Representantes do setor privado vão aumentar a pressão pela privatização da gestão dos portos públicos, exercida atualmente pelas Companhias Docas. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) acaba de concluir estudo que defende, com farta argumentação, o fim da administração pública e do que chama de ineficiência provocada pela hegemonia de interesses políticos no setor.
O documento “Reforma portuária: o que falta fazer” defende que o Estado seja responsável apenas por regular, fiscalizar e planejar políticas integradas do setor portuário. As lideranças empresariais dizem que a criação da Secretaria Especial de Portos, no início deste ano, pode ser vista como um avanço, porque o ministro Pedro Brito substituiu diretores e presidentes das Companhias Docas e ainda trabalhou para que o Congresso aprovasse, na semana passada, a lei 11.610, que vai mudar radicalmente a contratação dos serviços de dragagem. Mas essa evolução, dizem, é insuficiente.
O presidente do Conselho de Infra-Estrutura da CNI, José de Freitas Mascarenhas, adverte que o crescimento da corrente de comércio brasileira – atualmente, o valor de exportações e importações já está acima dos US$ 270 bilhões – não pode ser sufocado pela defasagem dos ineficientes portos públicos. Nesse cenário, 95% do volume exportado passa pelos portos. Considerando o valor das exportações, a dependência dos portos chega a 80%. “A máquina administrativa está ultrapassada e as pessoas trabalham sem estímulo nas administrações portuárias estatais. Há falta de transparência e informação direcionar o investimento.”
Segundo Mascarenhas, são muitos os exemplos de países que deixaram no passado esse gargalo. Diz que a China vem fazendo bom planejamento, mas os paradigmas são as gestões portuárias em Cingapura, Barcelona e Roterdã. Até o porto de Buenos Aires, segundo o dirigente da CNI, tem condições melhores que as dos portos brasileiros. “Somente a privatização permite superar o atraso e obter apoio financeiro mais rápido para os investimentos necessários. Falta profissionalização, porque os portos ficaram por muito tempo reféns de indicações políticas”, diz.
O ministro-chefe da Secretaria Especial de Portos, Pedro Brito, contudo, é direto e claro: “Privatizar não está nos planos do governo”. Ele admite que pedir mais segurança jurídica na gestão portuária é uma reivindicação legítima e correta dos empresários, mas pondera que isso não é líquido e certo nas privatizações.
“Todos os grandes portos do mundo são públicos, porque são instrumentos de desenvolvimento. O que temos de buscar é a definição de um marco regulatório eficiente, que estabeleça normas para contrato de gestão, metas de resultados e lucros e ainda dê poder aos conselhos das Companhias Docas para impedir influência política”, afirma.
A privatização, segundo Brito, ainda traz o risco de os portos atenderem alguns grupos e não a sociedade com todas as suas demandas. Ele também procurou ressaltar que a lei 11.610 é um “choque de competição” e vai permitir a participação das grandes dragadoras estrangeiras. Garantiu que esse novo marco legal, somado à “moderna” lei 8.630, de 1993, permitirá contratação do serviço por resultado e a vencedora da licitação terá a manutenção por cinco anos. Como exemplo, diz que o porto de Santos terá a profundidade ampliada de 12,5 metros para 15 metros.
Os empresários sabem da resistência dos governos à privatização total dos portos, mas dizem que os exemplos de ineficiência fortalecem sua posição. Mascarenhas cita números do porto de Aratu, na Bahia, com problemas menores que os de Santos e Paranaguá. Com capacidade para operar 3 milhões de toneladas por ano, em 2007 enfrentou demanda de 6,6 milhões de toneladas. Isso significa que os navios perderam 1.237 dias esperando vaga, o que custou US$ 35 mil por dia. Nos últimos dez anos, a ineficiência de Aratu provocou perdas de US$ 350 milhões.
Segundo a CNI, Aratu precisará ampliar sua capacidade para poder processar 9 milhões de toneladas/ano em 2011. Mascarenhas lamenta que, no ano passado, verbas federais não puderam ser investidas nos portos de Salvador e Aratu por absoluta falta de projetos. Ainda argumenta que, nos últimos dois anos, o porto de Salvador ficou oito meses sem a nomeação de um presidente, porque havia muita disputa política para o preenchimento do cargo.
O presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários Privados (ABTP), Wilen Mantelli, alerta que a situação é grave, porque até os terminais privatizados sofrem com a administração pública e a a ineficiência contamina serviços como dragagem e licitação de áreas ociosas. O país tem aproximadamente 130 terminais privativos (cativos) e outros 20 privatizados. As Companhias Docas federais são as de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Espírito Santo, Pará e Ceará. As empresas transferidas ao controle estadual são as do Rio Grande do Norte, Paranaguá (PR), Rio Grande (RS) e Maranhão. A única controlada por município é a de Itajaí (SC). Em Imbituba (SC), a companhia é privada.
Marco Polo de Mello Alves, vice-presidente executivo do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS), reforça a bandeira da privatização das Companhias Docas. Na sua avaliação, os portos brasileiros são perigoso gargalo, porque impõem morosidade para toda a economia e têm gestão deficiente.
Atualmente, as siderúrgicas têm capacidade instalada para produzir 37 milhões de toneladas de aço por ano. Os investimentos já anunciados vão elevar esse volume para 59 milhões de toneladas em 2012. Até 2016, o setor pode chegar a 78 milhões de toneladas/ano. Segundo Alves, essa expansão depende de portos eficientes. “Onde o setor privado pode estar, o Estado não deve ficar”, diz Alves.