Foco no conilon

Por: Globo Rural

19/06/2012
 
Foco no conilon
Investimentos em pesquisa, renovação dos cafezais e produtores inspirados estão mudando a cara – e o gosto – do café capixaba
 
por Hanny Guimarães
Na Specialty Coffee Association of America (SCAA), uma das principais feiras de café do mundo, a espécie arábica sempre reinou soberana. Neste ano, no entanto, um robusta tímido brilhou no estande montado por uma delegação do Espírito Santo em Portland, nos Estados Unidos. Após degustações com participantes do evento, o conilon da cidade de Santa Teresa ganhou corpo e destaque e foi escolhido, entre outras 20 amostras, para compor um blend de café especial, o primeiro na história do grão capixaba.


O produto do cafeicultor Luís Carlos da Silva Gomes foi arrematado por quem entende de cafés de qualidade. O empresário Henrique Cambraia, dono da torrefadora mineira Santo Antonio Estate Coffee, faz parte da Associação Brasileira de Cafés Especiais (Brazil Specialty Coffee Association, ou BSCA) e comprou 20 sacas de conilon cereja descascado para misturar com o arábica de sua produção. O blend, lançado neste mês de junho, indica o início de um novo status para a planta, antes discriminada.


O reconhecimento reflete o momento da cafeicultura no Espírito Santo. O conilon completa 100 anos de existência no Estado em 2012, mas apenas 40 anos de cultivo comercial. Em 1965, devido à elevada produção mundial, originando uma oferta que superava a demanda, 53% do parque cafeeiro foi erradicado. Na década de 1970, o grão voltou e a meta era aumentar a produção. O pobre conilon era tido até como veneno na época. Desestimulados, os produtores não tinham para quem vender. A virada veio com a instalação de uma fábrica de café solúvel, a Realcafé, quando seus representantes disseram: “Podem produzir que nós compramos”. O grão estava no jogo novamente.


EVOLUÇÃO


Neste ano, a safra deve chegar a 9,3 milhões de sacas, o que representa 76% do conilon colhido no país. “Se continuarmos nesse ritmo, vamos chegar a 18 milhões de sacas em sete anos”, afirma o secretário de Agricultura, EnioBergoli. O produto é exportado para 26 países, entre eles EUA, México, Alemanha, Bélgica, Holanda e Argentina. A saca está sendo comercializada a R$ 240 e somente o conilon é responsável por 30% da renda rural capixaba.


“Nosso café evoluiu”, comemora o pesquisador Romário Gava Ferrão, coordenador estadual do Programa de Cafeicultura. De 1993 até agora, o Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) já desenvolveu seis variedades e no próximo ano deve lançar mais três. As plantas, mais resistentes à seca e produtivas, ajudaram a impulsionar o cultivo e neste novo passo resultam em frutos que proporcionam uma bebida melhor. “A busca é por materiais com maior quantidade de açúcares e menor teor de amargor”, explica.


O crescimento inspira produtores a iniciar a segunda fase do conilon. O foco agora é aumentar a produtividade, mas de olho na qualidade. Estimulados pelos pesquisadores, alguns deles estão melhorando o manejo das plantas, renovando o cafezal e, em consequência, alcançando até 100 sacas por hectare, enquanto a média do Estado é de 30 sacas por hectare. Cerca de 50% das lavouras já foram renovadas e o ritmo de substituições é entre 7% e 8% ao ano.


Na propriedade de Luís Carlos, as pesquisas estão sendo colocadas em prática e estão rendendo mais que a escolha do grão para compor o blend inédito de café especial com conilon. Há três anos, ele animou mais dois amigos cafeicultores, Sérgio Soares da Silva e Marcelo Cortelette, a investir na produção de qualidade. No início, foram chamados de malucos. “Os colegas da região diziam: ‘Não vale a pena fazer melhor, porque o mercado não está pagando’. E nós retrucávamos: ‘Não, paga sim’.” A valorização veio. A saca do conilon cereja descascado – o descascamento ainda é um processo adotado por poucos, mas que está ganhando espaço, visto que agrega valor ao produto final – vale, em média, 20% mais que a do grão comum.


Luís herdou o gosto pelo café – e a lavoura – do sogro, Laurindo Bridi, que já não cuida do trabalho na fazenda, mas admira o caminho que o genro está trilhando. O cuidado com a produção destaca o café cultivado na propriedade, que no total soma 223 hectares. “A gente percebeu que o mercado estava buscando qualidade. O consumo está aumentando”, conta, já planejando uma denominação de origem para o café produzido na região. “Nossa ideia é tornar o grão conhecido como sendo dos Vales da Serra de Santa Teresa”.


MICROLOTE


Cheio de planos, ele deseja criar um microlote de conilon e quer vender a preço de arábica gourmet, cerca de R$ 600. “Quando a gente pensa, tem de ser grande”, brinca. No próximo ano, vai iniciar a colheita seletiva em busca de grãos com peneira acima de 15, quando o mais comum na produção de conilon é peneira 13.


O novo foco une toda a cadeia do fruto no Estado. As cooperativas também estão empenhadas em remunerar melhor, porque sabem do investimento do produtor. “Precisamos diferenciar nosso conilon, agregar valor. Esse movimento está apenas começando, e nós temos a vantagem de sair na frente”, diz Daniel Piazzini, da Cooperativa Agropecuária Centro Serrana (Coopeavi). A associação reúne os cafés dos produtores da região e comercializa em mercados que estão buscando o diferencial. “Fechamos um negócio de 2.560 sacas para a Rússia em maio. O elo está se fortalecendo cada vez mais”, comemora.


O produto exportado para a Rússia passou pelo laboratório de provas CoffeeQualityInstitute (CQI), entidade americana que instalou o espaço, em parceria com a empresa Conilon Brasil, na capital, Vitória. Criado há apenas três anos, o lugar, onde também são realizados cursos para os profissionais da área, é o primeiro da América Latina especializado na classificação de cafés conilon, tamanha a dimensão que o grão está tomando no mercado. Técnicos do laboratório participaram de diversos treinamentos e desenvolveram um padrão de bebida mundial para cafés robusta. O modelo, além do Brasil, tem sido utilizado por países consumidores como EUA, Japão, Coreia do Sul, países europeus e ainda pelos produtores Índia, Uganda e Indonésia. “É uma ferramenta tanto para o comerciante quanto para o produtor”, diz o gerente de marketing da Conilon Brasil, Arthur Fiorott.


O padrão não só avalia a bebida, com degustação das amostras enviadas pelos produtores, por meio das prefeituras, mas também as boas práticas agrícolas realizadas pelo cafeicultor. Pelo projeto Conilon Especial, são analisadas todas as etapas da produção. O objetivo é melhorar a qualidade e também a responsabilidade ambiental e social da cadeia produtiva. Os ganhos são muitos para quem produz e para quem consome. “Quando você faz um processo bem-feito, o conilon tem muito mais nuances de sabor e aroma, e o cliente certamente paga mais por isso”, afirma o diretor Adelino Thomazini. 

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