BRASÍLIA – Uma nova economia está nascendo da prática do Comércio Justo
no Brasil e no mundo. Denominada como Economia Solidária, está baseada na
cooperação, solidariedade, democracia interna, equilíbrio ambiental, geração de
oportunidades para homens e mulheres em desvantagem social, preço justo,
respeito aos direitos das crianças, divisão de resultados e maior justiça no
comércio mundial.
O Comércio Justo – ou Fair Trade, em inglês, ainda é novidade para algumas
comunidades do País, apesar de já trabalharem e produzirem em grupos,
associações e cooperativas, de acordo com os princípios da Economia Solidária.
Segundo levantamento da Secretaria Nacional da Economia Solidária do Ministério
do Trabalho e Emprego (MTE), atualmente existem no Brasil cerca de 23 mil
empreendimentos de Comércio Justo e de Economia Solidária que geram mais de 2
milhões de postos de trabalho em 51% dos municípios. O setor fatura cerca de R$
8 bilhões anualmente, de acordo com os mesmos dados.
O tema Comércio Justo foi destacado em seminário promovido dentro da Feira do
Empreendedor 2009 no Distrito Federal. O evento foi realizado até domingo (26)
em Brasília. O seminário foi prestigiado por caravanas convidadas pelas unidades
do Sebrae no Distrito Federal e de alguns estados. As caravanas eram compostas
por representantes de comunidades, associações e cooperativas de diferentes
regiões, relacionados com a produção coletiva e solidária.
Participaram do evento: Dione Manetti, diretor do Departamento de Fomento à
Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE); Rosemary Gomes,
secretária da Economia Solidária do Estado do Rio de Janeiro e diretora da ong
Onda Solidária; Ana Larronda Asti, diretora latino-americana da Organização
Mundial de Comércio Justo (WFTO) e moderadora do debate; e Jasseir Fernandes,
presidente da entidade Faces do Brasil e da União Nacional de Cooperativas da
Agricultura Familiar e Economia Solidária.
A proposta de criação do Sistema Brasileiro de Comércio Justo e Mapeamento da
Economia Solidária, encaminhada à Casa Civil da Presidência da República, em
novembro passado, como subsídio da futura Instrução Normativa para o setor, foi
um dos principais assuntos do seminário. O documento foi fruto de diversos
debates e contribuições de movimentos, associações, cooperativas, organizações
civis e instituições apoiadoras do Comércio Justo no País. Experiências e
práticas de outros países também foram referência na construção da proposta.
Divulgação
Cerca de metade da platéia presente no seminário desconhecia o tema, conforme
manifestação ocorrida. “O objetivo da proposta encaminhada à Casa Civil é se
chegar à Lei da Economia Solidária para que, futuramente, o Comércio Justo seja
regulamentado e reconhecido no País”, explicou o diretor Manetti.
“Precisamos divulgar mais o Comércio Justo e a Economia Solidária e
incorporar esses temas no cotidiano de quem vive e sobrevive dessa forma de
trabalhar e produzir”, alertou o diretor do departamento de Fomento à Economia
Solidária do MTE. “Na economia solidária, quem produz é dono da produção,
diferente do que ocorre nas empresas capitalistas”, comparou. Há democracia
interna e os resultados são igualmente divididos, ressaltou o diretor
Manetti.
Mapeamento
A Secretaria Nacional da Economia Solidária do Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE) foi fundada em 2003 e começou a realizar o mapeamento real do
setor no Brasil, em 2005, informou o diretor. Atualmente os dados apontam que
existem no País cerca de 23 mil empreendimentos de Comércio Justo e Economia
Solidária, geradores de mais de 2 milhões de postos de trabalho, presentes em
51% dos municípios.
A economia solidária brasileira movimenta R$ 8 bilhões por ano, segundo o
mapeamento. No cadastro da secretaria há mais de 30 mil entidades relacionadas
ao tema. “Já representamos uma fatia importante da economia brasileira”,
enfatizou Manetti.
Normas e meios de reconhecer e certificar o que é Comércio Justo são
fundamentais para o desenvolvimento e consolidação dessa nova economia. A
questão da certificação e comercialização dos produtos é uma das preocupações
atuais do setor. “É preciso haver mais do que uma organização que tenha o poder
de fixar o selo nos produtos, definindo que são frutos do Comércio Justo”,
argumentou.
