Em vez das perdas esperadas pelo efeito da crise financeira internacional, especialistas e representantes de produtores prevêem momentos de grandes oportunidades para a agricultura brasileira. Eles argumentam que o dólar valorizado deverá garantir uma renda extra ao produtor em reais e compensar com folga a queda das commodities agrícolas nas bolsas internacionais. Acreditam ainda que a alimentação será o último item a ser cortado no orçamento familiar. Há porém alguns especialistas, mais cautelosos, que temem que a moeda americana sofra uma nova desvalorização, caso os especuladores voltem a aplicar nos contratos futuros de produtos agrícolas ou voltem a investir nas Bolsas de valores de países emergentes, revertendo a situação.
O professor Fernando Homem de Melo, da Faculdade Economia e Administração (FEA) da Universidade de São Paulo (USP), está entre os mais otimistas. Ele acredita que a próxima temporada será favorável à formação de lavouras. Para ele, é o prenúncio de um novo ciclo de crescimento agrícola, proporcionado pelo fim do ciclo de valorização do real.
“A situação é inédita”, afirmou Homem de Melo. Segundo ele, a agricultura brasileira desfruta de uma dupla vantagem: boa parte dos insumos foi comprada em um momento em que o dólar estava barato e o plantio ocorrerá em um período em que o câmbio está valorizado. Para ele, isso representa um estímulo adicional à produção. O reflexo disso, na opinião do professor da FEA, será um expressivo ganho na renda do agricultor.
Homem de Melo levou em conta o movimento das commodities nos últimos meses e a valorização do dólar estimulada pela crise financeira internacional. Seguindo esse raciocínio, os preços das commodities caíram em média 12% até sexta-feira em Chicago e Nova York, se comparados às cotações médias do primeiro semestre. O dólar comercial, desde 1 agosto, valorizou 17,3%. O valor da moeda americana de sexta-feira foi fortemente influenciado pela atuação do Banco Central, que vendeu dólares ao mercado na tentativa de evitar a sua valorização. Mas o professor da FEA acredita que a tendência é de alta ainda maior.
O resultado, segundo ele, será uma safra bem maior que a colhida neste ano (143,3 milhões de toneladas de grãos). Os prognósticos anteriores a esse movimento previam crescimento modesto para a próxima temporada. Segundo a Cogo Consultoria, o crescimento não seria maior do que 3,5%, ou 148 milhões de toneladas.
O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, também integra o coro dos otimistas. No último dia 16, disse não acreditar que os preços das commodities irão cair ainda mais no mercado. No entanto, especialistas acreditam que o “fundo do poço” ainda é incerto e que o recuo já é uma sinalização do enfraquecimento da demanda mundial. “A velocidade com que as commodities caíram surpreendeu. Embora o tamanho da crise não tenha sido devidamente avaliado , existe um fundamento básico nesse processo que é a contração da demanda”, avalia Fábio Silveira, da RC Consultores. Segundo afirmou, isso ocorrerá porque a economia americana representa 25% do Produto Interno Bruto (PIB) global, o que pode fazer essa contração ser irradiada para países da Europa, Japão e na China.
Mesmo se houver um expressivo recuo na atividade econômica mundial, a demanda por alimentos deverá se manter aquecida, especialmente nos países em desenvolvimento, como Rússia, Índia e China, argumenta Homem de Melo. Há ainda os programas de produção dos biocombustíveis, que dão sustentação ao mercado. O professor de Estratégia da USP, Marcos Fava Neves, observa que se a crise ficar como está, não haverá nenhum reflexo no agronegócio. “Pode ocorrer uma queda na lucratividade com as exportações. Mas o alimento será a última coisa reduzida pelo consumidor”. Para ele, só se a situação se complicar surgirão alguns entraves. “A quebra de outros bancos pode reduzir a renda e acabar afetando o consumo, o que prejudicaria o setor