São Paulo, 10 de Dezembro de 2008 – A crise financeira internacional não alterou somente o fluxo de mercadorias do Brasil para o exterior – a média diária das exportações foi de US$ 737,7 milhões em novembro, valor mais baixo do ano desde os US$ 669,4 milhões de abril. Segundo consultores, instituições financeiras e empresas que prestam serviços de análise de crédito internacional, o exportador brasileiro adotou uma postura bem mais cautelosa no mercado internacional, recorrendo com mais freqüência a cartas de crédito e a serviços de análise de crédito e, em alguns casos bem específicos, exigindo pagamento antecipado.
Na Serasa Experian, a demanda por relatórios internacionais, serviço que consiste no fornecimento de informações comerciais sobre empresas de qualquer parte do mundo, cresceu 14% de setembro a outubro . No período imediatamente anterior, entre agosto e setembro, a expansão tinha sido de 9%. “O nível de tensão sempre aumenta quando há sinais de recessão”, afirma Laercio de Oliveira Pinto, presidente da unidade de negócios e serviços de informação da Serasa. Ele destaca que, à primeira vista, pode até parecer modesta uma alta de 5 pontos percentuais, mas, segundo ele, é preciso ter em conta que, em épocas de crise, os negócios tendem a minguar, puxando para baixo também as consultas internacionais.
Na Foreign Business Information (FBI), braço do Grupo Aduaneiras especializado na avaliação de empresas, as consultas sobre clientes que têm sede nos Estados Unidos, país que originou toda a crise, aumentaram cerca de 20% nos últimos meses. “E olha que, devido à forte oscilação do dólar, o número global de consultas caiu consideravelmente”, relata Marcos Sanroman, gerente do FBI, serviço com tentáculos em mais de 200 países.
Segundo José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), o crescimento das consultas sobre clientes norte-americanos mostra que os exportadores estão mesmo mais precavidos. “Os Estados Unidos voltaram a ser um mercado interessante para as empresas brasileiras pelo aspecto do câmbio, mas, como a situação lá está complicada, o empresário está mais cuidadoso”, diz. Castro comenta que dois dos instrumentos mais utilizados por quem quer se resguardar de calotes têm sido a carta de crédito e o seguro de crédito à exportação. O seguro, lembra ele, garante 85% do risco comercial e 95% do risco país e é mais vantajoso em termos de custo. “Ele também pode ser usado como garantia do Adiantamento sobre Contrato de Câmbio (ACC)”, conclui.
Luiz Martins Garcia, consultor de exportação do Grupo Aduaneiras, avalia que o seguro de crédito à exportação tende a ser mais utilizado nos dias atuais não só por causa da crise financeira, mas também devido a problemas localizados de quebra de contrato e de intervenção estatal na economia, situações bem comuns em mercados vizinhos como Venezuela, Bolívia, Equador e Argentina. “Esse é um recurso muito usado para evitar esse tipo de perda”, comenta.
A carta de crédito também se tornou quase que um produto de primeira necessidade nos últimos meses. Mauro Albuquerque, diretor da área internacional do Banco Santander no País, conta que as filiais da instituição no Chile, México e Argentina notaram um crescimento na abertura de cartas de crédito para empresas brasileiras. “O fato de os próprios bancos enfrentarem problemas com créditos ruins certamente assusta as empresas. Sentimos, no dia-a-dia, que o exportador está procurando por mais garantias”, diz o executivo.
“Estamos muito mais cautelosos na hora de avaliar propostas”, reconhece Walter Rauen, diretor presidente da Ciber, fabricante nacional de equipamentos rodoviários pertencente ao grupo alemão Wirtgen. A empresa, que obtém em torno de 45% de seu faturamento no exterior, tem seus maiores clientes na América Latina e na África.
Rauen informa que a empresa sempre operou com mecanismos de garantia e, por isso mesmo, o modo de operação segue basicamente igual. “Em 90% dos casos, atuamos com cartas de crédito”, diz ele. Nos 10% restantes, referentes a concorrências internacionais ou vendas a governos (como o fornecimento de equipamentos para a missão do Brasil no Haiti e um convênio da ONU na Bolívia), a Ciber utiliza o seguro de crédito à exportação. A estratégia parece acertada. “Em 12 anos não tivemos qualquer caso de inadimplência internacional”, afirma o diretor presidente.
O executivo conta que, apesar da manutenção das práticas de negociação, se nota nos últimos tempos que as cartas de crédito estão demorando mais a sair. “Em alguns mercados, os atrasos chegam a 15 dias”, diz Rauen. Está claro também, segundo ele, que os próprios clientes internacionais – construtoras, na maioria – estão mais cuidadosos na hora de tomar crédito. O presidente da Ciber reconhece que, depois da quebra do Lehman Brothers, redobrou a atenção em relação ao banco que confirma a carta de crédito. “Mas não dá para exigir mais do cliente, sob o risco de o negócio não sair.”
Cuidado extra a diretoria da Ciber está dedicando à Argentina. “O contexto político e econômico do país vizinho indica um eventual default”, diz Rauen. Ele conta que os negócios da empresa no mercado argentino despencaram mais de 50% neste semestre, comparativamente aos primeiros seis meses de 2008. Para evitar as cobranças internacionais, a Ciber está condicionando as vendas na Argentina a uma carta de garantia do seu representante local. “Ele se compromete, em último caso, a pagar a dívida via negócios futuros que serão gerados no país”, esclarece Rauen.