Pós-Kyoto: Reunião na Alemanha acaba em incertezas; Brasil lidera proposta de emergentes para pressionar ricos
Daniela Chiaretti, de Bonn
Nos últimos minutos da reunião preparatória de Bonn, o Brasil liderou uma manobra tática para impedir que o Protocolo de Kyoto morra depois de 2012. Junto com outras 37 nações apresentou uma proposta de redução de 40% nas emissões dos gases-estufa dos países ricos entre 2013 e 2020, quando expira a vigência de Kyoto. A intromissão no terreno do vizinho foi uma estratégia dos países em desenvolvimento para avançar as negociações climáticas.
Até aquele momento, os industrializados não haviam apresentado nenhuma meta de corte dos gases de efeito-estufa para o intervalo 2013- 2020. O risco era perder o prazo de 17 de junho, data estabelecida pela ONU para que estejam na mesa todas as propostas que se quer discutir na conferência de Copenhague, daqui a seis meses. Na sexta-feira, a Rússia havia vetado qualquer nova meta dos países industrializados. Os ricos, que são os grandes poluidores do passado, querem um novo acordo em Copenhague, com a inclusão de novos atores na lista de cortes e abandonar Kyoto. O bloco dos países em desenvolvimento, onde estão as economias emergentes e grandes poluidoras do presente, não querem. China, Brasil, Índia e África do Sul concordam que a trajetória de crescimento de suas emissões seja contida, mas sem metas internacionais obrigatórias.
“Não houve acordo nas metas dos países desenvolvidos e isso estrangularia o futuro do Protocolo de Kyoto”, disse o ministro Luiz Figueiredo Machado, líder dos negociadores brasileiros e que leu no plenário a proposta de metas assinada em conjunto por emergentes e outros 33 países. “Se você quer um acordo razoável, ambicioso e realista em Copenhague, não tem que mudar as regras do jogo agora” dizia o embaixador Sergio Serra, porta-voz para a mudança do clima do Itamaraty. “O que negociamos em Báli não foi isso.”
“Manter o protocolo de Kyoto vivo é uma prioridade, mas é fácil para os países em desenvolvimento só olharem as reduções dos outros”, analisava João Talocchi, coordenador da campanha do clima do Greenpeace-Brasil. “Estamos contentes que os países em desenvolvimento voltaram a mostrar liderança”, animava-se uma ativista chinesa do WWF. Os representantes dos ricos não fizeram nenhum comentário sobre a iniciativa.
Há uma confusão de números neste momento no debate do clima. A recomendação do IPCC, o braço científico da ONU, é que os cortes de emissões em 2020 fiquem entre 25% e 40%, em relação aos volumes de 1990, para que a temperatura do planeta aumente no máximo 2°C no fim do século. A UE fala em 20% a 30% desde que outros façam o mesmo e considera 1990 como ano-base. Os EUA trabalham com menos 17% em 2020, mas tem 2005 como ponto de referência. Segundo a ONU, as promessas de cortes até agora variam de 16% a 26% em relação a 1990, o que é considerado insuficiente. Na conta das ONGs estes números estão errados e representam entre 6% e 13% na melhor das hipóteses. “É preciso ter clareza nas metas”, repetia como um mantra o holandês Yvo de Boer, secretário-executivo da Convenção do Clima.
No meio do encontro de Bonn os negociadores souberam que estava havendo uma reunião bilateral sobre mudança climática entre China e EUA, na China. Os dois países respondem por 40% das emissões de gases-estufa do mundo. “Para os EUA, o acordo do clima parece ser um acordo EUA-China”, dizia Mark Lutes, conselheiro do WWF no Canadá. O que discutiram ninguém soube. Mas, ao voltar a Bonn, o chefe dos negociadores dos EUA, Jonathan Pershing, deixou algum otimismo no ar ao fazer uma referência ao slogan da campanha de Obama, o “Yes, we can”: “Nós podemos e nós estamos buscando chegar a um acordo abrangente em Copenhague.”
A jornalista viajou a convite da CoP-15, a conferência de Copenhague