Entrevista: Bertone rebate críticas aos leilões de PEPRO de Café

21 de agosto de 2008 | Sem comentários Comércio Cooperativas
Por: Agência Estado

Brasília, 20 – Em meio às dúvidas levadas pelos exportadores de café sobre o favorecimento dos grandes produtores nas subvenções concedidas pelo governo nos leilões de Prêmio Equalizador Pago ao Produtor (Pepro), o secretário de Produção e Agroenergia, Manoel Vicente Bertone, do Ministério da Agricultura, sai em defesa das operações realizadas no ano passado. “Se você for analisar, o Pepro do café é o programa de subvenção que proporcionou uma maior pulverização entre os produtores”, afirmou.

De acordo com ele, os exportadores foram ouvidos durante o processo que antecedeu o lançamento dos contratos “Nunca é demais lembrar que o Pepro foi aprovado pelo CPDC em setembro do ano passado”, disse ele, referindo-se ao Conselho Deliberativo de Política Cafeeira (CDPC), que reúne representantes da cadeia produtiva, incluindo os exportadores, e governo.

Apesar de lembrar que todos os elos da iniciativa privada foram ouvidos durante o processo de discussão no ano passado, Bertone avaliou que o Pepro “causou uma circunstância comercial que favoreceu às cooperativas”. “Essa é declaradamente a razão pela qual os exportadores estão tão aguerridos na discussão do Pepro”, disse Bertone, em entrevista exclusiva à repórter Fabíola Salvador, em Brasília.

Na entrevista, o secretário lembrou que o Pepro do café beneficiou um grande número de produtores. De acordo com números do governo, 20 mil cafeicultores foram beneficiados pelos leilões de Pepro. “Se tivesse beneficiado só grandes, talvez não tivesse tido o barulho que teve. Se tivesse sido um Prop, não teria sido questionado”, avalia ele, referindo-se ao Prêmio de Risco para Aquisição de Produto Agrícola Oriundo de Contrato Privado de Opção de Venda (Prop), que permite o lançamento de contratos de opção privada.

O Pepro é um instrumento de sustentação de preços utilizado pelo governo, por meio de subvenção econômica (prêmio) concedida ao produtor rural ou cooperativa, que se disponha a vender seu produto pela diferença entre um preço de referência estabelecido pelo governo e o valor do prêmio equalizador arrematado em leilão. O Pepro é lançado quando o preço de mercado fica abaixo do valor de referência.

Abaixo, os principais pontos da polêmica entrevista de Bertone ao AE Agronegócios:

AE Agronegócios – Já existe uma definição sobre os leilões de Pepro para o café?

Manoel Vicente Bertone – Estamos discutindo a possibilidade de Pepro para o café e também para a cana-de-açúcar do Nordeste. Estamos ouvindo as sugestões da iniciativa privada, que tem participado das discussões. Eles forneceram informações por escrito. O desenho do programa será submetido à aprovação de todos. Em relação ao café, o que a gente percebe é que todos se preocupam muito com a forma que os leilões foram feitos no ano passado.

Mas todos entendem que não é um programa para ser descartado. Há outros programas de subvenção por parte do governo federal. Os recursos orçamentários para Operações Oficiais de Crédito (2OC) prevêem Pepro, o Prop e o PEP (Prêmio de Escoamento de Produto). Então, os programas de subvenção representam um programa importante de formulação de políticas públicas para os setores.

Nós vamos desenhar esse programa em conjunto com a iniciativa privada, porque as políticas na cafeicultura serão mais viáveis quanto mais consensuais forem. Não devem ser políticas antagônicas. Nós devemos todos remar para o mesmo lado. O interesse de todos deve convergir para o interesse da nação brasileira.

AE Agronegócios – As críticas aos leilões de Pepro aprovados no ano passado são muitas. É possível vencer essa resistência?

Bertone – Nunca é demais lembrar que o Pepro foi aprovado pelo CPDC em setembro do ano passado. A utilização do Pepro já estava aprovada. Vamos usar os recursos do 2OC, caso os ministros aprovem o programa. Não acredito que os setores estejam mentindo para nós. E eles dizem que não são contra o Pepro, desde que sejam feitas algumas alterações.

AE Agronegócios – Os questionamentos dos exportadores chegaram ao Tribunal de Contas da União (TCU), que pediu informações ao ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, sobre o programa. Isso pode atrapalhar a proposta de lançamento de novos contratos?

Bertone – Os exportadores também pediram informações para todos os ministérios que integram o CDPC. O pedido de informação que foi feito pelo TCU a pedido dos exportadores antecedeu as discussões sobre a necessidade de novos leilões. A análise que nós estamos fazendo está sendo feita há pelo menos 40 dias. Os questionamentos do TCU só chegaram para nós agora, embora nós já soubéssemos da sua existência. A gente considera que os exportadores têm o direito de questionar.

