Empresas que adotaram a medida, porém, começam a experimentar retração no volume físico de vendas
A valorização do real trouxe um novo dilema para os exportadores. Para compensar as perdas com o câmbio desfavorável, várias empresas decidiram reajustar seus preços em dólar. A medida trouxe um certo alento às receitas, mas gerou um efeito indesejado: a retração do volume físico de vendas, devido à concorrência com países como a China. Alguns exportadores temem, ainda, que os reajustes prejudiquem a futura renovação de contratos, comprometendo ainda mais o desempenho no mercado externo.
A Leslie, única fabricante brasileira de linho e sediada em Jacarepaguá, é um exemplo da encruzilhada em que as empresas se encontram devido ao dólar depreciado. Nos últimos 18 meses, a empresa investiu no aumento de produtividade para compensar a desvalorização da moeda americana e se manter competitiva no mercado mundial. Em agosto, porém, o linifício não resistiu à pressão do câmbio e reajustou sua tabela em dólar em cerca de 19%. “Houve um desgaste muito grande com nossos clientes”, afirma Elizabeth Leslie, presidente da companhia.
O temor da empresa, agora, é que esse desgaste prejudique a renovação de seus contratos de exportação em março. Mesmo que isso não ocorra, a companhia já trabalha com um cenário de queda do volume físico de exportação. Fabricando cerca de 2,5 milhões de metros lineares de linho por ano, a empresa exporta cerca de 60% da produção. Por conta do reajuste em dólar, esse percentual deve cair para 55% em dezembro e para 50% no final de 2006. Os beneficiados serão seus concorrentes belgas, italianos e chineses.
Sem saída
O receio da Leslie já se concretizou para algumas empresas. “Está havendo uma queda na taxa de renovação de contratos de exportação”, afirma José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Segundo Castro, a rejeição dos importadores estrangeiros ao aumento de preços torna essa medida como a última opção dos exportadores brasileiros. “Até junho, as empresas esperavam que o dólar revertesse a tendência de queda, e só recorreram ao reajuste porque esgotaram todas as alternativas”, diz.
O setor calçadista vive a mesma situação. Em agosto, o preço médio do par exportado era de 9,68 dólares, 17% maior que os 8,27 dólares registrados em janeiro. O reajuste contribuiu para sustentar um crescimento de 8% nas receitas, que somaram 1,29 bilhão de dólares de janeiro a agosto. Em contrapartida, houve uma queda também de 8% no volume exportado. Em oito meses, o país vendeu 133,323 milhões de pares. De janeiro a agosto de 2004, foram exportados 144,359 milhões.
“A queda só não foi maior, porque muitos clientes não encontraram produtos similares em outros países”, afirma Heitor Klein, diretor-geral da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados). Mesmo assim, Klein observa que os novos preços em dólar já comprometem a competitividade do produto nacional diante de rivais da Itália e da Europa em geral. “O que nos aborrece é que, com o dólar favorável, poderíamos vencer a concorrência no segmento de calçados mais sofisticados”, diz.
Para poucos
O setor de manufaturados é o que mais enfrenta resistências para reajustar preços no mercado internacional, segundo Roberto Gianetti da Fonseca, diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. “É muito difícil mexer nos preços dos manufaturados, porque eles precisam seguir o mercado mundial”, diz.
Essa regra também vale para as commodities, mas, nesse caso, o cenário internacional ainda é favorável para os produtos brasileiros. Empresas como a Companhia Vale do Rio Doce, maior produtora de minério de ferro do mundo e siderúrgicas estão sendo beneficiadas pelo aquecimento da demanda internacional, especialmente da China e dos Estados Unidos. “Apenas um terço do sucesso de nossas exportações deve-se às ações das empresas e do governo. Os outros dois terços vêm da conjuntura mundial”, diz.