Ao mesmo tempo os trabalhadores e entidades da Economia Solidária devem
dialogar com os diversos segmentos do mercado, ser referência como organização
econômica, que também disputa clientela, qualidade e preço. São grandes os
desafios, resumiu Manetti.
“Cabe ao Estado regularizar, fiscalizar e criar políticas públicas de fomento
à Economia Solidária”, afirmou Rosemary Gomes, secretária estadual fluminense de
Economia Solidária. Integrante da Onda Solidária, movimento iniciado no País em
2000 e que hoje atua como plataforma, Rosemary questionou se um selo garante
respeito aos princípios do Comércio Justo. “É parte da conformidade, mas não é
tudo”, alertou.
Ela também destacou a missão da organização Faces do Brasil, que tem como
missão fomentar a criação de ambiente favorável à construção e implementação de
um sistema brasileiro de Comércio Justo. “Nós queremos norma reguladora do
Estado, mas sem a intervenção do Estado. Queremos mecanismos que dêem proteção
aos produtores menos favorecidos”, declarou Jasseir Fernandes, presidente da
entidade Faces do Brasil e da União Nacional de Cooperativas da Agricultura
Familiar e Economia Solidária. “Produzimos com qualidade, pois as pessoas que
vão consumir merecem respeito e não porque somos coitadinhos”, disparou.
Jasseir informou que este ano a União das Cooperativas de Crédito e Produção
da Agricultura Familiar (Unicapes), da qual já foi diretor, emprestou R$ 400
milhões em crédito para agricultores familiares nas 27 unidades da Federação. O
aumento do número de cooperativas de crédito é uma resposta ao sistema
financeiro, que não apóia a Economia Solidária, reclamou.
No mundo
A primeira iniciativa de Comércio Justo data de 1959 e ocorreu na Europa. “No
início, o tema estava relacionado ao combate à fome na África e países
subdesenvolvidos e tinha uma abordagem assistencialista”, esclareceu Ana
Larronda, diretora latino-americana da WFTO.
Em 1969, foi inaugurada a primeira loja de Comércio Justo na Holanda.
Atualmente o faturamento do setor é de cerca de US$ 3 bilhões ao ano no mundo,
dos quais 80% são oriundos da Europa. Existem mais de 3 mil lojas de Comércio
Justo no continente europeu e mais de 70 mil pontos comerciais com produtos
certificados.
Na Holanda, o café justo representa 2,5% do mercado e a banana justa, 5%. Na
Suiça, o café justo corresponde a 5% do mercado e a banana justa, a 40%.
Atualmente a Organização Mundial de Comércio Justo (WFTO) conta com mais de 300
organizações integrantes.
A rede européia de Lojas do Mundo (worldshops) é composta por mais de 3 mil
estabelecimentos. Entre 2004 e 2007, o Comércio Justo foi responsável por 51% do
consumo no Reino Unido, tendo crescido 38% nesse período. Em 2007, o setor
faturou 1,5 bilhão de euros nesse país.
No Japão, o Comercio Justo cresce atualmente a taxa de 70% ao ano. Esses
dados são da União Mundial de Comércio Justo (www.wfto.org). Em janeiro de 2010, O Brasil vai
sediar o ‘1º Fórum Mundial da Economia Solidária’ e também ‘1º Fórum Brasileiro
da Economia Solidária’, a se realizar no município gaúcho de Santa Maria.
Informações a respeito estão disponíveis no site: www.fbes.org.br
Exposição
Além do seminário, o Comércio Justo marcou presença na Feira do Empreendedor
2009 do DF, como tema de um dos maiores e mais bonitos estandes do evento.
Localizado na ala oeste do Centro de Convenções, o espaço contém: tapetes e
almofadas bordadas por cooperativas da capital federal; bonecas de pano do Mato
Grosso; cerâmicas vermelhas de Rio Verde (MS); biojóias feitas de chifre bovino
do Pantanal; bolsas de couro de peixe com extratos vegetais de Coxim (MS);
cestaria botânica, de Queimados (RJ); bolsas e acessórios feitos de palha de
milho da Cooperativa Tranças da Terra (SC); bordados richelieu de Quixeramobim
(CE), entre outros.