E nós temos o dever de informar adequadamente e de procurar o consenso na hora de construir os programas. O dinheiro é público. Nós vemos com naturalidade os questionamentos. As recomendações efetuadas pelos setores já contemplam as dúvidas que eles tinham quando desses questionamentos. Eles questionam muito o fato de o cooperativismo ter participado de uma maneira tão profunda do Pepro.

No entanto, isso não é privilégio da cafeicultura. Nos Pepros dos outros setores isso também aconteceu. O cooperativismo é um modelo de produção organizada e conseqüentemente é razoável que o setor tenha tido uma atuação forte. No entanto, para este ano nós procuraremos fazer com que o Pepro alcance um universo maior.

AE Agronegócios – Isso é possível?

Bertone – Nós estamos buscando mecanismos para isso, envolvendo sindicatos e associações. A idéia é definir regras que viabilizem a participação dessas organizações nos leilões. Antes, a documentação exigida era muito extensa. A gente entende que não há necessidade de se exigir tantos documentos. Isso dificultava a participação nos leilões.

Você tem que tornar os critérios mais transparentes, mais adequados para que um produtor normal possa entrar sozinho ou em grupo. Nós estamos estudando uma forma de sem perder a substância da análise do processo. É importante que não se perca de vista a criteriosa verificação das informações. A documentação tem que ser sólida.

AE- Agronegócios – Podem ser feitas outras alterações?

Bertone – Estamos estudando a possibilidade de adotar critérios de regionalização, possibilidade que ainda está sendo avaliada. A regionalização é usada para outros produtos, como na soja e no algodão. A idéia é alocar recursos específicos para uma ou outra região. Eu não sei isso é possível na cafeicultura. De qualquer forma, o importante é o modelo seja discutido e só seja apresentado aos ministros (da Agricultura, Reinhold) Stephanes, (da Fazenda, Guido) Mantega e (do Planejamento,) Paulo Bernardo, que são os responsáveis por aprovar os programas de subvenção, quando os setores privados estejam de acordo.

AE Agronegócios – Por que o senhor acha que o Pepro provocou tantas reações?

Bertone – O Pepro causou uma circunstância comercial que favoreceu às cooperativas. Essa é declaradamente a razão pela qual os exportadores estão tão aguerridos na discussão do Pepro. Eles dizem isso. O aspecto comercial pesou muito a esse respeito. Se você for analisar, o Pepro do café é o programa de subvenção que proporcionou uma maior pulverização entre os produtores. Você pode procurar o Pepro da soja e do algodão.

É diferente. O café atingiu mais de 20 mil produtores. O que se quer com um programa desses é que ele atinja ao maior número maior de produtores possível. E o cooperativismo proporciona isso porque fica fácil para o produtor participar. Só que ele é um instrumento de política pública que reconhece o cooperativismo como instrumento de política pública. Evidentemente isso gera um conflito comercial, mas que pode ser perfeitamente superado. O diálogo é que vai gerar isso. A cafeicultura, diga-se de passagem, é entre os setores agrícolas o mais organizado.

AE Agronegócios – Houve favorecimento das cooperativas?

Bertone – O Pepro não favoreceu as cooperativas, mas gerou uma vantagem comercial. O produtor sabia que a cooperativa tinha Pepro e aumentou os depósitos de café nas cooperativas. As cooperativas passam a competir em termos de preço com um instrumento muito importante, porque o produtor sabe que ali ele tem acesso a uma subvenção governamental.

Para ter, ele precisa estar ligado a uma cooperativa. Isso realmente ocorreu. Na prática, a cooperativa comprou produto no mercado. Ela tinha o Pepro, como pode ter novamente. Agora nunca é demais a gente considerar que outros setores também se valem de decisões governamentais que acabam por favorecê-los.

AE Agronegócios – Além do Pepro, o senhor poderia dar outros exemplos que confirmem essa constatação?

Bertone – A questão do PIS e Cofins é uma delas. Os créditos na utilização do PIS e Cofins é uma questão que o governo tem que analisar com muita profundidade. Isso é mais que um Pepro. A utilização dos créditos na exportação de café hoje está fazendo com que o comércio esteja se distorcendo. São temas que nós temos precisamos sentar e analisar. É mais que um Pepro. É do governo também. Principalmente se os créditos não estiverem bem fundamentados. Se forem créditos advindos de empresas que não tenham crédito, isso representa uma contingência fiscal futura.

Na verdade, os aspectos comerciais são todos extremamente sensíveis e nós temos que ter sempre em mente a necessidade de proporcionar aos produtores pelo menos um equilíbrio econômico que não gere o que tem gerado, que é um produtor quebrando e outro comprando a fazenda de um quebrado e ai quebrando de novo em três anos. Esse índice de rotatividade na produção agrícola nacional tem que ser analisada melhor pelos formuladores de políticas públicas, grupo no qual eu me incluo.

