Eles foram trazidos de município mineiro e dizem não ter recebido o valor combinado
Ministério Público do Trabalho investiga possibilidade de trabalho escravo
Cleide Carvalho
29/08/13 – SÃO PAULO. Sete trabalhadores do Norte de Minas Gerais foram resgatados pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) no município de Divinolândia, em São Paulo. Segundo o promotor do MPT Everson Rossi, os trabalhadores foram buscados no município de Madre de Deus de Minas para trabalhar na lavoura de café em São Paulo em meados de junho. Na última segunda-feira, abandonaram a lavoura e, como não tinham recursos para retornar para suas casas, foram abrigados pela Prefeitura. Eles se desentenderam com o dono da lavoura devido aos valores pagos na colheita.
– Os trabalhadores contaram que foi prometida uma diária de R$ 50 por dia e registro de emprego temporário em carteira de trabalho. Na hora de pagar, o proprietário afirmou que o valor seria por produtividade, medida por um latão de 60 litros. Por semana, eles receberam em torno de R$ 200. Dos nove que foram trazidos, dois já teriam deixado o município e retornado a Minas Gerais um mês atrás, quando viram que o pagamento não seria o combinado – disse o promotor.
As carteiras de trabalho dos sete resgatados, recolhidas no início da viagem, ainda estavam com o proprietário da lavoura. Ele argumentou que o documento já havia sido assinado, mas não apresentou livro de registro. O promotor não descarta que a carteira tenha sido assinada na hora, com a chegada da fiscalização. Homens e mulheres também tinham sido alojados pelo proprietário numa mesma casa, o que é proibido. Também não foi fornecido galão de água para que bebessem durante a colheita ou qualquer refeição.
– Estamos negociando para que seja paga a passagem de volta dos trabalhadores. Pois o proprietário foi buscá-los em Madre de Deus de Minas – explicou Rossi.
Ainda não foi lavrado auto de trabalho análogo ao de escravo, o que deve ocorrer apenas depois que o proprietário apresentar toda a documentação. Segundo Rossi, o MPT deve fazer audiências públicas para discutir o trabalho escravo na região, uma vez que este não foi o primeiro caso. Houve denúncia também em Caconde e o proprietário da lavoura não foi indiciado porque resolveu as pendências rapidamente.
Em Divinolândia, segundo o promotor, o proprietário não aceitou negociar e deverá comparecer em nova reunião acompanhado por advogado. Foi o segundo caso em lavoura de café no interior paulista registrado nesta safra. Em julho, o MPT e a Polícia Federal prenderam duas pessoas em uma fazenda de café em Itirapuã. Vinte e oito trabalhadores rurais foram resgatados. Eles haviam sido trazidos de Malhada, na Bahia, com a promessa de receber R$ 100 por dia, mas não tinham recebido pagamento algum e acumulavam dívida num mercadinho do município paulista. O alojamento foi considerado em péssimas condições pelo MPT. Não havia camas ou colchões e os trabalhadores dormiam sobre pedaços de papelão ou espuma.
Na mesma região de Divinolândia, em São João da Boa Vista, o MPT flagrou 16 operários da construção civil sem registro em carteira e alojados em condições insalubres e perigosas. Sete deles não tinham registro na carteira de trabalho. Todos estavam alojados em uma cocheira, onde foram improvisadas paredes de compensado de madeira. Havia superlotação, risco de incêndio, falta de condições sanitárias e higiênicas, falta de armários, roupa de cama, cobertores e as beliches tinham estrutura precária. No local também circulavam animais, o que aumentava o risco de infestação por parasitas
No último dia 14, o MPT em Campinas se reuniu com a Secretaria Estadual da Justiça e com órgãos federais para apresentar a minuta de um Plano Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo. O objetivo é erradicar o trabalho escravo no estado, com ações preventivas e repressivas.
No início deste mês, a 1ª Vara do Trabalho de Americana (SP) condenou a construtora MRV Engenharia ao pagamento de R$ 4 milhões de indenização por danos morais pela prática de trabalho escravo, em ação civil pública do Ministério Público do Trabalho (MPT). Além de multa de R$ 2,6 milhões pelo descumprimento de uma liminar concedida nos autos do processo, e mais 1% do valor da causa por litigância de má-fé (intenção de prejudicar a correta instrução do processo), equivalente a R$ 100 mil (o pedido inicial do MPT, ou valor da causa, é de R$ 10 milhões). Os valores totalizaram R$ 6,720 milhões.
O flagrante ocorreu em fevereiro de 2011, quando 63 trabalhadores em condições análogas à de escravo foram encontrados na construção do condomínio residencial “Beach Park”, em Americana, na região de Campinas. O projeto era financiado pelo programa “Minha Casa, Minha Vida”. Os migrantes dos estados de Alagoas, Bahia e Maranhão eram contratados diretamente pelas terceirizadas M.A Construções e Cardoso e Xavier Construção Civil, que prestavam serviços em áreas consideradas atividades-fim da empresa. Coube recurso ao Tribunal Regional do Trabalho.