular a capitalização desse grupo.


Outra iniciativa recente é o estímulo ao seguro rural privado, instrumento primário para reduzir os efeitos negativos do risco da atividade. O desenvolvimento desse mercado depende da participação do governo e da regulamentação. O seguro rural tem custo elevado por causa, entre outros fatores, da natureza catastrófica do risco, do alto custo de fiscalização e peritagem, das dificuldades de definir preços, da normatização ainda precária e da falta de dados estatísticos que permitam arbitrar as perdas e separar o joio do trigo. Como resultado, os prêmios são elevados, desestimulam seguradoras e produtores.


O Programa de Subvenção do Seguro Rural (Lei 10.823/03 e Decreto 5.121/04) criou as condições iniciais para a expansão do mercado, que saltou de 850 contratos em 2005 e de uma importância segurada (IS) de R$ 127 milhões para 32 mil contratos em 2007, cobrindo R$ 2,7 bilhões de IS e uma área de 2,3 milhões de hectares (ha) cultivados. A expectativa é que em 2008 o prêmio de subvenção de R$ 160 milhões possa gerar aproximadamente 80 mil contratos, IS de R$ 7 bilhões e uma área segurada de 6 milhões de ha.


Os desafios para consolidar o setor são muitos e envolvem: disseminação da cultura de proteção entre os produtores; regulamentação de um fundo para cobrir parte das perdas em anos de catástrofe; criação de bancos de dados e metodologias para monitorar clima e produtividade; aprimoramento das normas necessárias para toda a parte operacional, desde a inspeção até a regulamentação dos sinistros; capacitação de recursos humanos; e assegurar governança transparente para atrair capital das resseguradoras. O objetivo estratégico é construir um modelo de gestão integrada do risco, cobrindo os riscos climáticos e de mercado.


Esses temas serão objeto do seminário Risco e Gestão do Seguro Rural no Brasil, que ocorrerá nos dias 25 e 26, no Instituto de Economia da Unicamp (www.eco.unicamp.br).


*Antônio Márcio Buainain é professor assistente doutor do Instituto de Economia da Unicamp. E-mail: buainain@eco.unicamp.br


 

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