Esse tema é fundamental e ao mesmo delicado para o Ministério da Agricultura, que precisa não apenas formular uma política pública que dê competitividade ao País, mas também garanta preços razoáveis para o consumidor, estabilidade social e desenvolvimento regional.

AE Agronegócios – O Ministério já respondeu aos questionamentos do TCU?

Bertone – Não somos nós que respondemos. O Pepro foi operacionalizado pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), que está preparando a documentação. Posteriormente, essas informações serão repassadas pelo ministro Stephanes ao TCU. Vamos responder no prazo, com certeza. Você também pode ter certeza que a Conab tem toda a documentação. A Conab sabe quem participou do leilão. Todos os procedimentos estão amparados em lei.

No caso das cooperativas, o TCU questionou alguns pontos relacionados a três cooperativas de um total de 42 cooperativas que participaram dos leilões de Pepro. Na documentação, foram questionadas três cooperativas que tiveram procedimentos distintos. Como eu sou advindo da área cooperativista, posso dizer que elas se valeram do ato cooperativo, da Lei Cooperativista e da Constituição Federal. Só que isso não cabe à Conab dizer.

Cabe às próprias cooperativas, se elas forem questionadas. À Conab cabe responder e explicar o procedimento que foi adotado para cumprimento dos avisos. Se alguma cooperativa agiu de forma incompatível com o aviso no entender do TCU, o tribunal terá que encaminhar a quem possa questionar a cooperativa.

AE Agronegócios – Diante desse imbróglio, não é fácil acreditar que o governo vai conseguir tirar o novo leilão do Pepro do papel.

Bertone – Nós vamos tentar adotar de forma consensual as sugestões da iniciativa privada. Ouvir a opinião da iniciativa privada não impede críticas futuras. O governo está sempre sujeito às críticas. Eu tenho uma palavra de um importante membro do governo: o Pepro do café, socialmente, foi muito mais justo que outros. No entanto, esse tem sido o mais questionado. Nenhum outro programa teve tanta abrangência e chegou ao produtor de uma forma tão competente. Paciência. O café é assim. O café costuma transformar políticas absolutamente benéficas em coisas ditas não benéficas.

Na verdade o Pepro foi extremamente pulverizado e beneficiou uma infinidade de produtores que de outra forma não teriam acesso ao programa, que poderia ter ficado encalhado. Os recursos teriam ficado encalhados. Se tivesse beneficiado só grandes, talvez não tivesse tido o barulho que teve. Se tivesse sido um Prop, não teria sido questionado. Nada contra o Prop. Há momentos de mercado que é preciso fazer Prop, que é uma programa de opções privadas. A subvenção vai para o exportador. O setor concorda com isso. O importante é que os programas do 2OC não se percam tendo em vista essa discussão pontual.

AE Agronegócios – Qual é a meta do programa para este ano?

Bertone – Nós estamos estimando um programa para 12 milhões de sacas, com uma subvenção de R$ 25 por saca e preço objetivo de R$ 300 por saca. O produtor só vai receber o diferencial entre o preço de mercado e os R$ 300. O programa do ano passado pagou os R$ 40 por saca para qualquer nível de preço. Para este ano, o preço objetivo é R$ 300. Se o preço da saca no mercado atingir R$ 280, ele só recebe R$ 20. Se o preço atingir R$ 290, ele só recebe R$ 10. Os R$ 25 é o prêmio máximo. Isso é o que nós estamos idealizando.

Não podemos perder de vista que o programa é para escoamento da safra, não é para retenção de café. No ano passado, o Pepro foi fundamental porque ele gerou o escoamento de uma safra pequena, uma elevação do preço, ou seja, o benefício em termos de renda foi muito grande para o produtor. Isso não foi só para o cafeicultor que comprou o Pepro, quem não comprou também foi beneficiado, porque o preço chegou aonde nós queríamos.

AE Agronegócios – Os preços do café estão em queda, mas os custos de produção estão elevados. Como fica essa relação para a próxima safra?

Bertone – Essa questão da renda líquida preocupa. Essa safra deveria gerar uma renda líquida, ou seja, faturamento menos custos, positiva. Nós estamos apreensivos com o preço atual no mercado. Por outro lado, a safra do ano que vem é de ciclo baixo. O próprio mercado está revendo as projeções para a safra que está sendo colhida, a 2008/09. Muitos questionaram as estimativas da Conab dizendo que estava muito baixa, mas hoje já se percebe o mercado reticente e convergindo para os números da Conab.

É prematuro falar da nova safra, mas posso adiantar que queremos aprimorar os levantamentos. Estamos estudando um trabalho de georeferenciamento para as lavouras cafeeiras. A relação de preços e custos de produção acaba tendo impacto no trato cultural e se refletindo nas próximas duas safras. Já percebemos que os cafeicultores não estão conseguindo tratar as lavouras de forma adequada.

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