Doha e as exportações agrícolas

26 de outubro de 2007 | Sem comentários Análise de Mercado Mercado
Por: GAZETA MERCANTIL

Nos EUA, já se reconhece que os subsídios retiram eficiência de seus fazendeiros. A desamarração dos mercados agrícolas, grande ambição da Rodada de Doha lançada há seis anos pela Organização Mundial do Comércio (OMC), está ameaçada por um impasse sério.


Os países em desenvolvimento, alegando exatamente que esta é a Rodada do “Desenvolvimento”, querem abertura agrícola maior do que até agora oferecida pelos ricos, ao mesmo tempo que desejam proteger sua indústria nascente. E os ricos querem mais mercado para suas indústrias, e só assim flexibilizam mais na agricultura.


No caso brasileiro, por exemplo, isto significaria reduzir as tarifas do setor automotivo de 35% para 24%, em dez anos, bem como cortar de 1 a 3 pontos percentuais as tarifas aplicadas a um grupo de produtos, no mesmo prazo. Países como Argentina e África do Sul são ainda mais resistentes a iniciativas para abertura a produtos não-agrícolas, ou seja, ao chamado Nama, sigla de “Non-Agricultural Market Access”.


Por trás de tudo isto há uma grande verdade: a história tem mostrado que quanto mais protegido um setor, menos ele se desenvolve. Quando o Mercosul foi criado, ficamos preocupados com as perdas que o Brasil teria na área agrícola frente às vantajosas condições naturais da Argentina. O que aconteceu foi um espetacular crescimento das nossas exportações agrícolas, apesar da brutal crise vivida pelo setor rural nos últimos anos.


Recentemente, Dean Kleckner, veterano líder agrícola americano, ferrenho defensor do protecionismo, escreveu artigo em The New York Times com o título de “A colheita da vergonha”, em que reconhece que os subsídios retiram eficiência de seus conterrâneos fazendeiros e pede a diminuição dos mesmos.


Com efeito, mesmo sem acordo na OMC, o agronegócio brasileiro tem dado demonstração de enorme vitalidade e competitividade. Nos últimos dez anos, a presença dos produtos brasileiros no mercado internacional cresceu expressivamente.


Em 1997 exportamos 18,9 milhões de toneladas do complexo soja (grãos, farelo e óleo); em 2006, as exportações foram de 39,7 milhões de toneladas, quase o dobro. E até agosto deste ano, já foram 28,7 milhões de toneladas.


Em valores, saltou de US$ 5,5 bilhões em 1997 para US$ 9,3 bilhões em 2006 (US$ 7,9 bilhões até agosto deste ano).


Em carne bovina, saímos de 158 mil toneladas em 1997 (US$ 462 milhões) para 1,5 milhão de toneladas no ano passado.


Em divisas, a receita foi de US$ 3,9 bilhões de dólares. Crescemos quase dez vezes no período. De janeiro até agosto deste ano já exportamos US$ 2,9 bilhões.


Em carne de frango, outro êxito: de 651 mil toneladas em 1997 para 2,7 milhões de toneladas em 2006.


As receitas nesse item saltando de US$ 883 milhões para US$ 3,2 bilhões em 2006 (US$ 2,9 bilhões nos primeiros oito meses deste ano).


Em carne suína fomos de 74 mil toneladas para 526 mil. Isto significa avanço de US$ 166 milhões para US$ 1,03 bilhão ao fim do ano passado.


Em celulose, de 2,5 milhões de toneladas para 6,2 milhões, mais do que dobrando o valor, de US$ 1,2 bilhão para US$ 2,5 bilhões. As exportações de madeira tiveram desempenho semelhante: de US$ 1,5 bilhão para US$ 3,4 bilhões.


O doce salto do açúcar: de 6,3 milhões de toneladas em 1997 (US$ 1,77 bilhão) para 18,9 milhões em 2006, quase três vezes mais, carreando uma receita de US$ 6,2 bihões).


No etanol, nem dá para comparar, pois o crescimento foi de US$ 54 milhões para US$ 1,6 bilhão. No café torrado, saímos de US$ 2,7 milhões para US$ 24,5 milhões no ano passado. Em algodão, fomos de US$ 640 milhões em 1997 para US$ 1,22 bilhão em 2006. Em suco de laranja, o avanço foi de US$ 1 bilhão para US$ 1,5 bilhão. Em frutas, de US$ 314 milhões para US$ 733 milhões.


O milho deu um salto espetacular: de 349 mil toneladas em 1997, no valor de US$ 41 milhões, fomos para 3,9 milhões de toneladas em 2006 (US$ 460 milhões).


De janeiro a agosto deste ano, já tínhamos exportado 5,6 milhões de toneladas, rendendo divisas de quase US$ 900 milhões.


Crescemos igualmente em couro e derivados, em vendas de flores, em produtos orgânicos e assim por diante.


Números maravilhosos. Porém, talvez mais importante que o acordo na OMC seja necessário ampliar nossos acordos sanitários, aqui, sim, um forte elemento restritivo ao comércio.


Este crescimento todo nos levou a exportar, em 2000, US$ 20,6 bilhões no agronegócio e, em 2006, US$ 49,4 bilhões; crescemos 140%, mais do que o dobro do crescimento do comércio agrícola mundial no período, num incremento médio de 15,7% ao ano.


Tudo isto indica uma clara conclusão: o agronegócio brasileiro cresceu mesmo porque os nossos produtores rurais incorporaram tecnologias modernas, aumentaram a produtividade, reduziram custos e conquistaram mercados.


Claro que é fundamental um bom final na Rodada de Doha, porque desta forma se consolidariam regras para aberturas ainda maiores, mas o que precisamos mesmo é reduzir nossos custos (juros, impostos e logística) e melhorar nossas condições sanitárias.


kicker: O que precisamos mesmo é reduzir nossos custos (juros, impostos, logística) e melhorar as nossas condições sanitárias


(Gazeta Mercantil/Caderno A – Pág. 3)


(Roberto Rodrigues – Coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV), presidente do Conselho Superior do Agronegócios da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), professor de Economia Rural da Unesp (Jacoticabal) e ex-ministro da Agricultura. Próximo artigo do autor em 16 de novembro)


 

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