A real situação é que o dinheiro do Funcafé não vai chegar até às mãos do cafeicultor
O deputado federal e presidente da Frente Parlamentar do Café, Carlos Melles, concedeu entrevista ao jornalista e apresentador João Batista Olivi, do programa Mercado e Companhia – Canal Rural. Confira abaixo a entrevista na íntegra.
João Batista Olivi/ Canal Rural – O dinheiro do Funcafé precisava chegar AGORA para o produtor segurar a comercialização. Para falar sobre esse assunto, vou a Brasília conversar com o deputado que representa a cafeicultura, Carlos Melles, ele quem esteve em Belo Horizonte, sendo homenageado com a medalha Mérito Rural, concedida pela Faemg, como um dos amigos da cafeicultura, amigo do agronegócio. Em seu discurso, o que me chamou a atenção, foi o senhor dizer que entre 1964 e 1967 o Brasil queimaram-se cafeeiros. No Paraná por exemplo, queimou-se café, na tentativa absurda de segurar os preços. Isso não segurou o preço e trouxe uma outra consequência negativa para a sociedade urbana. Qual foi deputado?
Carlos Melles – A favelização, sobretudo, no Rio, São Paulo e Belo Horizonte. O Brasil vem cheio de erros na política agrícola. É tão errado, que hoje o país fica atrás de acesso ao mercado, que quer dizer vender mais. Nós cansamos de vender mais: nós produzimos 40 milhões de toneladas e vendemos; produzimos 80 e vendemos, produzimos 140 e vendemos, então não é acesso ao mercado. O problema no Brasil é que não existe política agrícola no Brasil. O que existe é um crédito que não tem como pagar e eles prorrogam, vem um crédito novo, ou seja, um capital de giro e que a cada dia afunda mais o produtor. E as políticas erradas nas décadas de 60 para 70, o Brasil pagou para erradicar café, erradicou a Zona da Mata inteirinha, favelizou o Rio, Belo Horizonte e São Paulo, a idade média dos habitantes da Zona da Mata ficou em 50 anos. Agora se errasse no passado e acertasse no presente, nós estávamos bem, mas nós ainda continuamos a errando no presente.
João Batista Olivi/ Canal Rural – A favelização de que Melles diz que o São Paulo e o Rio foram vítimas, é que a população que vivia da cafeicultura nessa época queimaram os cafés, não tinham mais o que fazer, foram para as grandes cidades. E hoje é a conseqüência que nós temos aí. Se nós tivéssemos mantido os produtores no campo naquela época, nós teríamos uma situação em nosso país muito mais equilibrada, não é mesmo Carlos Melles?
Carlos Melles – Até hoje, as culturas que empregam mão de obra em todos os países, elas procuram manter no campo. E é aquilo que nós falamos, aqui na cidade nós temos financiamentos a 8% a 9% ao ano para você reformar casa, comprar apartamento, já no meio rural você paga um absurdo e deteriora e não tem nenhuma garantia. Quer dizer, o meio rural está esquecido no Brasil, e este aspecto é o seguinte: errou lá atrás, pagou para arrancar café e depois pagou-se para plantar café. E hoje não tem o mínimo de sustentação, você não tem uma política de preço de garantia condizente de custeio, de comercialização. Os produtores estão desesperados porque é a 2º ou a 1º safra de café do Brasil. O dinheiro do Funcafé não chega, é uma burocracia formidável, os bancos repassadores não repassam, o produtor não é mais um bom cliente para pegar, põe em cheque as lideranças, as verdades, e aí fica um desespero. Parece que o governo quer que isso realmente aconteça.
João Batista Olivi/ Canal Rural – Ontem o Breno Mesquita disse que iria ao governo, mais uma vez ao Ministério da Agricultura para tentar ver se agilizava a liberação do Funcafé, mas não aconteceu nada.
Carlos Melles – Não acontece sabe por que, não existe força política para fazer isso. Nós estamos tentando agora voltar as origens do Funcafé, do Conselho Deliberativo da Política de Café, ou indicamos uma lista tríplice e o presidente da República indica um gestor para o Funcafé. Olha o ministro da Agricultura, Wagner Rossi, tem feito como o ministro Reinholds fez o maior dos esforços, o Departamento Nacional do Café faz força, a Secretaria de Agroenergia faz força, mas entre isso acontecer e o dinheiro chegar, acho que o dinheiro da colheita o produtor deve esquecer. Porque é uma insensatez.
João Batista Olivi/ Canal Rural – Não vai chegar? É isso que você está querendo dizer?
Carlos Melles – Primeiro porque R$ 400 milhões, quando precisava de R$ 5 bilhões para a colheita, é uma vergonha. O que salva agora é 30% da safra já foi colhido, mas ela já está vendida acima de 30%, não só no físico como no mercado futuro. E aí vem dizer que o preço não terá sustentação, não tem porque que na mesma hora em que é para comprar café diz que não vai comprar café. Estoque regulador zero e os fundos nadam de braçada, ficam ao bel prazer do movimento financeiro. Ou seja, enquanto não tiver uma política consistente para café, nós não vamos ter resultados, e o produtor pagando o preço como sempre.
