09/10/2009
Por Virgilio Viana
É preciso reduzir drasticamente as emissões de gases de efeito estufa para evitar que o planeta caminhe para um futuro ameaçador
Estamos diante de uma emergência global. Precisamos reduzir drasticamente as emissões de gases de efeito estufa para evitar que o planeta caminhe para um futuro ameaçador para as sociedades humanas e os ecossistemas naturais. Essa redução deve ser rápida e em grande escala.
Temos alguns princípios básicos para nortear esse desafio. Primeiro, a responsabilidade maior deve ser dos países ricos, que historicamente foram os que mais poluíram a atmosfera, queimando petróleo, carvão e gás. Segundo, a responsabilidade é comum a todos, pois estamos num único planeta e o que for feito em qualquer lugar afetará a todos, independentemente de onde vivemos. Não basta, portanto, jogar a culpa e a responsabilidade para os países desenvolvidos.
Dentre os vários nós nas negociações internacionais, destaca-se o tema de florestas e mudanças climáticas. As florestas respondem por algo ao redor de 20% das emissões, variando ao longo dos anos, para mais ou para menos. Este é um dos principais nós das negociações da Convenção de Mudanças Climáticas. Como inserir as florestas nos acordos de Copenhague, em dezembro de 2009?
Devemos ter como ponto de partida algumas premissas. A primeira é de que é do interesse do Brasil zerar o desmatamento. As florestas são essenciais para o ciclo hidrológico e isto afeta as chuvas e, consequentemente, a agropecuária, a geração de energia hidrelétrica e o abastecimento de urbano de água. Além disso, as florestas, se manejadas, podem gerar empregos e alimentar uma economia de base florestal. As florestas são também importantes para a vida de populações tradicionais e indígenas e a reprodução dos seus ricos saberes étnicos e ecológicos. Portanto, desmatar a Amazônia é contra o interesse nacional.
Outra premissa fundamental é de que a melhor estratégia para reduzir o desmatamento é fazer a floresta valer mais em pé do que derrubada. Nos últimos sete anos o estado do Amazonas mostrou que essa premissa é verdadeira, ao transformá-la em realidade. Outros estados também avançaram muito nisso. O problema é que aumentar o valor da floresta em pé requer investimentos financeiros. A oportunidade histórica é a valorização econômica dos serviços ambientais das florestas.
Os países industrializados têm limites econômicos e financeiros para aumentar suas metas de redução de emissões, que deveriam chegar a 40% em relação a 1990. Devemos propor uma solução pragmática. Essa solução combina tanto o interesse nacional (reduzir o desmatamento da Amazônia) quanto o interesse global (aumentar as metas dos países industrializados). Isso deve ser feito por meio de um conjunto de formas de financiamento de ações de redução do desmatamento. A solução envolve dois mecanismos de financiamento.
Primeiro, os países industrializados devem destinar recursos governamentais, em montantes adequados, para apoiar os governos dos países com florestas tropicais na implementação de programas de redução de desmatamento. Segundo, os países industrializados devem assumir metas adicionais às que vêm propondo, mediante a inclusão de florestas para compensar parte das suas metas adicionais.
As metas adicionais seriam feitas por um novo mecanismo, onde os créditos de carbono de redução de emissões por desmatamento e degradação (REDD) não teriam fungibilidade com outros mecanismos. O carbono associado ao REDD seria transacionado na forma de uma quota proporcional às metas assumidas no Protocolo de Kyoto ou fora dele, para o caso dos EUA. Uma quota adicional de 10% representaria, em 2008, cerca de US$ 11,8 bilhões por ano.
Uma quota específica para REDD asseguraria que a maior parte dos esforços dos países seria doméstica. Em outras palavras, a maior parte (90%) da redução deveria ser feita pelos próprios países industrializados e pelos mecanismos previstos no Protocolo de Kyoto. Isto atende às legítimas e corretas preocupações de países como o Brasil e organizações, como o Greenpeace, que não desejam mecanismos de compensação que permitam a manutenção dos elevados níveis de poluição dos países industrializados.
Existem metodologias simples, robustas e inclusivas para a inclusão do REDD como mecanismo compensatório. Uma solução é a utilização de métodos que combinam estoque e fluxo de carbono. Isso permitiria recompensar tanto regiões com elevada cobertura florestal e baixo desmatamento, como aquelas que, apesar de terem altas taxas de desmatamento, consigam reduções expressivas.
Riscos de vazamento e permanência das reduções de emissões associadas ao desmatamento e degradação são igualmente encontrados nos setores de energia e industrial e não devem ser motivos de preocupação. Afinal, deveríamos tratar as florestas de forma mais favorável em relação a outros setores da economia. As florestas são as únicas a trazer outros benefícios para o clima (ciclo de água) e a sustentabilidade (combate à pobreza).
É animador observar a construção de um novo posicionamento do governo do Brasil nas negociações internacionais sobre o regime do clima. Devemos dar prioridade à inclusão das florestas no novo regime do clima de forma inteligente e coerente com um novo conceito de interesse nacional.
Virgilio Viana é engenheiro florestal, PhD pela Universidade de Harvard e diretor geral da Fundação Amazonas Sustentável.