João Batista Olivi/ Canal Rural – Ontem você em contrapartida propôs uma solução para a agricultura de forma geral, por favor nos explique isso.
Carlos Melles – Ontem nós fizemos um negócio que foi unanimidade, todos os deputados estão iniciando a discussão de um projeto de subvenção para o agronegócio brasileiro, é uma política de renda. Na verdade é o seguinte, eu aproveitei a brincadeira, porque vai que tem um congresso sobre a Abag, então o Roberto Rodrigues disse que vai fazer uma palestra sobre Copa do Mundo e Agricultura. Quando eu fui Ministro do Esporte e Turismo, nós fizemos o Panamericano, a Copa do Mundo que vai ter agora e as Olimpíadas. E nesse espírito é o seguinte, competitivo, quem é competitivo? É aquele que em 100 metros, corre no tempo mais curto ou nada no tempo mais curto, ou seja, faz o que precisa em um menor tempo. O agricultor brasileiro é o campeão olímpico do mundo, ele tem a melhor produtividade e qualidade do mundo, mas é penalizado porque não tem política agrícola. Nós apresentamos um projeto que se dê um subsídio equivalente a um salário mínimo por hectare plantado ao ano, até que as condições do mundo sejam iguais às nossas, ou até que as nossas sejam iguais às deles. Porque que lá subsidia e aqui não pode? Aí eu fico esperando a Rodada da Doha, a Rodada do Uruguai, fico atrás de acesso a mercado e o produtor passando para outro inclusive as suas propriedades. O Brasil precisa levar a sério política agrícola. Tem agência reguladora para a água, para o petróleo, para energia, para tudo, mas não tem para o agronegócio, o maior negócio do Brasil não tem regulação, não tem normas, não tem regras. Tem crédito, daí solta R$ 100 bilhões para crédito rural numa safra, e é aplicado 20% a 30% disso, porque o produtor não tem como pegar o recurso. Quer dizer, é preciso levar a sério, ainda mais numa época de eleição, é preciso discutir isso bem com os candidatos.
João Batista Olivi/ Canal Rural – Você está propondo um salário mínimo por hectare?
Carlos Melles – Isso, de subvenção e enquanto o subsídio lá fora persistir. Para dar a mesma condição de competir para o produtor brasileiro, é com o produtor da comunidade européia, com o produtor do Japão, com o produtor dos países escandinavos, com o americano, com o canadense. Ou seja, eu dou a mesma regra e vou ver quem é o melhor, agora com regras diferentes não é possível produzir.
João Batista Olivi/ Canal Rural – Claro que isso vai bater na OMC e vai ser um pandemônio, mas enfim temos que defender os nossos produtores.
Carlos Melles – Não, nós levamos para debater o Elísio Contini que viveu na Europa, pesquisador da Embrapa, da Fundação Getúlio Vargas; a CNA e a OCB. A OMC tem faixas que estruturam o que é subsídio e o que não é, porque que lá tem uma regra e aqui tem outra regra. Nós podemos adotar a mesma regra de lá, isso não é danpping, isso é política. Nesse caso, a Colômbia vem subsidiando o produtor de café, o México fez subsidiando os produtores de café e outros países fizeram, e fazem em todo o mundo. É preciso que a gente dê as condições para o produtor brasileiro, competir em igualdade com os outros produtores do mundo, feito isso, nós somos eficientes.
João Batista Olivi/ Canal Rural – Melles nós estamos vendo a proposta da revisão do Código Florestal, que na minha visão deveria ser Ambiental. O que ficou acertado na defesa da produção de café? Por que tinha aquele problema que não podia botar café na montanha.
Carlos Melles – Todo mundo já sabe, o Código Florestal de 1965 estava absolutamente anacrônico. Você não podia ter café mais no Espírito Santo, na Zona da Mata, no Sul de Minas, e hoje nós anulamos. O deputado Aldo Rebelo fez uma peça formidável, os deputados escolhidos para a Comissão foram os mais qualificados dos partidos. E como você disse, não deveria ser Código Florestal deveria ser Código Ambiental no Brasil. A sociedade urbana polui mais do que a rural, é importante que se tenha essa discussão, se os rios estão sujos não é pelo meio rural, e assim é uma discussão ampla. Mas democratizou-se, a sociedade participou e hoje o café está livre como outras culturas, como a maçã em Santa Catarina, ou seja, podemos continuar produzindo. E é isso que é importante, ele foi votado na Comissão, vai para o Plenário, por isso eu acho que a discussão vai ser cada vez mais aberta com a sociedade brasileira e quem vai ganhar é o povo, o consumidor brasileiro.
Coffee Break.